O Estado do Rio ultrapassou, no ano passado, a marca de 67 mil abortos, aponta um levantamento feito pelo pesquisador Mario Giani, do Instituto de Medicina Social da Uerj, a pedido do GLOBO. O trabalho mostra que teriam sido realizadas pelo menos 67.544 intervenções desse tipo em 2013. Para chegar a esse número, o pesquisador usou informações disponíveis no Data SUS, que registra as internações (foram 16.886 em 2013) decorrentes de abortos espontâneos e induzidos. A partir desse dado, Giani calculou que, para cada aborto com complicações que chega ao SUS, outros quatro são feitos de forma clandestina.
Em conjunto com Leila Adesse, membro da ONG Ações Afirmativas em Direitos e Saúde, Giani é responsável pelo documento “Magnitude do abortamento induzido por faixa etária e grandes regiões”, que busca fazer um levantamento do problema. No plano nacional, o estudo aponta que foram realizados entre 685.334 e 856.688 abortos no ano passado, como já noticiado pelo GLOBO.
— O método usado para estimar o real número de abortamentos induzidos foi proposto pelo Alan Guttmacher Institute e validado pela OMS — explica Giani.
No município do Rio, foram, segundo os cálculos do pesquisador, 31.756 abortos clandestinos — que resultaram em 7.939 internações por conta de procedimentos espontâneos e induzidos. A capital é de longe a cidade do estado com o maior número de abortos. Duque de Caxias vem na segundo colocação, com 3.676 cirurgias (e 919 internações).
CLÍNICAS CLANDESTINAS
Partindo desses dados, Giani traçou uma estimativa de quantos leitos clandestinos são necessários, por dia, para atender as mulheres: no estado, seriam 185, enquanto no município, 87. O pesquisador partiu da premissa de que todos os abortos seriam feitos em clínicas clandestinas.
A clínica em Campo Grande, por exemplo, que atendeu a auxiliar administrativa Jandira Magdalena dos Santos Cruz, cujo corpo foi identificado nesta terça-feira, fazia quatro ou cinco abortos por dia, segundo Rosemere Aparecida Ferreira, acusada pela polícia de chefiar o grupo responsável pelos procedimentos.
O Estado do Rio tem de 20 a 30 abortos anuais para cada mil mulheres entre 10 e 49 anos, taxa considerada de média a baixa em relação aos números do país (onde a taxa pode passar de 40). Os dados mais recentes são de 2007, de uma pesquisa da Faperj coordenada por Giani.
A Região Metropolitana do Rio, na qual se insere a capital, tem de 15 a 20 abortos para cada mil mulheres. No Norte Fluminense, na Baixada Litorânea e na Costa Verde, a média é de 20 a 22 abortos para cada mil.
Para o presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj), Sidnei Ferreira, os números são impressionantes:
— Acredito que o número real seja maior que isso. Há uma subnotificação. Muitas mulheres têm complicações e não comparecem aos hospitais.