No title Um grupo de seis mulheres aguarda a consulta no Hospital Regional da Asa Sul (Hras). Elas não se conhecem, mas, rapidamente, viram confidentes. Estão ali para tentar realizar o sonho da maternidade. É a primeira vez que fazem o tratamento. Nenhuma passou, ainda, pela alegria ou a decepção de abrir o teste de gravidez, depois de se submeterem ao processo. Todas sabem, entretanto, o que é esperar por um filho que nunca vem - seja pela idade avançada ou por problemas biológicos, elas não podem ser mães naturalmente.
Em cerca de 20 minutos, trocam experiências e informações - muitas sem qualquer caráter científico, baseadas apenas no desespero da infertilidade. São receitas de garrafadas, novenas, promessas, simpatias. Uma delas convida as demais para ir à igreja: "Hoje, uma mulher que não podia ter filhos vai dar o testemunho. Pediu tanto a Deus que conseguiu". Outra fornece o endereço de uma vendedora ambulante que faz "chás milagrosos".
Segundo as estatísticas, três delas não vão engravidar. As chances de se obter sucesso na fertilização in vitro são de 50% na primeira tentativa, de acordo com Rosaly Rulli Costa, coordenadora de Reprodução Humana da Secretaria de Saúde do Distrito Federal. O resultado negativo será, provavelmente, a pior notícia que já receberam na vida. Algumas poderão desistir, outras se apegarão à fé, seja ela na religião, na ciência ou na sorte.
O Correio ouviu o depoimento de três mulheres que vivenciaram o tratamento de reprodução assistida, sem sucesso. As trajetórias são diferentes, mas têm elementos em comum. A expectativa, a cobrança, o medo, a frustração - tudo isso faz parte da vida de uma pessoa que persegue, incansavelmente, o subjetivo conceito de instinto materno. "O bem maior da humanidade é ter filhos. Todos queremos nos perpetuar através do tempo", sustenta Rosaly Rulli Costa.
Veja o testemunho da evangélica Flávia Helena Alarcão:
Aguardando um milagre
O quarto de Ana Beatriz e Samuel já foi planejado. Branco misturado a cores claras - incluindo rosa, em homenagem à menina. Há quatro anos, ele está pronto na cabeça de Flávia Helena Alarcão, 38. Mas as paredes coloridas só foram erguidas na imaginação da administradora. Flávia e o marido, Júnior, não podem ter filhos. Tecnicamente, as chances de o casal conceber uma criança são mínimas. Depois de duas tentativas de reprodução assistida frustradas, a esperança, porém, não acabou. "Vou engravidar, mesmo que seja por um milagre".
Flávia vem de uma família fértil. A mãe teve três filhos; a avó, 10. São mais de 50 netos. Juntos, os dois irmãos da administradora são pais de quatro crianças. Só ela, a filha do meio, não gerou descendentes. Evangélica, a administradora agarra-se à fé. Se Sara, mulher de Abraão, concebeu aos 90 anos, por que não esperar o mesmo? "Na hora certa, Deus vai dar meu filho", acredita.
Em 2006, Flávia experimentou o gosto de se sentir mãe. Por cinco dias, esteve grávida. Pela contagem hormonal, provavelmente eram gêmeos. Certa de que um dos filhos seria do sexo feminino, a única dúvida que teve foi sobre o nome do garotinho: Samuel ou Isaac.
A gravidez foi resultado da primeira tentativa de fertilização in vitro do casal, realizada no Hospital Regional da Asa Sul (Hras). Desde criança, Flávia queria ser mãe, mas Júnior sofre de azoospermia, falta de espermatozoides na ejaculação. Um ano depois de começar a morar junto, o casal procurou a equipe da ginecologista Rosaly Rulli, no Hras. Em 2006, conseguiu atendimento. O período de espera foi de muita ansiedade. "Você vê grávidas na rua, vê filmes com crianças, vê partos, e tudo isso mexe. No Dia das Mães, eu sofria muito", diz.
Então estagiária de uma empresa da área médica, Flávia levava com ela, todos os dias, o isopor com as injeções de hormônio que precisava tomar. Corria da 515 Sul, onde estagiava, à 914 Sul para fazer os exames que detectavam o tamanho do óvulo. Quando chegou a hora da coleta, sentiu dores intensas. O sofrimento compensou. Um dia antes de pegar o resultado do exame de gravidez, Flávia não dormiu. Às 7h em ponto, já estava no hospital onde fez o teste. "Liguei para o meu marido e falei: Oi, papai!" Não demorou para a alegria se transformar em dor. Dois dias depois, ela começou a sentir cólicas e a perder sangue. Na terça-feira, fez uma ecografia e constatou o aborto. "Foi horrível. Em um dia, eu recebia os parabéns. Em outro, perdia (o embrião)".
Na igreja, ela encontrou consolo e força. Era o que precisava para, três meses depois, fazer a segunda tentativa. Dessa vez, ela nem sequer engravidou. Ainda restava uma terceira chance, a de usar o espermatozoide de um doador. O embrião estava pronto para ser transferido. Flávia, porém, desistiu. "Orei muito e senti que não era para fazer. Que, na hora certa, ia acontecer o milagre na minha vida. Foi aí que me envolvi mais espiritualmente. Foi pela dor. Me batizei, me casei na igreja, me amadureci espiritualmente", diz. Desde então, ela aguarda o milagre. "Todos os meses. Se Deus me prometeu, eu vou esperar."
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Por Paloma Oliveto
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