O espírito revolucionário não se sacia nunca. Os revolucionários franceses de butique, nossos contemporâneos, orgulhosos de se acharem e de serem considerados novos agentes da inclusão irmanados, claro, daqueles antigos agentes franceses pela liberdade, igualdade e fraternidade mundial, pensam que a França ainda deve muito ao mundo, será mais uma vez a nação salvadora, iluminada, da humanidade, a mola propulsora do progresso, da evolução mundial. Caiu no esquecimento ou não foi o bastante o que alguns enfurecidos aprontaram quando da Revolução Francesa, no afã de eliminar o Antigo Regime no século XVIII. Ou as duas coisas.
O movimento gayzista francês é mais hábil. Ele não é burro porque sabe que do Antigo Regime ainda têm resquícios de sobra na alma de religiosos do mundo todo. Enquanto seus integrantes mostram seus corpos gordos e feios e suas atitudes corporais, suas vestimentas coloridas de doer, uma estética dos infernos, Cristo agoniza mas não morre. Mas quem decide a morte, quem tem a chave do céu e do inferno, é Jesus, ninguém mais.
No século XVIII, jacobinos franceses, no afã de extinguir o Ancien Regime e mudar a essência de tudo, entre outras atrocidades, guilhotinaram pessoas, violaram a consciência de padres, estabeleceram novos cultos pagãos e confiscaram livros. Conseguiram parcialmente o que queriam. Hoje o cristianismo agoniza junto ao paganismo disfarçado de arte e produção artística.
Mas enganou-se quem pensou que o espírito revolucionário desiste facilmente. Como o próprio diabo, ele é esforçado demais em atingir metas, nunca para antes de alcançá-las. A meta do momento é mais inclusão. Eles pensam, se não for por guilhotina, de que modo? Não podendo de fato, ainda, extinguir a religião de vez do coração dos franceses e do mundo, não resta mais nada aos escarnecedores senão apelar ao sarcasmo, à ironia e à blasfêmia.
Numa blasfêmia de autodepreciação, a abertura das Olimpíadas na França deste ano de 2024 contou com uma encenação de enojar cristãos pelo ataque promovido à fé alheia, à fé cristã. A hubrys ideológica não os deixa fazerem algo direito. Se naquele tempo a fúria revolucionária fez tudo aquilo com padres, livros, pessoas, rituais sagrados, na abertura das Olimpíadas encenaram uma santa ceia pagã com drag queens, comparando-a à Santa Ceia cristã de Jesus com seus apóstolos.
Além da injúria envernizada da arte, uma encenação plagiada, muito, muito cinismo com a imitação da obra de Leonardo da Vinci. Os organizadores publicaram pedido de desculpas, alegando que nunca houve intenção de ofender a fé alheia. Certamente que teve muita gente que caiu nesta conversa por medo de não ser cancelado, do politicamente correto. A desculpa da porta-voz do evento, Anne Descamps, foi esta, em uma coletiva de imprensa: “Claramente, nunca houve a intenção de mostrar desrespeito a qualquer grupo religioso. Pelo contrário, eu acredito que [com o diretor artístico da cerimônia] Thomas Jolly, realmente tentamos celebrar a tolerância comunitária. Olhando para o resultado das pesquisas que compartilhamos, acreditamos que essa ambição foi alcançada. Se alguém se sentiu ofendido, estamos, claro, muito, muito arrependidos”.
Falando em injúria, muitos cristãos, inclusive franceses, claro, se sentiram injuriados e manifestaram nas redes sociais seus descontentamentos e suas indignações. Cristão ou não, mas em defesa do cristianismo, o deputado estadual Jessé Lopes, do Estado de Santa Catarina, publicou em seu Instagram que os zombadores pagãos miraram na Santa Ceia e acertaram na Arca de Noé, de tanto bicho que tinha na mesa do escárnio que foi montada na abertura dos jogos olímpicos.
Dessa maneira ofensiva à fé alheia, deste jeito, eles não conscientizam ninguém. O máximo que estes revolucionários ideologicamente armados conseguem é despertar o sentimento de nojo e aversão da população crente e não crente, formada também por não-héteros, além de se autodepreciarem. Além disso, fazem lembrar do clássico do Marques de Sade, Os 120 dias de Sodoma: Ou a Escola da Libertinagem.
A Bíblia traz que o mundo é dividido entre néscios e prudentes, virgens néscias e virgens prudentes, sábio e justo, ímpio e injusto, e por aí só acrescentando o extenso rol de especificidades humanas que muito bem pode estar associado à gente que não está aí para nada, que é a maior parte de um amplo e único conjunto denominado humanidade, e aqueles que procuram a liberdade pelo conhecimento. Trazendo este conhecimento sob forma categorias de seres humanos para os dias de hoje, podemos atualizá-lo, quem sabe compreendendo que o mundo está dividido entre quem lê mais e quem lê menos. E quem lê mais, procura se libertar pelo conhecimento da verdade, está entre aqueles que já tomaram conhecimento do espírito revolucionário, que é anticristão, secular, pagão, por essência. E também tem os materialistas e os espiritualistas. A França está dominada pelo espírito materialista. Claro que materialista não consegue ver para além de seus próprios interesses e das leis físicas de causa e efeito. Então, quanto menos conhecimento mais opinião (doxa) e quanto mais opinião menos verdade.
Salmo 1 adverte que é bem-aventurado o homem que não anda segundo o conselho dos ímpios, nem se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos escarnecedores.”. Em Provérbios 19:29 está escrito: “Preparados estão os juízos para os escarnecedores, e os açoites para as costas dos tolos.”.
Chateaubriand escreve O gênio do cristianismo no momento pós Revolução Francesa. Do prefácio extrai-se: “Ressurgia a França do caos revolucionário, quando o Gênio do Cristianismo apareceu; todos os elementos da sociedade estavam confusos: a mão terrível que intentara ordená-los, não conseguira ainda seu intento: despotismo e glória não tinham podido criar a ordem.”
Os franceses iluminados sentem-se os embaixadores da ciência racional no lugar do conhecimento misteriosamente divino. Certamente que, como afirma Chateaubriand, uma boa lei em Atenas, berço do conhecimento, não é uma boa lei em Paris.
Chateaubriand, na mesma obra, faz a advertência crucial: “De feito, muita gente creu que a ciência nas mãos do homem desseca o coração, despoetiza a natureza, inclina os espíritos fracos ao ateísmo, e do ateísmo ao crime: que as belas-artes, pelo contrário, deleitam-nos o tempo, enternecem-nos a alma, enchem-nos de fé na divindade, e encaminham pela religião à prática das virtudes.”.
Logo, uma arte feia, como a mesa dos escarnecedores que “iluminou” a abertura das Olimpíadas na Cidade do Apagão (Macron esqueceu de pagar a conta de luz), não se compara a verdadeiramente bela Última Ceia de Leonardo da Vinci. Uma leva ao crime, a outra à virtude. No Brasil, o crime é este: “Art. 208. …vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso: Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.”. Mas quem foi preso? E quem seria preso no Brasil? Os escarnecedores dos escarnecedores (os primeiros entre aspas).
Sergio Renato de Mello é defensor público de Santa Catarina, membro da Igreja Universal do Reino de Deus e autor de obras jurídicas e dos seguintes livros: Fenomenologia de Jornal, O que não está na mídia está no mundo e Voltaram de Siracusa.
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