Time de futebol feminino do Mato Grosso do Sul se recusa a jogar contra atleta trans

Pela postura adotada em campeonato amador, o time Leoas CG recebeu uma 'Moção de Apoio' da Câmara Municipal de Campo Grande.

Fonte: Guiame, com informações da Gazeta do Povo e Câmara de Campo GrandeAtualizado: quinta-feira, 25 de setembro de 2025 às 14:52
Equipe de futebol feminino Leoas CG recebe Moção de Apoio entregue pelo vereador Rafael Tavares (PL). (Foto: Luiz Gustavo/Câmara Municipal de Campo Grande)
Equipe de futebol feminino Leoas CG recebe Moção de Apoio entregue pelo vereador Rafael Tavares (PL). (Foto: Luiz Gustavo/Câmara Municipal de Campo Grande)

A partida entre os times amadores de futebol feminino Leoas e Fênix, marcada para as 17h15 do sábado, 6 de setembro, em Campo Grande (MS), foi interrompida antes mesmo de começar.

Ao descobrirem que a equipe adversária havia incluído uma jogadora transexual na escalação, as Leoas decidiram não participar do jogo.

A técnica Bárbara Augusta Santana comunicou imediatamente à organização que sua equipe não entraria em campo.

“Eu disse que não colocaria minhas meninas em risco. Eu respeito as pessoas que não se identificam com seu gênero biológico, mas aquela pessoa continua tendo DNA e formação masculina. É mais rápida, mais forte, poderia machucar com uma bolada, um carrinho”, explicou ela.

“Minha equipe é formada por mães solo, personal trainers, enfermeiras, motoristas de aplicativo, que lutaram muito para conquistar um espaço no futebol feminino. Não podem colocar sua integridade física em risco, nem abrir mão do direito de jogar exclusivamente entre mulheres.”

Em seu perfil oficial no Instagram, o time publicou: “Mulheres x Mulheres. Categoria feminina não é mista, nem categoria da diversidade.”

 
 
 
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Apesar da pressão da organização para que a partida acontecesse e da reação agitada das jogadoras do time adversário, as atletas das Leoas apoiaram a decisão da treinadora de não jogar.

Derrota por W.O.

Diante da recusa, o árbitro entrou em campo e declarou a derrota por W.O. – resultado aplicado quando uma equipe se recusa a competir.

Após o episódio, a técnica Bárbara decidiu retirar o time da competição.

“A organização se comportou de forma desleal, não informou a respeito da presença da atleta trans até o momento da partida”, diz a técnica.

“Nós nos sentimos desmoralizadas e desprestigiadas. Recebemos muitos ataques nas redes sociais. Uma jogadora nossa, que também disputava partidas por uma outra equipe, foi dispensada do outro time, sem explicação. Ficamos isoladas, queriam nos silenciar.”

O campeonato segue em andamento, e outras equipes já disputaram partidas contra a Fênix, aceitando a participação da atleta trans.

Em resposta aos acontecimentos, o time Fênix publicou uma nota oficial:

“Essa atleta, assim como todas nós, busca no futebol, um espaço de convivência, lazer e reconhecimento. Reafirmamos nosso compromisso com a inclusão, o respeito e a diversidade. O esporte é para todas. Transfobia não é opinião: é violência”.

No dia seguinte, 7 de setembro, as Leoas voltaram a campo em outro torneio amador e conquistaram o bicampeonato com uma vitória na final.

“Revertemos a situação da véspera com uma vitória que nos deu o bicampeonato em um campeonato diferente. E, com o passar do tempo, começamos a perceber que quem nos atacava era uma minoria, e que a maior parte das pessoas concorda com nossa decisão”, afirma a técnica.

Tony Gol, responsável pelo evento e organizador de torneios femininos há sete anos, atribui o episódio à ausência de regras claras sobre o tema.

Ele afirma que não esperava enfrentar uma situação como essa no futebol amador de Campo Grande. “Concordamos com a decisão das Leoas de não jogar, mas também entendemos o lado da Fênix. Fiquei no meio de um fogo cruzado”, declarou.

Diante da polêmica, Tony chegou a considerar suspender os torneios femininos no próximo ano, como forma de evitar novos conflitos.

Disputa desigual

Celina Luci Lazzari, diretora da Associação de Mulheres, Mães e Trabalhadoras do Brasil (Matria), lamentou a saída das Leoas do campeonato.

“As Leoas tiveram que abandonar um campeonato para o qual haviam se inscrito. São mulheres, mães, trabalhadoras que se dedicam ao esporte por amor e que se planejaram para esse momento”.

“Muita coisa é arrancada de uma mulher a quem é negado o direito ao esporte, ao lazer, entre as suas. Só há competição real, justa e segura, em categorias exclusivas para mulheres.”

A Associação Matria divulgou recentemente um manifesto posicionando-se contra a participação de pessoas trans em categorias femininas do esporte.

“Quando atletas do sexo masculino entram nas categorias femininas, não há inclusão, há exclusão: mulheres perdem espaço, bolsas, medalhas e até sua integridade física”, afirma Celina.

“A ciência é clara: tratamentos hormonais não eliminam as vantagens fisiológicas masculinas, densidade óssea, força, massa muscular, envergadura, capacidade pulmonar. Essas diferenças permanecem mesmo após anos de hormonioterapia.”

A técnica Bárbara, que tem 44 anos e é policial federal, sugere que pessoas trans disputem campeonatos em uma categoria própria.

“No mesmo dia do incidente, foi realizado um amistoso entre duas equipes trans. Isso é inclusão de verdade! E não retira o espaço que nós mulheres lutamos tanto para conquistar.”

Homenagem

Em 23 de setembro, a Câmara Municipal de Campo Grande aprovou, em regime de urgência, o Projeto de Lei nº 11.526/25, que determina o sexo biológico como único critério para a definição do gênero de atletas em competições esportivas oficiais no município.

A proposta, aprovada por 19 votos a 6, agora aguarda sanção da prefeita Adriane Lopes (PP).

De autoria dos vereadores Rafael Tavares e André Salineiro (PL), o texto proíbe a participação de pessoas trans em equipes que não correspondam ao sexo de nascimento:

“O sexo biológico será o único critério definidor do gênero dos competidores em competições esportivas oficiais realizadas no âmbito do Município de Campo Grande/MS, vedando-se a participação de transexuais em equipes que correspondam ao sexo oposto ao de nascimento”.

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