No title 1- Estado de alerta
A hepatite C é, atualmente, uma das doenças que mais assustam as autoridades mundiais de saúde por causa de seu avanço. Ela pode passar de 10 a 20 anos lesando o fígado, sem dar qualquer sinal de existência. Muitas vezes, quando a icterícia - característica típica das doenças hepáticas, que deixa pele e olhos amarelados - aparece, o organismo já está muito comprometido, sem possibilidades de tratamento. Por isso, a hepatite C é a maior causa de transplantes de fígado no Brasil. "Estimativas revelam que hoje podem existir no mundo cerca de 170 milhões de pessoas infectadas pelo vírus da hepatite C", diz o hepatologista Hoel Sette Junior. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), de cada 100 pessoas contaminadas com o vírus da hepatite C, 80 podem se tornar portadoras crônicas da doença. Mas os pesquisadores acreditam que esses números podem ser maiores, pois 57 países do Oriente Médio, Leste Europeu, África e Ásia não têm dados epidemiológicos sobre a infecção.
2 - Lenta evolução
Hepatite é o nome dado às doenças que apresentam inflamações nas células hepáticas. Assim, elas podem ser causadas por vários fatores como o uso abusivo do álcool, certos medicamentos ou doenças auto-imunes. A hepatite C é viral, assim como as do tipo A e B. É a infecção crônica mais comum veiculada pelo sangue. Ao entrar no organismo, o vírus HCV (Hepatitis C Virus) dirige-se às células do fígado e começa a se replicar. Depois rompe a membrana das células e as destroem, voltando a circular na corrente sanguínea.
Dessa maneira, a doença se torna crônica e pode causar danos irreversíveis. E o pior: pode levar até 30 anos para aparecer. "A evolução se dá em décadas. Nos primeiros dez anos, em geral, não há sintomas. Na segunda década, o quadro pode evoluir para uma cirrose hepática entre 20% e 40% dos indivíduos contaminados. Após 30 anos, de 2% a 7% dos doentes podem apresentar tumores no fígado do tipo carcinoma", diz Sette Junior. A doença é comum no grupo dos usuários de drogas injetáveis, com 70% de seus indivíduos contaminados pelo vírus C. Também aparece nos portadores de HIV.
3- Aceleradores da doença
Existem fatores que podem contribuir para que a evolução da doença se torne mais rápida: "O álcool é um deles. Quem costuma beber com freqüência pode vir a sofrer as conseqüências mais cedo. Em cinco a sete anos de contaminação, a hepatite pode acabar numa cirrose", avisa Sette Junior. Outras causas: uso freqüente de maconha, doenças associadas como a Aids, ou mesmo outra hepatite, como a do tipo A e B, e a obesidade, pela presença de gordura dentro das células hepáticas.
4- Via de transmissão: sangue contaminado
Até os anos 1990, as contaminações se davam pelas transfusões de sangue, já que não havia nenhum tipo de exame que identificasse a presença do HCV. Porém, hoje essa possibilidade é mínima, pois o controle do sangue doado é rigoroso. Diferente da hepatite B, que tem as relações sexuais como principal fonte de transmissão, no caso da C esse acontecimento é raro.
Os meios de contágio mais comuns são os instrumentos perfurocortantes contaminados, como agulhas, alicates, endoscópios ou instrumentos odontológicos, que não foram devidamente esterilizados. Os especialistas também se preocupam com objetos de uso diário trocados entre as pessoas. Fazer as unhas em salões de beleza e realizar tatuagens ou piercings com instrumentos esterilizados incorretamente podem trazer riscos de infecção.
5- Como diagnosticar
Por ser uma doença assintomática, sua presença só é descoberta no check-up anual ou no exame para doação de sangue. O teste também pode ser solicitado quando o médico suspeita da presença do vírus por causa de sintomas difusos como uma fadiga inexplicável, náusea, perda de apetite, dor de estômago e diarréia sem causas específicas.
Os casos mais avançados podem apresentar urina amarela escura e fezes claras, olhos e pele amarelados (icterícia) e ascite (barriga d'água). Entretanto, o principal método de diagnóstico para a hepatite C é um exame de sangue conhecido como teste de sorologia para anti-HCV. Se o teste revelar a presença do anticorpo, é sinal que houve contágio com o microorganismo. Após a infecção, o exame torna-se positivo entre 20 e 150 dias (em média são 50 dias). Antes disso, um paciente infectado pode receber um "falso negativo".
6- Maneiras de eliminar o vírus
De cada 100 pessoas contaminadas, cerca de 20% eliminam o vírus espontaneamente, sem nenhum medicamento. Para quem não faz parte desse grupo, existe tratamento eficaz para acabar com a doença. Por isso, o primeiro passo ao descobri-la é procurar um hepatologista, gastroenterologista ou infectologista. Mas o sucesso do tratamento depende de alguns fatores.
O primeiro é a carga viral. Quanto menor for a quantidade de vírus da hepatite C instalados no fígado, maiores as chances de cura. A segunda: quanto menos tempo de infecção, menor a cronicidade da doença e o risco de lesões permanentes no fígado, e melhor a resposta do organismo ao tratamento realizado. O tipo da cepa viral também influi no prognóstico.
Os genótipos do tipo 2 apresentam 90% de chance de cura, enquanto o tipo 3 tem 80% de probabilidade de ser eliminado do fígado. "Já o genótipo tipo 1, presente em 70% dos casos no Brasil, é o mais difícil de ser eliminado", avisa Sette Junior.
7- Tratamento medicamentoso
O tratamento baseia-se na combinação de dois medicamentos: o interferon peguilado e a ribavirina. O primeiro é uma proteína naturalmente produzida pelo organismo para fortalecer o sistema imunológico e é administrada na forma subcutânea.
Já a ribavirina é um antiviral que potencializa a ação do interferon e é antiinflamatória. A duração da terapia dependerá do tipo de vírus da hepatite C. "Um exame específico, que quantifica a presença do vírus no sangue, nos dá um indício do prognóstico. Esse exame precisa ser feito antes do início do tratamento. Depois, realiza-se um segundo teste um dia antes da quinta dose dos medicamentos. Se a carga viral for negativa, pode-se dizer que o paciente tem 96% de chances de cura", explica o hepatologista. Além da baixa viremia no sangue, também é importante que o paciente não apresente lesões como fibrose avançada no fígado.
Por Rose Mercatelli