Gosto de futebol. Terça passada aconteceu o último amistoso da seleção com vistas a Copa da África. Durante o segundo tempo, enquanto eu e meu filho voltávamos do trabalho, ouvíamos pelo rádio do carro a transmissão. Jogo normal, sem grandes emoções, como a maioria dos jogos que não valem nada. Até que uma jogada chamou a atenção do narrador e do comentarista.
Algum jogador do time adversário deu uma entrada desleal e o Kaká não gostou. O locutor da rádio narrou assim: ''Olha lá, o Kaká não gostou, ficou nervoso, até empurrou o outro jogador! Está até xingando! Então o comentarista emitiu a seguinte opinião: Justo o Kaká que é tão calminho e educado! Imagino a dificuldade que ele deve ter para pronunciar um palavrão, deve ter sido assim: 'seu... seu... seu bobinho!'' (Depois seguiram-se as gargalhadas).
A forma como os profissionais daquela rádio se expressaram, geralmente é a mesma que boa parte da sociedade se expressa em relação aos evangélicos. O não crente não quer para si o modo de vida do crente, mas pensa e julga saber como um bom crente deve se comportar. Enquanto a prática diária do crente é coerente com aquilo que crente-pode-fazer e aquilo que crente-não-pode-fazer, ninguém fala nada. Ao menor deslize, no entanto, chovem críticas: ''Mas fulano não diz que é crente? Que raio de crente é ele? Se é crente por que bebeu? Não sabia que crente era tão pavio curto! Ah, esses crentes não me enganam!...''.
Já que meu exemplo é um futebolista, fiquemos neles. Se o jogador diz aos quatro cantos que é evangélico, mas vive com a vida enrolada, vive sendo desleal no campo, nos treinos e no clube, vive sendo flagrado em situações comprometedoras, a mídia o detona, tripudiando em cima de sua fé. Por outro lado, se o jogador não nega sua fé e pauta sua conduta por um bom testemunho, vida correta, lealdade no campo, nos treinos e no clube, atividades sociais compatíveis com seu discurso, a mesma mídia o ridiculariza, tratando-o como ingênuo, fanático, alienado. Quem acompanha futebol conhece os dois exemplos, eles desfilam pelos campos do mundo inteiro.
E o Kaká? Como disse, não vi a cena, apenas ouvi pelo rádio. E pelo que ouvi, locutor e comentarista estão errados. Calma! Não estou afirmando que locutor e comentarista inventaram ou mentiram. Estou afirmando apenas que estão errados. E estão errados porque compraram a cartilha que diz o que crente-pode-fazer e o que crente-não-pode-fazer. Cartilha que infelizmente foi escrita, impressa e distribuída por parte dos próprios evangélicos, com aprovação talvez minha, talvez sua.
Crentes empurram, brigam, perdem a calma, cobiçam os principais lugares no reino dos céus, cortam orelhas de quem represente ameaça, julgam injustamente, alimentam crendices, exageram, não têm paciência e, gostemos ou não, também xingam, cada um do seu jeito, mas xingam. Sempre fazem isso? Não. Nunca fazem? Fazem. Uns mais, outros menos. Contextos e variáveis explicam. Normalmente, tudo acaba acontecendo em função de situações tensas, pressões, temperamentos, desesperos, injustiças. O ser humano, independente de sua confissão de fé, como se diz, não tem sangue de barata. Age, reage e interage. Deveria ser com destempero? É certo que não. Mas humanamente, de vez em quando, ou de vez em sempre!, erramos, pecamos, decepcionamos.
Nem o Kaká, muito menos outro jogador evangélico ou outro que não seja evangélico, deveriam ser julgados por cartilhas de certo ou errado. No campo, julgue-se o atleta pelas regras do esporte, está bom. Na vida, e aqui os campos esportivos estão incluídos, deixe com o Autor das regras para se viver bem: amar a Deus e amar ao próximo. E se errar? Tanto o do bom testemunho quando erra, como o do mau testemunho quando acerta, todos têm o mesmo acesso ao perdão e a graça, presentes do amor do Pai por todos nós.
Sou evangélico, mas não só. Também sou paulistano, brasileiro, cidadão, pai, boleiro(!) de fim de semana, daqueles que aguentam correr uns quinze minutos, sou amante da minha esposa, aprecio passar longos momentos na Saraiva escolhendo livros, gosto de pizza e churrasco, invisto tempo em conversas edificantes com crianças, jovens, velhos, doutores, experientes, artistas, iletrados, estudantes, sejam crentes ou ateus, admiro bons filmes etc. E daí? Para quê informar algumas coisas que gosto? O motivo é simples: Jesus me livra do mal, mas não me tira do mundo.
É um erro grosseiro a sociedade querer tratar os evangélicos como ETs. Não menos grosseiro é o erro cometido por parte dos próprios evangélicos, quando comportam-se como ETs. Temos que agir, reagir e interagir aqui, com nossa gente e cultura, respeitando valores e pessoas. Tudo sem diminuir, omitir ou negar a fé. Difícil? Sim. A Bíblia nunca disse que seria fácil. Impossível? Não. Veja o exemplo do próprio Kaká. Faz tempo que ele figura entre os melhores do mundo. Deste nosso contaminado e corrompido mundo. E, no entanto, as seduções deste mundo não têm sido eficientes para fazê-lo corromper sua fé.
E então, o Kaká pode cair e decepcionar? Sim. Ele, eu e você, todos podemos. Assim como Davi, Jacó, Sansão, Pedro e Raabe caíram e decepcionaram em determinadas fases de suas vidas. E se acontecer o pior? Se vier o escândalo? Bem, como disse no título deste texto, usando uma expressão popular: não sou advogado do Kaká. Mas sei quem é. Quem o apresentou a mim foi João em sua primeira carta, no capítulo dois e versículo um. Passo a palavra a ele: Meus filhinhos, estas coisas vos escrevo, para que não pequeis; e, se alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Jesus Cristo, o justo.
É bom saber que temos um advogado assim. Um advogado sem pecado, imperfeições e injustiças. Um advogado capaz de não só nos defender, mas também de nos absolver. Este advogado é Jesus, o foco único da nossa fé. Pastores, ministros de louvor, irmãos e atletas podem nos decepcionar. Nosso Advogado jamais nos decepcionará. Com Ele a causa está ganha e totalmente quitada. Qualquer dúvida quanto a quitação da sua dívida, passe no escritório dEle, onde tudo foi definitivamente resolvido, o local fica no monte do gólgota, no alto, ao centro, contemple a cruz onde Ele esteve. Pronto. Agora você já sabe, Ele não está lá. Pois conquistou plenos poderes para defender os seus, interceder por eles junto ao Pai e garantir-lhes enfim, a vitória final. Vai tranqüilo, Kaká. Vai tranqüilo, amigo leitor. Cumpre com teu chamado e vocação. Se o Brasil perder a copa não terá problema algum, é só jogo de futebol. O que não podemos perder é a partida final da história deste mundo. Para isto, não se engane, esteja junto do Advogado certo, Jesus Cristo, o justo.
Paz!
pr. Edmilson Mendes
Edmilson Ferreira Mendes é teólogo. Atua profissionalmente há mais de 20 anos na área de Propaganda e Marketing. Voluntariamente, exerce o pastorado há mais de dez anos. Além de conferencista e preletor em vários eventos, também é escritor, autor de quatro livros: ''Adolescência Virtual'', ''Por que esta geração não acorda?'', ''Caminhos'' e ''Aliança''.