Ortodoxia.... será?

Ortodoxia.... será?

Fonte: Atualizado: sábado, 29 de março de 2014 às 03:29

Muitos líderes hoje alçam a voz em defesa da ortodoxia. Entre os diversos grupos evangélicos é comum vermos disputas inflamadas com relação ser ou não ser uma determinada experiência, expressão ou ato litúrgico coerente com a ortodoxia evangélica. As discussões são tão acaloradas que por vezes causam celeumas no Corpo.

Frases como: "Isto não faz parte de nossa tradição...", "Isso não faz parte de nossa cultura...", "essa experiência é heterodoxa, portanto esse comportamento, bem como essas pessoas devem ser repudiadas como hereges". Pensamentos nessa linha têm me inquietado bastante.

O que é realmente ortodoxia evangélica? Procedimentos diferentes podem dividir o Corpo de Cristo? Será que a nossa tradição ou a tradição de quem quer que seja foi pesada a luz da revelação bíblica? E se estivermos errados quando julgamos o cristianismo alheio, será que estamos dispostos a mudar?  A exercer misericórdia? Será que recebemos a misericórdia da parte de outros irmãos que não entendem a visão que abraçamos ou nossa maneira de viver o cristianismo?

O que acontece quando a ortodoxia é na verdade heterodoxia que se perpetuou transformando-se em tradição da igreja? Jesus, certa feita denunciou o comportamento tradicional que havia se instalado entre o judaísmo que, por vezes invalidava a Palavra de Deus. Então, a tradição dos fariseus tornou-se o padrão ortodoxo da época, o que não estava totalmente alinhada ao que deveria ser crido e praticado pelo povo de Deus.

Por ortodoxia podemos entender - "Qualidade de uma declaração doutrinária que se acha de acordo com o ensino revelado no Antigo e no Novo Testamento"; etimologicamente essa palavra deriva-se de duas outras palavras gregas orthos e doksa que poderia ser traduzido como aquilo que parece reto, justo. Todavia, a palavra tem sido usada entro de um contexto em que faz referência a um comportamento ou liturgia geralmente aceitos.

A inflexibilidade em torno da pseudo-ortodoxia (ou o que se julga ser ortodoxo) tem gerado muitos problemas no decorrer da historia da igreja cristã. Logo após a reforma vemos grupos contestando e até perseguindo outros por causa do batismo por imersão (o que na época não era considerado prática comum mesmo entre os reformados). No século XVII encontramos o pietísmo com seu apelo à pratica das escrituras e vida piedosa contrapondo a esterilidade religiosa da época. Assim vemos em diversos lugares e em diversos períodos práticas religiosas insípidas, que, tomando um caráter solene de ortodoxia, furtaram o verdadeiro sentido da adoração e comunhão com Deus, precisando que as estruturas da religiosidade fossem abaladas por ventos de avivamento, que, primeiramente, restaurava a Igreja, tanto a liderança quanto a membresia, em seguida revolucionava a sociedade.

Hoje não encontro diferenças significativas. Pela internet, em debates, através de diversos tipos de publicações, vemos a defesa de certos nichos evangélicos em detrimento do que é realmente importante, levar o homem a uma experiência pessoal com Deus. Apesar de reconhecer o valor das tradições e certos costumes esposados entre nós, não posso elevá-los a um status superior às Escrituras.

A quantidade de proibições e coisas similares é assutadora. Quando questionamos a origem de determinada proibição, geralmente ouvimos algo como: "A Palavra diz....". Daí perguntamos: "Onde está escrito?". E quando o texto não for tirado fora de seu contexto original, ouvimos: "Na verdade não sei, mas não faz parte de nossa tradição". Tudo bem, todos tem direito de ter tradições. Tradições de família, eclesiáticas, etc. Mas... em nome dessa tradição julgar alguém, depreciá-lo ou até mesmo modificar a Palavra? Daí a coisa fica complicada. Às vezes as discussões são tão banais que chegam a ser hilárias.  

Senão vejamos: Em um culto bem movimentado, alguns irmãos movimentam o corpo no ritmo da música (não sensual é claro), daí um irmão de um outro grupo argumenta ser tal procedimento contra a ortodoxia ferindo a liberdade desses irmãos de adorarem a Deus, isso quando não tentam convencer que as traduções estão erradas e na verdade a palavra dança tem outro significado qualquer que não aquele que realmente significa.

O exagero em alguns casos é tão grande que não se pode ultrapassar aquilo que está convencionado entre os homens, aquilo que em uma reunião (que muitas vezes não se sabe em que tempo ou em que contexto), foi acordado. Não é raro situações em que o Espírito Santo torna-se mero coadjuvante (se é que isso é possível) em nossos cultos aparentemente perfeitos.

Creio que é desejo de Deus encontrar verdadeiros adoradores. Ainda que a tradição ou a liturgia seja algo bom e deve ser levada em conta, a Bíblia não diz que o Senhor procura os defensores da tradição, ou ainda os baluartes da imutabilidade litúrgica. O Senhor é imutável, Sua Palavra é infalível e é Seu desejo que nesse século tenhamos mais sensibilidade espiritual que nos leve a discernir Seu desejo além dos padrões religiosos estabelecidos. A verdadeira ortodoxia deriva-se não do que achamos ou acharam por nós, mas daquilo que a Bíblia realmente diz. Não do que entendemos ser bíblico mas do que é realmente bíblico.

Acredito de todo meu coração, que o véu rasgado de alto a baixo na crucificação de Jesus signifique que não precisamos ficar do lado de fora de Sua presença, e ainda que alguns tentem com seus impedimentos e pura religiosidade "costurar novamente" o pesado véu, o Pai tem levantado aqueles que ousam olhar além dessa pesada cortina. Não olham para os pedaços no chão, nem para aqueles que as tentam costurar, mas caminham confiantes, pois, ainda que respeitem as tradições, querem mais do que isso. A religiosidade já não os satisfazem mais, querem um encontro real com o seu Salvador, algo que possa mudar a sua vida, a sua família, o seu ministério e o meio social em que vive. Pessoas apaixonadas por Deus e pela Sua presença, que quando são tocados e partilham de uma íntima comunhão com Deus podem verdadeiramente olhar para um irmão, que mesmo diferente dele, ver a pessoa de Jesus.  Espero que essa compreensão, que este avivamento inunde nossa nação, transformando vidas, igrejas, e se alastrando por toda a sociedade, não com um simples movimento, ou uma cultura religiosa, tampouco com uma mera experiência, mas com um estilo de vida...Jesus!

Roberto Carlos Cruvinel é pastor, bacharel e mestre em Teologia,  diretor da Escola Teológica Pastor Virgílio dos Santos Rodrigues, escritor, conferencista e articulista, com diversos artigos publicados em periódicos evangélicos.

Este conteúdo foi útil para você?

Sua avaliação é importante para entregarmos a melhor notícia

Siga-nos

Mais do Guiame

O Guiame utiliza cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência acordo com a nossa Politica de privacidade e, ao continuar navegando você concorda com essas condições