O amor de mãe pode representar o aconchego que um filho precisa, seja na fome, no sono, na dor ou no pé embatumado de lama pela folia na brincadeira. Nos cuidados, nos ensinos, nas diversões e provisões, é comum se ouvir a expressão “mãenheee”, como se fosse uma convocação, à toda hora e instante. Muitas vezes até exaure o ouvido e as energias, de tanta solicitação. Mesmo que os filhos cresçam, de tanto ter ouvido suas requisições, pelo longo período de seu desenvolvimento, a sensação é de que o chamamento segue ecoando. Essa sensação, muitas vezes, uma mãe só consegue acalentar no aconchego de uma oração.
O fato é que a maternidade não é tão simples, como as romantizações em propagandas de pomadinhas e shampoos para bebês. Um filho requer o colo físico, mas também o colo da alma. O físico envolve as provisões materiais, como moradia, alimentação e vestimenta. Pode ser que alguma mãe consiga dar o melhor dos luxos, com os melhores tecidos contornando o berço, a chupeta importada, as roupinhas fofíssimas e todos os utensílios que consegue imaginar, compondo o universo infantil. Outras mães conseguem dar apenas o básico.
O colo físico, sendo sofisticado ou não, sem o colo da alma será vazio de sentido de pertencimento. Apenas com a presença do colo da alma é possível dar segurança e confiança para o sujeito vir a existir. Claro, esse colo não é apenas uma instância materna, pois o pai está convocado para construí-lo também. O colo da alma é aquele que acolhe, inclui, cuida e ama incondicionalmente. Com esse colo, mesmo que o colo físico tenha apenas o básico, sem sedas nem rendas, o filho terá do que mais precisa para se tornar pessoa.
Nesse tempo de pandemia, quando as demandas de atenção aumentaram e a expressão “mãenheee” se intensificou sobremaneira em nossas casas, é necessário estabelecer o que é realmente importante: a cada chamada pela mãe está embutida uma solicitação do colo da alma. Não diz respeito apenas à necessidade de cama, mesa e banho. Mas, solicita essencialmente o colo que abraça e o olhar que penetra positivamente as emoções, afirmando assim a segurança.
Pode ser desafiador monitorar as próprias emoções para que possam fluir com graça e acolhimento. Ao contrário do que está no imaginário popular, dificilmente as mães tiram de letra essa condição, especialmente nesse período da pandemia. Como atender à tantas demandas? As respostas podem não ser fáceis, especialmente levando em conta que cada família é única e tem um modo próprio de funcionar. Mesmo assim, arrisca-se em dizer que os casais que se organizam em parceria, seguem melhor. Uma mãe não deveria ser abandonada à própria sorte em meio aos contínuos “mãenheee’s”. A participação do pai pode ser tudo o que uma mãe precisa para conseguir relaxar de vez em quando. Dessa forma, poderá encontrar um tempo para se reconectar com sua interioridade, lembrando de que além de ser mãe também é pessoa. Assim poderá refazer e afofar o colo da alma, que seu filho tanto precisa.
Uma mãe exaurida pode enturvar sua percepção sobre o colo que doa ao seu filho. Pode achar que se o alimentou, o higienizou e o entreteu, já o supriu do colo necessário. Facilmente confunde o “ter um filho” com o “ser uma mãe”. Ter um filho passa a ideia de aquisição de um objeto, com o qual passou a ter mais trabalho. Ou então como quem passou de um status a outro, agora tendo uma pessoinha fofa, que chama de filho, para ostentar. A ótica em apenas “ter um filho” pode ser desgastante.
No entanto, “ser mãe” é deixar nascer uma nova condição, à medida em que acolhe seu filho para amar, aceitar, cuidar e educar para a vida. Significa assumir a função materna com responsabilidade, dedicação, habilidade e amor. Mas, essa função não será requisitada por toda vida. A função materna, assim também a paterna, tem prazo de validade, pois quando o filho alcançar a vida adulta ele não necessitará mais dos pais para ser cuidado e educado. Espera-se que tenha aprendido a caminhar pelas próprias pernas, para assumir a gestão de sua vida como adulto. Claro que, apesar da função materna e paterna ter um prazo de existência, a posição como pais jamais se extinguirá. Por isso, a postura de honra aos pais, por parte dos filhos, continuará valendo para qualquer fase da vida.
A maternidade pode ser uma longa caminhada, que precisa ser regada pela graça de Deus. Assim sendo, as mães que concedem o colo da alma a seus filhos, encontrarão o colo que elas precisam para a sua alma também.
Por Clarice Ebert, Psicóloga (CRP0814038), Terapeuta Familiar, Mestre em Teologia, Professora, Palestrante, Escritora. Sócia do Instituto Phileo de Psicologia, onde atua como profissional da psicologia em atendimentos presenciais e online (individual, de casal e de família). Coordenadora e palestrante, em parceria com seu marido, do Ministério Vida Melhor (um ministério de cursos e palestras). Membro e docente de EIRENE do Brasil.
* O conteúdo do texto acima é uma colaboração voluntária, de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal Guiame.
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