Milhões de usuários do YouTube se emocionaram com o falso vídeo do "menino heroi sírio", que consegue resgatar uma pequena menina encurralada por um atirador. Mas um grupo de cineastas noruegueses admitiu ter sido responsável pela produção do vídeo.
Eles disseram ao BBC Trending, a seção da BBC que monitora as mídias sociais, que as cenas foram filmadas na ilha de Malta com a intenção de serem apresentadas como se fossem reais.
No vídeo, divulgado na internet, um menino corre em meio a tiros e cai. Segundos depois, se levanta e ajuda uma menina menor a escapar dos projéteis disparados por supostos atiradores.
Veículos de imprensa e internauras acreditaram que o garoto se fingia de morto para realizar o resgate – embora não fique claro se ele chega a ser atingido ou não.
Cineastas lançam filme curto sobre a Síria na internet e não deixam claro que é ficção (Foto: Lars Klevberg)
O diretor Lars Klevberg, 34, que mora em Oslo, escreveu o roteiro depois de assistir à cobertura jornalística do conflito na Síria. Ele disse que a intenção da brincadeira deliberada é gerar uma discussão sobre o tema das crianças nas zonas de conflito.
"Se eu conseguisse fazer um filme e o apresentar como se fosse real, as pessoas poderiam compartilhá-lo e reagir com esperança", afirmou.
"Nós filmamos em Malta em maio deste ano, em uma locação que foi usada em filmes famosos, como Tróia e Gladiador", afirmou Klevberg.
"O menino e a menina são atores profissionais de Malta. As vozes ao fundo são de refugiados sírios que vivem em Malta."
Ativistas e jornalistas chegaram a divulgar uma carta aberta condenando a peça. Eles afirmam, em linhas gerais, que o filme de Klevberg faz com que as imagens reais que denunciam abusos percam credibilidade.
O filme teve quase 8 milhões de acessos, mas na manhã desta terça-feira havia sido retirado do YouTube.
O grupo se orgulha de fazer um filme que potencialmente enganou milhões de pessoas?
"Eu não me senti desconfortável. Publicando um vídeo que poderia parecer autêntico pretendíamos tirar vantagem de uma ferramenta frequentemente usada na guerra: fazer uma filmagem que parece ser real. Queríamos ver se o filme chamaria atenção e causaria debate, principalmente sobre as crianças na guerra."
"Também queríamos ver como a mídia responderia a esse tipo de vídeo."
'Motivações honestas'
A produção recebeu verbas do Instituto de Filmes Norueguês e do Fundo Audiovisual do Conselho de Artes da Noruega.
O instituto forneceu em outubro de 2013 o equivalente a cerca de R$ 107 mil para a produção - um orçamento considerado 'baixo' pela instituição.
Os cineastas disseram que, ao pedir a ajuda, já haviam deixado claro que pretendiam publicar o vídeo na internet sem esclarecer que se tratasse de uma obra de ficção. Eles também disseram que os financiadores do projeto conheciam e apoiaram suas intenções.
"O fato de crianças sobreviverem aos tiros deveria dar pequenas pistas de que aquilo não era real", disse o produtor, John Einar Hagen.
"Tivemos longas discussões com os financiadores sobre a ética envolvida em fazer um filme como esse."
Para a encarregada de curta-metragens do instituto norueguês de filmes, Ase Meyer, "o filme não foi uma forma cínica de atrair atenção".
"Eles tinham motivações honestas", afirmou.
Meyer disse que ficou "surpresa" por tanta gente acreditar na veracidade da filmagem.
"Quando vejo o filme percebo que o menino é atingido, mas continua correndo. Não há sangue na criança", disse.