
A Reforma havia baseado sua autoridade em um livro visto como sagrado, a Bíblia, e fragilizando as instituições. O Livro, a partir do Iluminismo e com a Crítica de Forma na Teologia, foi violentamente contestado. Sem a autoridade da Bíblia não havia instituições legitimadoras para definir a verdade. A reação fundamentalista, logo descaracterizada, antiintelectual e sectária, constituiu-se em uma resposta inadequada. Por sua vez, o “livre exame”, como acesso universal dos crentes às Escrituras, foi desvirtuado por uma “livre interpretação”, que fragmenta, agravada pela “livre iniciativa” do denominacionalismo norte-americano, resultando em mais de 25.000 “denominações”; um escândalo e um pecado, compensados, retoricamente, pela eclesiologia neoplatônica da “unidade da igreja invisível”.
A cultura pós-moderna, com seu liberalismo revisionista, descrente de toda verdade, doutrina ou valores — absolutamente relativista —, somente tende a agravar essa tragédia hegemônica no protestantismo dos países desenvolvidos, já exportada para nós, os povos periféricos, e fazendo os seus estragos por aqui. Sem a valorização da história (pré e pós-Reforma), e absorvendo usos e costumes das diversas culturas em que nos inserimos, vamos nos tornando uma pálida imagem da Reforma, que, com freqüência, vem resvalando para um retorno à mentalidade medieval, como com a “batalha espiritual” e a “teologia da prosperidade”, em um fenômeno de massas emergentes: o neo(pós)pentecostalismo. Chamá-lo de protestante se constitui em uma temeridade, pois seria um desrespeito à memória dos reformadores. Apesar de tudo isso, particularmente no hemisfério sul, as igrejas protestantes (ou “protestantes”) continuam crescendo (ou inchando?), umas mais, outras menos, algumas já demonstrando sinais de estagnação, apelando para qualquer método, sem critérios, para sair do marasmo.
Desaparecendo no hemisfério norte, crescendo fragmentado e desordenadamente no hemisfério sul, com as novas (superficiais) gerações não ensinadas sobre a sua história e doutrina, podemos ainda chamar esse fenômeno religioso de protestantismo? Podemos denominá-lo como algo esgotado ou apenas carente de uma nova reforma, com um retorno, atualizante, às suas origens? Com esse presente — sem passado e sem identidade —, qual será o seu futuro? O Senhor da Reforma, em sua providência, poderá outra vez reformá-la.
- Dom Robinson Cavalcanti