Nelson Rodrigues tinha uma frase carregada de verdade: A novela mata a nossa fome por mentiras. Na mosca! Somente a sede por mentiras explica a dependência escrava da nação brasileira no chamado horário nobre da televisão, que de nobre, convenhamos, não tem nada.
Famílias inteiras desmarcam compromissos, evitam passeios, negam jantares, dispensam cultos, rejeitam a oração, eliminam estudos, adoecem numa minguada comunhão por causa do capítulo da novela que não se pode perder. Tudo o mais se perde: atenção, diálogo, afeto, compromisso, relacionamento, mas a novela não, desta não se pode abrir mão. É ou não é uma dependência escrava?
Drogas e álcool matam. Conteúdos noveleiros também. Matam valores como fidelidade, honestidade, humildade, simplicidade, bondade, pureza, recato, fé, submissão, respeito. Famílias inteiras, daquelas que se fantasiam de crente a cada final de semana, passam a semana inteira matando a fome de emoção com a dita cuja da novela. Todo ser humano tem necessidade de rir, chorar, torcer, opinar, se emocionar. A ficção de mentira acaba preenchendo essa necessidade. Só que preenche mal, pois o faz com mentiras e valores diabólicos, fazendo surgir enormes conflitos e desequilíbrios em famílias que tinham tudo para acertar, mas errar virou a rotina.
Tomando como referência os números confirmados pelo IBOPE, mais de 80 milhões de brasileiros estão atravessando a Avenida Brasil de mãos dadas com a Globo. Quando criança, minha segurança para atravessar a Avenida São João, por exemplo, era a mão do meu pai. Fiz o mesmo com meus filhos, segurei firme a mão deles quando pequenos. A novela está chegando ao seu final e um monte de gente já se arrebentou nos dramas que copiou da trama. Ou ainda, nos dramas que se deu risada enquanto eram só na novela, mas no momento em que dramas semelhantes invadiram casas de gente como a gente, o caldo entornou. Já era!
Avenida não é lugar para brincadeira, não é lugar para sentar e vibrar com a desgraça, traição, sacanagem e vergonha alheia. Avenida é lugar para olhar atentamente para os dois lados, mirar a faixa de pedestre , atravessar e tchau. Que o diga uma senhorinha que conheço, noveleira assumida. Como não perdi nenhum tempo da minha vida com esta avenida, faço minhas as palavras dela, ditas a minha esposa: Regina, essa novela é horrorosa, não tem a menor possibilidade de deixar entrar tanta sujeira em minha casa.
A senhorinha amiga nossa não é evangélica, mas não perdeu o filtro e a capacidade de pensar. Tanta coisa boa, verdadeira e real para se fazer e mais de 80 milhões de pessoas ficam brincando com os perigos evidentes de uma avenida. Não dá! Definitivamente, cuidado ao atravessar a avenida, Brasil.
Paz!
por Edmilson Mendes
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