O profeta Jonas foi o primeiro profeta transcultural do Antigo Testamento. Outros profetas já haviam profetizado às nações estrangeiras como Isaías e Amós, mas Jonas foi o primeiro a ser enviado especificamente a um povo estrangeiro. Jonas morava numa cidade próxima a Nazaré, na Galileia. Profetizou no reinado de Jeroboão II, o rei que teve o reinado mais longo e mais próspero do reino do Norte.
Deus ordenou-o a ir a Nínive e clamar contra ela. O pecado daquela grande cidade havia subido até aos céus. Nínive era a maior, a mais opulenta e a mais perversa cidade daquele tempo. Era a capital do grande império assírio. Era uma cidade fortemente cercada por muros com quase trinta metros de altura e tão largos que dois carros podiam correr por cima deles. A cidade tinha cerca de mil e duzentas torres, onde ficavam sentinelas que vigiavam a cidade.
O império assírio era cruel com os povos conquistados. A cidade de Nínive estava cheia de sangue, resultado de sua violência imposta aos povos. Agora, Deus ordena Jonas a ir à essa cidade violenta e clamar contra ela. O profeta se dispôs, mas para fugir da presença do Senhor. Jonas desceu de sua cidade até Jope, e ali tomou um navio para Társis, a última região do ocidente, conhecida na época. Ele foi para lá porque Társis ficava no fim do mundo. Ali as pessoas nunca haviam ouvido falar de Deus (Is 66.19).
Jonas foge do caminho da obediência e Deus manda a tempestade atrás dele. Foi descoberto no porão do navio e identificado como o culpado da trágica tempestade. Ao ser interpelado, confessou ser hebreu e temer ao Deus criador. Sua teologia era ortodoxa, mas sua vida estava errada. Era ortodoxo de cabeça e herege de conduta. Sua teologia não governava sua vida. Os pagãos invocam a seus deuses, mas Jonas não ora ao Deus verdadeiro. Jonas está pronto a ser lançado do navio, mas não se dispõe a obedecer. Jonas preferiu a morte à obediência. Jonas fez opção pela morte, mas Deus preferiu lhe preservar a vida.
Jonas foi compelido a obedecer. Anunciou o juízo de Deus a Nínive, mas não se alegrou com o arrependimento dos ninivitas. Ficou irado porque o povo ninivita se humilhou e ficou desgostoso com Deus porque este exerceu sua misericórdia e não seu juízo. Desejou a morte para si ao ver seus potenciais inimigos salvos. Ficou triste com a conversão de seus ouvintes. Aborreceu-se até à morte por causa do estrondoso sucesso de sua missão. A seu contragosto, sua mensagem surtiu o mais esplêndido resultado registrado na história. Uma cidade inteira voltou-se para Deus, por causa da sua mensagem.
Jonas reclama de Deus e justifica os motivos de sua fuga frustrada. Fugiu não porque era covarde. Fugiu não porque se sentia incapaz para tão gigantesca obra. Fugiu não porque duvidava do poder de Deus. Fugiu porque conhecia a Deus o suficiente para saber que ele é misericordioso e tardio em irar-se. Fugiu porque sabia que Deus voltar-se-ia para os ninivitas se esses se voltassem para ele. O profeta está querendo morrer porque os ninivitas estão querendo viver. Jonas está irado porque Deus abrandou sua ira. Jonas está ardendo em ira porque os ninivitas estão fugindo da ira vindoura.
O livro de Jonas termina com a exortação de Deus a ele e com o seu silêncio gelado. Não sabemos se Jonas se dispôs a obedecer em vez de continuar insistindo em morrer. A razão desse desfecho é porque essa resposta deve ser dada por você e por mim. Jonas está entre nós; aliás, dentro de nós. Jonas mora debaixo da nossa pele. O coração de Jonas bate em nosso peito. O sangue de Jonas corre em nossas veias. Nós temos o DNA de Jonas. Nós somos Jonas. Cabe-nos o ônus dessa decisão: arrepender e viver ou não se arrepender e morrer.
Por Hernandes Dias Lopes - pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil, escritor, membro da Academia Evangélica de Letras do Brasil e diretor executivo da Editora Luz para o Caminho.
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