Epifania

Epifania

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 10:16

Qual é o quid proprium da igreja de Jesus Cristo no mundo? Que função tem a igreja na sociedade? Qual é a dimensão indelegável da igreja na teia de forças que tecem a vida humana? A igreja ainda é relevante nesta sociedade moderna ou pós-moderna? Vale a pena ser igreja e trabalhar pela manutenção e expansão da igreja ou vivemos dias onde a vida religiosa está ultrapassada e obsoleta? A espiritualidade é apenas uma outra forma de falarmos em auto-ajuda ou, de fato, há algo na experiência espiritual que a torna imprescindível à saúde pessoal e coletiva?

As respostas que encontro para estas perguntas podem ser resumidas na palavra "sagrado": a igreja é o ambiente facilitador, a comunidade guardiã e a protagonista na manifestação e experiência do sagrado na sociedade. Rudolf Otto diz que a experiência do sagrado é o sentimento de "mistério terrível e fascinante": misterium tremendum fascinans. Mistério porque trata daquilo que extrapola a razão humana e sua capacidade de apreensão por si mesma; mistério é aquilo a que se tem acesso mediante revelação; trata do sobrenatural, do metafísico. Tremendo, ou terrível, porque produz pavor, assombro, êxtase, arrebatamento e alumbramento. E fascinante porque cativa e seduz.

A teologia diz que a experiência do sagrado acontece mediante a manifestação do divino, a aparição surpreendente de Deus, quando somos surpreendidos diante de algo, ou alguém, que nossa razão não dá conta. Esta manifestação, aparição, revelação do divino é chamada de epifania. Por exemplo, quando Jacó exclamou "Deus estava aqui e eu não sabia" ou o profeta Isaías disse "Ai de mim, pois meus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos". Da mesma maneira, quando o apóstolo Pedro caiu aos pés de Jesus gritando "Afasta-te de mim, pois sou pecador" ou Saulo de Tarso tombou a caminho de Damasco, cegado pela luz e pela voz do Cristo ressurreto.

Conta-se que, muitos anos antes de sua morte, o rabino Abraham Joshua Heschel sofreu um ataque do coração quase fatal. Seu melhor amigo estava ao lado de seu leito. Heschel estava tão fraco que só conseguiu sussurrar: "Sam, sou grato pela minha vida, por todos os momentos que vivi. Estou pronto pra partir". Fez uma longa pausa e concluiu "Nunca na minha vida pedi a Deus sucesso, sabedoria, poder ou fama. Pedi a Deus assombro. E Ele me concedeu".

Vivemos em um mundo que perdeu não apenas o contato com o sagrado e a sensibilidade para percebê-lo, mas também, e tristemente, a capacidade de desejá-lo. A igreja é ainda a última fronteira. A igreja é o dedo que aponta a realidade do sagrado. A igreja é a síntese das epifanias. A igreja é a comunidade dos assombrados. A igreja é a reunião dos que caíram de joelhos diante de Jesus de Nazaré, o Cristo de Deus. Bendito seja, antes e agora e para todo o sempre. Amém.

Ed René Kivitz   é mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo, escritor, conferencista e pastor da Igreja Batista de Água Branca, na Zona Oeste de São Paulo, tendo obras e pastorais publicados neste site:   www.ibab.com.br .  

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