Mano, essa você precisa aprender.
Não chatear a própria esposa é a tarefa número 1 de um novo pai. Parece fácil, ela precisa de suporte, acabou de virar mãe. Mas nós homens temos uma capacidade impressionante de ser insensíveis e estragar tudo.
Para mim, começou já antes do parto, quando deitei no sofá de casa e folheei o manual para grávidas que a Sarah, a minha esposa, estava lendo. Uau, quanta coisa, pensei em voz alta quando abri uma seção que explicava como os pais poderiam ajudar no parto. Não sabia que o parto tinha etapas específicas, nem como ajudar, nem mesmo quando ir ao hospital.
Depois de alguns minutos tentando absorver as instruções, ouvi a Sarah ofegando e abri a porta de nosso apartamento. Ela estava subindo as escadas do prédio.
— O que você está fazendo? — perguntei.
— Não aguento mais. Esse bebê precisa nascer. — Ela se apoiou na parede e respirou fundo. Já tinha completado 9 meses de gravidez. — Ouvir falar que subir escadas acelera a chegada do parto.
— Ah, é? Quantos andares está fazendo?
— Estou subindo e descendo. Já fiz onze vezes.
Nosso prédio tinha três andares. Fiz o cálculo rapidamente:
— Trinta e três andares?!
— É — ofegou de novo. — Você queria me dizer alguma coisa?
— É só que… eu estava lendo este manual aqui, a parte para os pais, mas é muito difícil. Não sei se vou me lembrar de tudo isso.
A Sarah me encarou nos olhos.
— Você está reclamando da sua parte? E a minha?
— Desculpa. Não quis dizer isso…
— Porque se quiser trocar, eu topo.
— Deixa quieto. Fico com a minha parte…
Admito, fui insensível mesmo. Mas à medida que a Sarah passava por meses para conceber e em seguida meses de gestação, eu também sentia minhas entranhas se remoendo: medo de novas responsabilidades e dinâmicas familiares; dúvidas sobre se estava chegando cedo demais; ressentimento de ter minha esfera pessoal invadida por outra pessoa; culpa de não ser a pessoa generosa que gostaria de ser; vergonha de sentir tudo isso. Ficava irritado com a notícia da gravidez, depois ficava alegre, depois não sabia desembaraçar o nó de sentimentos contraditórios dentro de mim.
Quando o nosso primeiro filho nasceu, a combinação de um recém-nascido frágil, noites mal dormidas e um pai emocionalmente despreparado várias vezes formava pensamentos catastróficos. A minha vida tinha acabado. Estava em pedaços. Tudo era sombrio. Ouvia falar das conquistas profissionais de meus amigos e sentia que tudo mundo estava avançando enquanto eu tinha empacado. A vida em família era um peso. Nem uma noite de sono eu tinha mais.
Com o tempo, me dei conta do meu funcionamento e aprendi a processar as minhas emoções negativas de forma mais madura. Aprendi a reconhecer que estava no meio de um temporal emocional, a lembrar que em algumas horas aquilo passaria e a dizer a mim mesmo que minha vida era ótima, mesmo que não parecesse naquele momento.
De desconhecidas, as minhas emoções começaram a adquirir nomes: medo, esperança, ansiedade, gratidão. Descrevê-las em um diário (que, com o tempo virou um livro) me ajudou a vê-las fora de mim, analisá-las com maior objetividade e colocar em ordem minha vida interior. Percebi que as minhas emoções não eram ameaças, mas aliadas que tinham algo a me dizer. Não eram patroas que me escravizavam, mas servas que eu podia direcionar e ensinar.
Estruturar o meu dia ajudou também. Começo a manhã com a leitura e a oração, faço pausas mentais sem conferir o celular ou ficar no computador, e concluo o dia correndo e suando. São todos modos de descobrir o potencial do silêncio e prestar atenção ao nosso mundo interior. Se não processamos intencionalmente o que estamos vivendo, ficamos emotivamente atrofiados e descontamos as frustrações nas pessoas que mais amamos.
Se você já é ou está para se tornar um pai, eu digo: você vai cometer erros. Ser homem é fazer besteira. Mas aí a vida nos ensina. Algo dentro de nós encara o desafio. E algo grandioso se forma: um pai pronto para cuidar e amar.
Nosso mundo precisa dessas pessoas.
** Esse artigo foi adaptado do seu novo livro, “Não é fácil ser pai: Como domar os leõezinhos, não chatear sua esposa e recuperar (um pouco) a sanidade depois da paternidade”.
Leia o artigo anterior: Cultive o contentamento neste Dia das Crianças
René Breuel é um escritor brasileiro que mora em Roma, na Itália. Autor da obra Não é fácil ser pai (Mundo Cristão), possui mestrado em Escrita Criativa pela Universidade de Oxford, no Reino Unido, e em Teologia pelo Regent College, no Canadá. É casado com Sarah e pai de dois meninos, Pietro e Matteo.
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