O humor nada sofre, nada crê, nada suporta

O humor nada sofre, nada crê, nada suporta

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 09:11

Sei que já ficou chato, mas volto ao tema. O humor adoeceu e morreu. O que temos hoje? Um desfile de mau gosto ofensivo e constrangedor. As piadas mais baixas, grossas e chulas ganharam espaço nobre em todas as emissoras, todas.

Critérios e valores são debochados em nome da liberdade de expressão. Liberdade para eles, os humoristas, porque se um puritano qualquer resolver expressar sua fé, ai, ai, ai.

Eles, os humoristas, por trás do humor, ganham imunidade, podem zoar, afrontar, humilhar, ofender e ridicularizar a pessoa ou o tema que bem entenderem, afinal, é só humor. Lógico, existem exceções. Caso do Rafinha Bastos que perdeu sua posição por fazer piada com gente do meio artístico. E só, porque o Gentili, por fazer piada com o drama dos judeus no holocausto, enfrentou apenas umas críticas e depois, bem, depois ganhou o seu programa. Programa que ajuda a engrossar o desfile de futilidades e banalidades do fim de noite.

Poderia citar mais nomes. Mas é desnecessário. Pessoalmente nem acho que o Rafinha Bastos devesse ser afastado do CQC, com ele ou sem ele o nível do programa continua a cair, ele foi apenas um tipo de satisfação que a emissora quis dar à sociedade.

Considerando que o propalado número de evangélicos seja real, se estes milhões de brasileiros que se dizem cristãos simplesmente dissessem não a este tipo de humor muita coisa mudaria. Até porque os artistas do humor são inteligentes, tem capacidade de fazer melhor do que estão fazendo. Já gostei de muitos deles, e em alguns casos ainda gosto, lamentável que estejam se transformando em verdadeiros talentos desperdiçados.

Tem gente boa, é claro. Fazendo humor inclusive sobre parte do mundo gospel, parte essa que pede para ser zombada pelo tanto de heresias e abusos que produz de forma inconsequente, visando apenas e lucro fácil e profano.

O resultado tem sido catastrófico, o número de pessoas conformadas e rindo de coisas que não se ria, só aumenta. No lugar da reflexão, deboche. Rir e debochar é mais fácil, não dá trabalho, dá para fazer no churrasco, na pizza, no carro, no papo, na praia. Reflexão, não. Reflexão pede calma, silêncio, concentração, intimidade. Numa sociedade hiper-conectada e apressada como a nossa já se sabe quem ganha, o riso fácil, é claro. Para quê perder tempo com reflexão?

E o humor avança. Tudo vira piada. A cor, a raça, o sexo, a trapaça, a política, a morte, a pobreza, a fome, a beleza, a feiúra, a obesidade, a magreza etc. E ninguém faz nada a não ser rir. Rir de si mesmo o riso mórbido de humilhações e situações que pedem um choro. Choro? É. Mas não se pode chorar daquilo ou por aqueles que a ditadura do humor manda sorrir, pois parecerá algo politicamente incorreto.

É por essas e outras que o humor nada sofre, nada crê e nada suporta. Afinal, usando o artifício do humor, tudo pode, transformando a antiga desculpa de criança: é só brincadeirinha, em justificativa para os mais impensáveis abusos e ofensas.

No lado oposto geme o amor eternizado no texto de Paulo, tudo sofrendo, tudo crendo e tudo suportando.

Quem me conhece, sabe, gosto de sorrir, aprecio piadas inteligentes, rir emoldura a vida. Mas quando isolamos o princípio do amor que ensina a respeitar o próximo tendo simpatia e empatia por suas dores, virtudes e histórias, resta apenas um inconsequente humor. É o ponto onde se entra em pânico com a zorra total em busca de audiência, custe o que custar, tendo a infelicidade de um deles se auto-definir como o programa da família brasileira. A que ponto chegamos? E agora? Bem, agora é tarde.

Paz!

 

por Edmilson Mendes
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