Brasileiro que esteve na Coreia do Norte diz que leu a Bíblia de forma camuflada

Rafael Diedrich já esteve em 200 países difíceis para o Evangelho, entre os quais Afeganistão, Síria, Líbia e Bielorússia.

Fonte: GuiameAtualizado: quarta-feira, 22 de abril de 2020 às 18:16
Rafael Diedrich leu trecho da Bíblia escondido dentro de publicação local, na Coreia do Norte. (Foto: Reprodução/YouTube)
Rafael Diedrich leu trecho da Bíblia escondido dentro de publicação local, na Coreia do Norte. (Foto: Reprodução/YouTube)

Em uma entrevista a Luca Martini, o missionário Rafael Diedrich, do canal Malaviajante, falou sobre sua estada no país mais fechado do mundo, a Coreia do Norte.

O país, governado com mão de ferro por Kim Jong-un, está nas manchetes devido a informações, ainda não confirmadas, do estado de saúde de seu líder.

Junto com sua esposa Lídia, Rafael já entrou em 200 países, e o casal está próximo de bater o recorde mundial, faltando apenas oito nações. Rafael conta que por causa da pandemia tiveram que segurar um pouco as viagens.

Pastor presbiteriano, Rafael contou sobre suas experiências na Coreia do Norte, onde após bastante burocracia para o visto, que teve de ser liberado antes pela China, conseguiu entrar. Como lá não pode ter celulares, ele disse que os aparelhos dele e da esposa tiveram de ficar em território chinês.

“Para entrar no país existe um processo longo. Primeiro [é preciso] ter um visto da China, para depois ter visto da China de cinco anos, que é um visto caro e difícil de tirar. Depois é preciso entrar com processo para tentar entrar na Coreia do Norte. E lá é bem complexo, demorou quatro, cinco meses para gente conseguir esse visto”, explica Rafael.

Rafael conta ainda que mesmo com o visto enfrentou dificuldades até chegar ao país. Quando a gente conseguiu, a gente estava no Caribe para ir para Coreia do Norte e aí veio furacão Dorian, no ano passado no Caribe e cancelou nossos voos. A gente achou que não ia conseguir chegar na Coreia do Norte, mas conseguimos chegar lá e entramos. Foi uma doideira porque quando a gente entrou chegou um tufão lá”, lembra.

Rafael explica que o país é totalmente fechado não só ao Evangelho. Mas a qualquer outra coisa. Ele conta que o país tem um estilo de vida baseado no pensamento que o avô do Kim Jung-um e que seguem até hoje, para que haja a continuidade da dinastia. “Eles acreditam que fechando o país, vão conseguir se transformar em uma nação perfeita”, diz Rafael.

Deuses

“Ele [Kim Il-sung] criou uma nova ideologia que só existe lá, baseada nele mesmo, que é praticamente um deus”, conta Rafael. “Quando a gente visitava as fábricas, as escolas, as ruas e as estátuas víamos que as pessoas reverenciam o avô, o pai [Kim Jong-il], e o neto agora, como se fossem deuses”, conta.

“Ele veio aqui 222 vezes [um exemplo], ele colocou o pé aqui, essa foto [dele] não pode cortar nem um pedaço quando tirar a foto, as fotos são sagradas, como se fosse você num templo budista e você não pode fazer algumas coisas determinadas. É um negócio bem maluco”, diz.

Rafael diz que os visitantes não têm liberdade para ir onde querem sozinhos, ele e a esposa foram acompanhados durante todo o tempo por uma pessoa destacada pelo regime.

Apesar da curiosidade que eles tinham sobre o modo de vida no país, Rafael conta que as pessoas de lá também têm curiosidades sobre o resto do mundo, pois eles não têm informações pois tudo é controlado pelo regime. Eles perguntaram como as pessoas se vestem e os perfumes que usam “lá fora”, ele conta.

“A gente almoçou com eles, e serviram um bom banquete porque para o turista que paga caro – e é bem caro ir para lá você – acreditam que têm que servir bem. Então eles servem um bom almoço”, conta Rafael, frisando que para a cultura ocidental as comidas são bem diferentes.

