Não brinque com fogo, avisava minha mãe. Fogo encanta, atrai, queima. Aprendi isso muito cedo. Eu tinha quatro anos de idade, peguei um saco plástico, pendurei nos galhos de um pinheiro no jardim da casa que morávamos, risquei o fósforo e... caos! O pinheiro estava seco, era verão, em menos de um minuto ele torrou! Era um pinheiro que ultrapassava a altura da cumieira do telhado da casa, as labaredas quase atingiram a fiação do poste da rua. Graças a Deus, os prejuízos foram só o pinheiro e o susto em toda a família.
Santa Maria se tornou notícia mundial. Tudo por causa de uma faísca. Faísca que trouxe a tona uma série de pequenos erros, omissões, descasos, irregularidades, abusos, falhas. Em minutos mais de 230 jovens morreram. Juntos morreram mais de 230 sonhos, mais de 230 pais com seus projetos de realizações para os filhos, mais de 230 destinos. E tudo começou com uma faísca...
A porta por onde entraram era a mesma por onde teriam que sair. Para mais de 1000 jovens apavorados ela tornou-se pequena e insuficiente, afinal, mais de 230 jovens ficaram sem saída, esmagados, pisoteados, asfixiados. Pelas reportagens e entrevistas que li até agora, a constatação é aterradora, pelo menos 90% dos estabelecimentos semelhantes ao de Santa Maria, são semelhantes em tudo. Ou seja, rigorosamente nada de segurança. E essa constatação é confirmada em muitos casos pelos próprios jovens, ou seja, os frequentadores que têm consciência das precariedades e riscos mas não resistem aos encantos dos lugares.
Sem saída, chora o Brasil. E chora com razão. Chora a morte de jovens com tanto pela frente, chora a incompetência fiscalizadora do Estado, chora os abusos, os maus usos, chora a fatalidade previsível, chora as leis e as regras que não foram cumpridas.
Santa Maria nos ensinou que a vida é assim. Não deveria, mas é assim, sem saída. A cada dia todos nós saímos sem certeza de voltar. Todos nós em algum momento nos iludimos com portas que nos convidam para o prazer, com fogos aparentemente inocentes para um pouco de diversão, com riscos que sabemos existir, mas achamos que conosco nunca acontecerão. Todos nós já nos encontramos em becos sem saída, não somos nem melhores, nem piores que as vítimas fatais de Santa Maria, somos tão somente sobreviventes.
Que o Espírito Santo mostre a saída para cada pai, mãe, amigo, namorado, namorada, enfim, que cada coração sangrando pela dor da perda seja consolado pelas saídas que só o Espírito Santo dá. Que a vida seja respeitada, reverenciada e agradecida. Que o mover das igrejas que se uniram em oração não dependa de novas tragédias para se unirem de novo.
Não brinque com fogo, é um conselho que vale para os jovens. Mas vale para casais, namorados, famílias, empresários, igrejas, governos, enfim, vale para todos, vale para mim. Que a soberania, a graça e o incomparável amor de Deus Pai seja sobre todos nós através de Jesus, única e segura saída do fogo eterno tão claramente anunciado nas escrituras, e tão pouco acreditado por corações endurecidos e insensíveis a voz profética das páginas sagradas.
Em Santa Maria todos nós morremos um pouco. Perdemos parte do nosso sangue, da nossa raça, da nossa gente. O que faremos agora? Encurralados pelas dores na alma sentimo-nos sem saída. A saída segue sendo seguir. Seguir a vida com os recursos que temos aos quais chamamos de amor. Pois é só com amor que conseguiremos contribuir com nossa parte, ainda que pequena. Pois sem amor, afirmou Paulo, apóstolo, eu poderia dar o meu corpo para ser queimado, no entanto, de nada adiantaria. Santa Maria clama os seus jovens, clama por consolo, clama por reconstrução, clama, enfim, por amor.
Paz!
(publicado oficialmente em janeiro de 2013)
por Edmilson Mendes
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