O mês passado ficou conhecido como “Setembro Amarelo” por impulsionar um movimento de conscientização sobre a prevenção ao suicício. Houve muitos relatos de “sobreviventes”, mas também muitos depoimentos de perdas e despedidas.
Aos que “se salvaram da morte” há muito o que testemunhar, mas para aqueles que perderam seus entes queridos fica sempre uma dúvida “martelando” na cabeça — será que ele perdeu a salvação?
O Guiame contou a história da viúva de um pastor americano, chamado Andrew, que tirou a própria vida após ter enfrentado alguns anos de esgotamento, depressão e ansiedade. E de um pastor que perdeu a esposa da mesma forma — ela se suicidou aos 28 anos de idade, deixando cinco filhos, um deles ainda bebê.
As pessoas ficam se questionando — qual o destino dos suicidas que conheciam a Palavra? Qual a resposta da Igreja?
Os suicidas cristãos perdem a Salvação?
Esse tem sido um dos temas mais controversos dos últimos anos e, de acordo com um artigo publicado no Ministério Fiel, em 2014, “muitos têm respondido de uma maneira emocional e não através da análise bíblica”.
“Aqueles de nós que crescemos no catolicismo sempre ouvimos que o suicídio é um pecado mortal que, irremediavelmente, envia a pessoa para o inferno. Para muitos que têm crescido com essa posição, é impossível despojar-se dessa ideia”, disse o pastor Miguel Núñez, membro do Conselho do Ministério Gospel Coalition (EUA) e autor do artigo “Ao cometer suicídio, o cristão perde a salvação?”.
Ele disse que há quatro posicionamentos básicos: (1) todo aquele que comete suicídio, sob qualquer circunstância, vai para o inferno; (2) um cristão nunca chega a cometer suicídio, porque Deus impediria; (3) um cristão pode cometer suicídio, mas perderá sua salvação e (4) um cristão pode cometer suicídio, sem que necessariamente perca sua salvação.
Núñez lembrou do que diz a passagem que está em Marcos 3.28-29, onde especifica que “todos os pecados e blasfêmias dos homens serão perdoados”, porém, existe o “pecado imperdoável” que é a blasfêmia contra o Espírito Santo ou a rejeição a Ele, quando alguém atribui a satanás as obras de Deus.
Miguel Núñez é pastor da International Baptist Church e presidente do Ministério Wisdom and Integrity em São Domingos, República Dominicana. (Foto: The Gospel Coalition)
Assassinos são perdoados quando se arrependem
O pastor lembrou do caso de Davi: “De maneira particular, queremos destacar que o cristão é capaz de tirar a vida de outra pessoa, como fez o Rei Davi, sem que isso afete a sua salvação.
Outro ponto destacado por ele é a questão de “ser ou não um verdadeiro cristão”. Ao dizer que “cristãos estão se suicidando”, é preciso levar em conta se a pessoa estava evidenciando frutos de salvação ou se era apenas uma pessoa religiosa. “Eu acho que, provavelmente, esse seria o caso da maioria dos suicídios dos chamados cristãos”, apontou.
Sobre um crente sofrer de ansiedade ou depressão, Núñez associou Jó, Moisés, Elias e Jeremias. “Os cristãos podem se deprimir tanto a ponto de quererem morrer. E se esse cristão não tem um chamado e um caráter tão forte como o desses homens, pensamos que pode ir além do mero desejo e acabar tirando a própria vida”, alertou.
“Nesse caso, o que Deus permitir acontecer pode representar parte da disciplina de Deus, por esse cristão não ter feito uso dos meios da graça dentro do corpo de Cristo, proporcionados por Deus para a ajuda de seus filhos”, continuou.
É possível morrer sem pecado?
Muitos pensam ser este o motivo da perda da salvação por parte dos suicidas, mas Núñez lança outra questão: “Se alguém morresse neste exato momento, morreria livre de pecado? A resposta para essa pergunta é evidente: Não! Ninguém morre sem pecado, porque não há nenhum instante em nossas vidas em que o ser humano está completamente livre do pecado”, explicou.
“A realidade sobre isso é que, quando Cristo morreu na cruz, ele pagou por nossos pecados passados, presentes e futuros, portanto, o mesmo sacrifício que cobre os pecados que permanecerão conosco até o momento de nossa morte é o que cobrirá um pecado como o suicídio”, ele acredita.
“Se não somos Deus e não temos nenhuma maneira de medir a conversão interior do ser humano, poderíamos afirmar categoricamente que alguém que deu testemunho de cristão durante sua vida, ao cometer suicídio, realmente não era um cristão?”, lançou a pergunta.
“Como você pode ver, não é tão fácil estabelecer uma posição categórica sobre o suicídio e a salvação. Tudo o que podemos fazer é raciocinar através de verdades teológicas claramente estabelecidas”, ponderou.
“O suicídio não é justificável filosófica, moral e teologicamente”
Para o pastor e escritor Hernandes Dias Lopes, não é racional exterminar a si mesmo, para livrar-se dos dramas da vida. “O suicídio não é justificável filosófica, moral e teologicamente. Não labora a favor de si mesmo quem a si mesmo elimina”, escreveu em seu artigo “Suicídio, o assassinato de si mesmo”, postado em seu blog em 2019.
“O homem não é uma ilha. Não tem o direito de atentar contra si mesmo, para ‘aliviar’ uma dor pessoal, abrindo ao mesmo tempo uma ferida incurável na família e nos amigos. Constitui-se egoísmo incorrigível pensar só em si, a ponto de tirar a própria vida”, disse.
“Além do mais, é uma visão deficiente e equivocada pensar que ao sair de cena, pelo expediente do suicídio, isso não vai fazer a mínima diferença para as pessoas. Pertencemos à nossa família. Não vivemos nem morremos para nós mesmos. Somos membros uns dos outros. Vivemos numa sociedade”, continuou.
“A vida é uma dádiva de Deus. Só ele tem o poder de dar a vida e só ele tem autoridade para tirar a vida. Matar a si mesmo é uma quebra do sexto mandamento da lei de Deus: ‘Não matarás’. Tirar a própria vida é uma usurpação de uma prerrogativa divina. É assassinato de si mesmo”, apontou.
“As pessoas que flertam perigosamente com a morte precisam romper o silêncio e pedir ajuda. As pessoas que vivem no beiral desse precipício precisam ser amadas incondicionalmente, para não se sentirem um fardo para a família. É preciso demonstrar um amor mais profundo a essas pessoas enquanto elas estão vivas, mais do que demonstramos depois que elas morrem. Talvez, isso evitaria sua morte”, aconselhou.
“É preciso enfatizar, finalmente, que para as angústias da alma e para os tormentos do coração, existe um remédio eficaz: a esperança que o Evangelho oferece. Jesus tira a nossa alma do cárcere. Só nele o aflito pode encontrar descanso para sua alma, alívio para sua dor, e razão para sua vida. Só Jesus oferece vida e vida em abundância”, concluiu.