O herdeiro da Coroa britânica, rei Charles III, anunciou que terá uma cerimônia multirreligiosa, dando início a um novo tempo na realeza da Grã-Bretanha.
Charles está tentando superar as diferenças entre os grupos religiosos que compõem a sociedade cada vez mais diversificada, conforme lembra a AP News.
Atingir esse objetivo é fundamental para os esforços do novo rei para mostrar que a monarquia, uma instituição de 1.000 anos com raízes cristãs, ainda pode representar o povo da Grã-Bretanha moderna e multicultural.
Abandono do cristianismo
É verdade que Charles, o governador supremo da Igreja da Inglaterra, enfrenta um país muito diferente daquele que celebrou com adoração a coroação de sua mãe em 1953.
Setenta anos atrás, mais de 80% do povo da Inglaterra era cristão, e a migração em massa que mudaria a face da nação estava apenas começando. Esse número agora caiu para menos da metade, com 37% dizendo que não têm religião, 6,5% se autodenominam muçulmanos e 1,7% hindus, de acordo com os últimos dados do censo.
A mudança é ainda mais pronunciada em Londres, onde mais de um quarto da população tem uma fé não-cristã. Charles reconheceu essa mudança muito antes de se tornar rei em setembro passado.
Já na década de 1990, o então príncipe Charles, sugeriu que gostaria de ser conhecido como “o defensor das fés”, não mais focado somente no cristianismo. Conforme lembrou a AP News: “Essa é uma distinção importante para um homem que acredita no poder de cura da ioga e já chamou o Islã de “um dos maiores tesouros de sabedoria acumulada e conhecimento espiritual disponível para a humanidade”.
O cristianismo teve papel fundamental nas coroações britânicas
Vale lembrar que a coroação da rainha Elizabeth II mostra que a monarquia é sagrada e que ajudou a definir seu reinado e sua compreensão da função da monarquia sob Deus.
Na cerimônia, Elizabeth entrou na abadia ao canto do Salmo 122: “Alegrei-me quando me disseram: Entraremos na casa do Senhor”. Entre os vários juramentos de governo, ela jurou “manter as Leis de Deus e a verdadeira profissão do Evangelho” e “manter no Reino Unido a Religião Protestante Reformada”, além de “preservar inviolavelmente o estabelecimento da Igreja da Inglaterra, e a doutrina, adoração, disciplina e governo dos mesmos”.
Conforme aponta o historiador cristão Martyn Whittock, estes juramentos foram feitos sob a Bíblia que a rainha beijou, na cerimônia de coroação. As Escrituras Sagradas tinham o papel de manter a rainha sempre consciente da lei e do Evangelho de Deus como regra para toda a vida e governo dos Príncipes Cristãos.
Ela foi lembrada: “Aqui está a Sabedoria; Esta é a Lei Real; Estes são os Oráculos vivos de Deus”, destacou Martyn.
“Após as leituras da Bíblia e a recitação do credo, ela foi ungida com óleo e experimentou uma tradição que remonta ao Antigo Testamento e encontra sua expressão mais exaltada na palavra hebraica mashiach (ungido)”, explicou.
“O ato enfatiza que o monarca que é ungido por Deus deve modelar sua vida e governar em Cristo. Antes disso, o coro cantou: O sacerdote Zadoque e o profeta Natã ungiram rei Salomão; e todo o povo se alegrou e disse: ‘Deus salve o rei, Vida longa ao rei, Que o rei viva para sempre’”, mencionou ainda o historiador.
Rainha Elizabeth. (Foto: Wikimedia Commons)
‘Uma religião global’?
A coroação do rei Charles, que vai acontecer no próximo sábado (6), será realmente bem diferente da coroação de sua mãe Elizabeth II.
Em vez de ser um evento estritamente cristão, já que o rei Charles é o chefe da Igreja da Inglaterra, esta será uma coroação de estreias para o monarca que se declarou o “defensor das fés”.
Conforme lembra o Charisma News, para sua coroação, o rei Charles convidou líderes religiosos das principais religiões da Inglaterra, incluindo líderes budistas, hindus, judeus, muçulmanos e sikhs para participar ativamente da cerimônia.
Em outra estreia, o clero feminino também vai desempenhar um papel proeminente na coroação, junto com o rei Charles fazendo uma oração em voz alta.
O fortemente criticado arcebispo de Canterbury, Justin Welby, afirma que a coroação “reconhecerá e celebrará a tradição”, mas também incluirá “novos elementos que refletem a diversidade de nossa sociedade contemporânea”.
Lembrando que Welby foi rejeitado pelos líderes anglicanos conservadores por apoiar orações de bênção sobre a união conjugal de pessoas do mesmo sexo.
‘Primeiro passo em direção a uma religião mundial’
Entre os “novos elementos” que serão acrescentados à cerimônia de coroação está a “homenagem do povo” — momento em que o arcebispo de Canterbury convidará todas as pessoas do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, entre outros territórios, a prestarem homenagem ao rei como “defensor de todos”.
A ordem de serviço dirá: “Todos os que assim o desejarem, na abadia e em qualquer outro lugar, digam juntos: juro que prestarei verdadeira fidelidade a Vossa Majestade e a seus herdeiros e sucessores de acordo com a lei. Que Deus me ajude”.
Grupos anti-monarquia se irritaram com a ideia de um pedido tão presunçoso, chamando-o de “ofensivo, surdo e um gesto que despreza o povo”.
Graham Smith, porta-voz do Republic, um grupo anti-monarquia que planeja protestar no sábado da coroação, diz: “Em uma democracia, é o chefe de estado que deve jurar lealdade ao povo, e não o contrário”.
Conforme lembra James Lasher, do Charisma News: “Essas mudanças na coroação trazem consigo muitos questionamentos sobre o impacto espiritual que essa cerimônia pode ter em todo o mundo”.
“A coroação de Charles será uma blasfêmia diante de Deus que evita o cristianismo por uma abordagem mais universalista da fé? Que impacto teria uma monarquia espiritualmente morta sobre os cidadãos que acabaram de ser chamados a jurar lealdade não apenas ao monarca, mas também a seus herdeiros?”, o jornalista questionou.
“Este é o primeiro passo em direção a uma religião mundial que muitos acreditam ser um passo no caminho para a aceitação e adoração da Besta, conforme predito no Apocalipse?”, continuou.
“Com discernimento, conhecimento e sabedoria, muitos podem ver que uma grande mudança está chegando para o povo da Grã-Bretanha. Talvez a maior questão permaneça: a mudança será para melhor ou para o prejuízo do mundo?”, questionou mais uma vez ao concluir.