Medo de Infertilidade Afeta Nós Homens Também

Estéril, eu?!

Fonte: Guiame, René BreuelAtualizado: quarta-feira, 29 de novembro de 2023 às 18:09
(Foto: Unsplash/Drew Hays)
(Foto: Unsplash/Drew Hays)

Existem duas pessoas antes que uma terceira chegue. Crianças nascem de pais; adultos precedem o feto; vida gera vida.

Que é o meu modo meio sem jeito de dizer que tudo começa com o sexo. A minha esposa e eu levamos dezoito meses para conceber o nosso primeiro filho, que não é um período superlongo, se comparado a casais que lutam contra a infertilidade. Mas a espera pareceu eterna a nós, jovens acostumados a alcançar metas em um mundo que nos dizia que tudo era possível.

Foi uma experiência frustrante: desejar obter algo; desejar obter algo bom, uma nova vida; desejá-la junto à pessoa que você ama; desejar ver uma nova pessoa vir dela e de você. Planos feitos e dinheiro economizado e um quarto preparado. O pequeno par de sapatos que uma amiga não resistiu comprar. Os sábados relaxados que agora pareciam relaxados demais. O desafio de encontrar um filme para assistir porque você já assistiu a todos. O sentimento de que o momento chegou, de que o futuro está logo ali.

Tudo isso, aparentemente, para nada. Para algo que parece que está para acontecer, mas que não acontece e que pouco a pouco você teme que nunca vai acontecer. Algo que parecia tão natural, pessoas que nascem, o fato mais básico da vida, mas que começa a se transformar em algo elusivo e caprichoso.

Como marido, muitas vezes não sabia como cuidar da Sarah nesse período. Deveria projetar confiança ou exibir meu lado frágil? Um bom marido alimentaria esperanças de gravidez ou mudaria o tema da conversa? Às vezes conseguia dar meu melhor e entrar na montanha-russa — alturas, quedas e rodopios — com ela. Outras vezes me recolhia no entorpecimento emotivo. Nas piores das vezes, eu levava o sonho de ser mãe da Sarah para o lado pessoal. Por que você quer tanto ter um filho? Não sou suficiente para você?

Com o passar dos meses, nossas tentativas de conceber foram dominadas por termos médicos. A Sarah passou por uma cirurgia para conferir se sofria de endometriose. A motilidade de meu esperma foi dissecada. A certa altura, parecia que ela havia feito mestrado em reprodução humana. A atmosfera fria do ar-condicionado das clínicas ginecológicas ditou o tom daqueles meses. A intimidade conjugal se tornou procriação, e a concepção de um bebê o feito de uma equipe médica.

E quando o teste de gravidez dava negativo de novo, tocava nervos dolorosos dentro de nós. Sentíamos que menos vida fluía em nossas veias e menos vitalidade em nosso amor. Sabíamos que existem famílias admiráveis em muitas configurações, com filhos ou sem filhos. Com o passar do tempo, porém, comecei a me sentir menos homem, ela menos mulher, e nós menos família. Palavras que nunca tínhamos cogitado um dia aplicar-se a nós vieram à mente: impotente, infértil, estéril.

Percebi que o medo de infertilidade afeta não só as mulheres, mas nós homens também. Bebês são concebidos no encontro mais íntimo entre um homem e uma mulher — um ato lindo que nos faz sentir humanos, conectados e inteiros. Quando a dúvida invade esse ritual de amor, é doloroso.

Quando finalmente descobrimos que a Sarah estava grávida, eu já tinha aperfeiçoado a arte de consolar a minha esposa. Paramos numa farmácia e compramos um teste de gravidez. Eu andei para lá e para cá no corredor das escovas de dente, acumulando forças para animar a Sarah quando ela saísse do banheiro. Eu a abraçaria. Diria que estava tudo bem. Na próxima vez iria dar certo. Conte comigo. Temos um ao outro.

Três minutos depois, ela apareceu em lágrimas — e com um grande sorriso. Eu conferi o teste: duas linhas, em vez de uma. Fiquei atônito. Lá estava nossa gravidez.

Meu primeiro sentimento foi de alívio. Um objetivo muito desejado foi conquistado. Senti-me vitorioso depois de uma luta e do término de um período de dor. A insegurança que sentíamos ao longo de meses havia passado. Não veria mais minha esposa sofrer com aquilo.

Foi então que minha mente pensou no bebê. Era difícil acreditar que uma pessoa estava a caminho, tendo como frágil garantia um pedaço de plástico comprado numa farmácia. Como seria nossa criança? Como eu reagiria quando ele ou ela fosse colocado em meus braços?

Aí me toquei que me tornaria pai. Eu, um pai? Essa palavra cheia de significado seria aplicada a mim? Esse papo de ter um filho era pra valer?

Pois é, os medos nunca acabam. Se não é a infertilidade, é a gravidez, o parto ou a adolescência. Ser pai ou mãe é ser orientado ao futuro. Mas aprendemos a viver mesmo com os medos. A felicidade não é um ponto de chegada, mas o modo em que se viaja.

René Breuel é um escritor brasileiro que mora em Roma, na Itália. Autor da obra Não é fácil ser pai (Mundo Cristão), possui mestrado em Escrita Criativa pela Universidade de Oxford, no Reino Unido, e em Teologia pelo Regent College, no Canadá. É casado com Sarah e pai de dois meninos, Pietro e Matteo.

* O conteúdo do texto acima é de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal Guiame.

Leia o artigo anterior: Como não chatear sua esposa quando ela virar mãe

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