Pastor celebra decisão sobre pastoras na Batista do Sul: ‘Deus chamou as mulheres’

Em entrevista ao Guiame, o brasileiro Lierte Soares, presidente de uma convenção estadual dos Batistas do Sul nos EUA, comentou sobre o resultado da votação histórica.

Fonte: Guiame, Cássia de OliveiraAtualizado: segunda-feira, 17 de junho de 2024 às 21:11
Lierte Soares na reunião anual da Convenção Batista do Sul. (Foto: Instagram/Lierte Soares Júnior).
Lierte Soares na reunião anual da Convenção Batista do Sul. (Foto: Instagram/Lierte Soares Júnior).

Na última quarta-feira (14), a Convenção Batista do Sul (SBC), a maior denominação evangélica dos Estados Unidos, rejeitou a proibição de mulheres pastoras, em uma votação histórica.

A medida para colocar a proibição oficial na constituição da igreja não foi aprovada porque não alcançou a maioria absoluta de dois terços que era necessária. A proposta recebeu votos positivos de 61% dos delegados.

A medida estabelecia que qualquer igreja filiada aos Batistas do Sul deveria nomear apenas homens para os cargos de pastor ou presbítero.

Em entrevista exclusiva ao Guiame, o pastor brasileiro Lierte Soares, presidente de uma das convenções estaduais dos Batistas do Sul nos EUA, explicou como a decisão impacta as congregações.

Lierte é o primeiro brasileiro a se tornar pastor presidente na maior denominação americana. Ele preside a convenção das Igrejas Batistas da região de New England, que abrange os estados de Maine, Vermont, Nova Hampshire, Massachusetts, Connecticut e Rhode Island.

O pastor participou da votação sobre o pastorado feminino na reunião anual da SBC na semana passada. O assunto era um dos mais esperados para ser votado, após anos de debate.

Para o líder, o resultado da votação refletiu a diversidade de pensamentos que existe dentro dos Batistas do Sul. “É uma denominação que tem pessoas que pensam diferente e que respeitam aquelas que pensam diferente”, afirmou.

Contexto do debate


Reunião anual da Convenção Batista do Sul. (Foto: Instagram/Lierte Soares Júnior).

Lierte explicou que, entre os batistas americanos, houve um ressurgimento de uma doutrina calvinista radical que pretende impor suas opiniões, entre elas rejeitar o pastorado feminino.

“Eles querem, a qualquer custo, impor a maneira que acreditam. Temos pessoas que seguem o movimento nove marcas, há alguns radicais, que não são todos”, comentou.

O pastor brasileiro contou que concorda com o resultado da votação. “A Igreja Batista segue a Bíblia, que é a regra de fé e prática. Quando se coloca uma emenda que vai elevar o ministério pastoral feminino a um tipo de pecado é forçação de barra”, criticou.

“Eu estou feliz com o resultado, que mostra que ainda somos democráticos e somos o povo da Grande Comissão. Eu entendo que Deus chama pessoas, independente de gênero”, declarou Lierte.

Atuação feminina em igrejas étnicas 

De acordo com o líder, caso a emenda fosse aprovada, proibindo formalmente mulheres pastoras, afetaria as igrejas étnicas, onde o ministério feminino desempenha um papel importante.

“Nós temos um grupo de congregações que estão representadas por todos os tipos de etnia. Existem algumas culturas que a palavra ‘pastora’ não tem o mesmo entendimento da maneira americana”, ressaltou o pastor.

Ele deu o exemplo das congregações batistas sul-coreanas. “As mulheres que servem nas igrejas coreanas na escola bíblica dominical e no ministério feminino têm o título de evangelistas. Mas essa expressão é traduzida como pastora”, relatou.

“[A emenda] causaria um impacto na congregação local, porque as pessoas já têm por tradição chamar as mulheres de pastoras”.

O líder também citou o exemplo das igrejas batistas negras e hispânicas. “A mulher nessa igrejas tem um papel específico de ensinamento, de influência. Em algumas igrejas, elas também são chamadas de pastoras”, explicou.

E completou: “Então, temos um leque de etnias e culturas que vê a mulher na função pastoral. Às vezes, as mulheres não são ordenadas, mas carregam esse nome ‘pastoras’”. 

A proibição do pastorado feminino causaria confusão nas igrejas étnicas. “Isso seria um grande problema dentro da eclesiologia batista do sul, que não é mais uma convenção restrita aos sulistas norte-americanos brancos. Hoje, a denominação é multicultural, então eu entendo que seria um retrocesso a aprovação dessa emenda”, enfatizou Lierte.

Além disso, o líder questionou: “Poderia causar a sensação de ‘caça às bruxas’. O que a comissão de credenciamento da denominação iria fazer? Haveria um grupo de trabalho para caçar as igrejas que têm mulheres no comando?”.

Declaração doutrinária mantida

Apesar da proposta não ser aprovada, a Convenção Batista mantém sua declaração doutrinária, de 2000, estabelecendo que o cargo de pastor principal é apenas para homens.

O pastor Lierte esclareceu o que a declaração de fé dos Batistas do Sul fala sobre o ministério femino na prática.

“A Igreja Batista não é contra o ministério pastoral feminino. O que o documento de fé de 2000 fala é que a função de pastor sênior é para os homens exercerem. A denominação mantém esse critério com o objetivo de trazer uma organização na eclesiologia. O critério não foi criado para fechar a porta para o ministério feminino”, ponderou.

“Vemos mulheres liderando, a mulher pode ensinar, e a denominação tem várias linhas de ação com o ministério feminino”, acrescentou.


Lierte Soares. (Foto: Instagram/Lierte Soares Júnior).

Defesa do ministério feminino

A independência das igrejas ligadas à Convenção Batista do Sul é uma marca da denominação. Por isso, Lierte defende que quem deve formalizar o cargo de pastora é a congregação local, conforme sua cultura.

“É a igreja local que determina sua filosofia de ministério. E o bonito de ser batista é isso, a autonomia: eu posso ser uma igreja batista na visão de propósitos, numa visão mais tradicional de ministério, numa visão ministerial de células. A formalização do cargo de pastora vai de igreja para igreja”, ressaltou.

O pastor brasileiro não acredita que a Convenção Batista do Sul, que é mais conservadora, se abrirá completamente para mulheres pastoras.

“Dificilmente você vai ver a convenção endossando o pastorado feminino. Talvez a nossa geração não verá isso”, avaliou.

Ele criticou o argumento de que a ordenação de mulheres abre brechas para o liberalismo teológico – incluindo questões LGBT – entrar na igreja.

“Essa é uma narrativa norte-americana e muito pontual. Porque temos mulheres pastoras no continente africano e os africanos não se abriram para o liberalismo como os norte-americanos se abriram”, exemplificou o pastor.

E concluiu: “As mulheres, em sua maioria, fazem a obra de Deus sem nenhum tipo de orgulho e de radicalização: ‘Eu tenho que ter o cargo de pastora’. Mulher é uma bênção”.

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