Rafael diz que naquele momento perguntou quantas vezes eles comiam por dia, e soube que a refeição acontece apenas uma vez por dia.

Ele diz que, tecnicamente, todo mundo tem emprego porque é um sistema comunista e o conceito é que todo mundo tem que ter a mesma coisa, explica. “Eles recebem exatamente a mesma coisa. Então todo mundo come uma vez por dia e trabalham de segunda a sábado e, aos domingos, fazem trabalhos voluntários, como varrer praças”, diz.

Rafael conta que não podem fazer nada sozinho, “tem um guia específico que, você entrou no país, o cara já tá lá.  “Inclusive, o americano que faleceu lá e todo mundo indica que foi caso de tortura em prisão, foi porque ele roubou um cartaz político”, diz.

Rafael conta que a pessoa que estava na fronteira, para acompanhá-lo, pediu a câmera e só devolveu após passar por todos os procedimentos de segurança. O casal de brasileiros foi seguindo o tempo todo. “Ele é treinado [para essa função], um dos poucos que fala inglês no país”.

Ele conta que só podia registrar as partes boas do país. O contato com os habitantes é impossível por causa da língua, embora alguns tentem. Mas sempre com o segurança do regime ao lado.

Rafael conta que os norte-coreanos estão sempre tentando vender alguma coisa, e os valores são para o governo.

A maior loucura que eu já fiz na minha vida talvez tenha sido ser preso na Líbia, o país que cortou a cabeça dos cristãos, durante cinco horas. “eles questionam por que a gente era cristão e o que estávamos fazendo lá”, lembra. A segunda coisa foi ter lido a Bíblia na Coreia do Norte, onde é proibido até entrar com ela.

“Eu não quis entrar com a Bíblia para não gerar problema, então eu escrevi alguns versículos de Coríntios”, conta, como forma de driblar a segurança para ler as Escrituras no país. Rafael conseguiu ler, de forma camuflada, o texto de 1 João 4: O amor lança fora todo medo.

Igreja perseguida

Rafael conta que se estima que na Coreia do Norte tenha mais de 100 mil cristãos presos e uma das técnicas que usam bastante para levar a Bíblia para dentro do país é em sacos de arroz. Por isso chamam de “igreja do arroz”, porque as Bíblias acabam entrando escondida desta forma.

Não existe autorização para existência de igrejas. “Zero liberdade para igreja ali dentro”, diz, embora haja muitos cristãos. Mas não conseguem medir, mas eles calculam que hoje, pessoas livres cristãs lá dentro, chegue em torno de 300 mil pessoas residentes. Mas não tem como saber o número exato, afirma.

“A liberdade que o cristianismo dá é uma oferta muito boa para o cara, apesar que ele tá preso [dentro do regime] porque a liberdade é uma liberdade do nosso pecado, não só a liberdade de espaço. Então o cara pode estar preso no país, mas ele é livre do pecado. Isso, para as pessoas de lá é algo muito para se agarrar, no Evangelho de Cristo”, conta.

Rafael se considera uma pessoa corajosa. Entre os 200 países visitados, ele já esteve em lugares difíceis, como Afeganistão, Síria, Líbia e Bielorússia. “Mas [na Coreia do Norte] eu fiquei com um pouquinho de medo”, conta ele sobre ter levado partes da Bíblia.

Para conseguir cumprir seu intento de ler a Bíblia lá, ele diz que se afastou do guia dizendo que iria ao banheiro.  Então conseguiu ler alguns versos de Coríntios e explicar sobre igreja em um vídeo sobre a igreja perseguida, disponibilizado para algumas agências. O material fará parte de um livro sobre a visão do brasileiro de todos esses países em relação à tolerância ao cristianismo.

“Eu li, fiz toda o devocional em relação às escrituras, mas a ideia foi promover algo que não ninguém faz, que é entrar no país e ler as escrituras lá dentro”, conta.

 “É meio maluco, mas a ideia é realmente mostrar o Evangelho chegando em vários países”, finaliza.

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