Passagem para a vida

Passagem para a vida

Fonte: Atualizado: sábado, 29 de março de 2014 às 3:24

Corria o ano de 1983 e eu cursava o terceiro ano do curso de bacharel em teologia oferecido pela Faculdade Teológica Batista de S. Paulo. A disciplina era Religiões, seitas e heresias, e o programa constava de levarmos representantes das tais seitas e religiões para que nos apresentassem suas heresias, de modo que, após sua explanação, pudéssemos argui-los e, depois, já com os preletores ausentes, promovermos a correção das ditas heresias. Naquela noite recebemos um padre católico para nos apresentar a Teologia da Libertação. O padre foi breve e simples. Riscou uma linha de alto a baixo, dividindo o quadro negro em duas metades. Escreveu as palavras vida e morte, uma em cada metade. Depois, propôs uma brincadeira, como se todos os alunos fossem de primeira série. Disparou uma série de palavras e pediu que indicássemos onde deveriam ser escritas: no lado da vida, ou no lado da morte. As palavras foram mais ou menos as seguintes: aborto, fome, emprego, saúde para todos, violência, prostituição infantil, terra para plantar, inferno, moradia, doenças, perdão de pecados, amor, opressão econômica, graça, tráfico de drogas, vingança, ódio, reconciliação, pão, criança de rua, família, divórcio, favela, esgoto a céu aberto, medicina, educação, e assim por diante. Quando o quadro estava preenchido dos dois lados, recitou em voz alta as palavras de Jesus Cristo: ''Eu vim para que tenham vida, e vida completa''. Encerrou com um comentário: ''Jesus veio para nos oferecer tudo o que está escrito no lado vida, e nos convocar para lutar contra tudo o que está escrito no lado morte. Isso é Teologia da Libertação''.

Naquela noite me converti ao que mais tarde vim a conhecer como Cristianismo de Libertação, na expressão de Michel Lowy. Uma compreensão do Evangelho que engloba diferentes leituras teológicas, como, por exemplo, a Teologia da Libertação e a Teologia da Missão Integral, que surgiram nas décadas de 60 e 70 na América Latina, mas também os movimentos avivalistas e missionários, como, por exemplo, o ocorrido na Inglaterra de John Wesley e na Morávia de Nicolau Von Zinzendorf. O Cristianismo de Libertação é não dualista, isto é, não separa espírito e matéria, corpo e alma, tempo e eternidade. No Cristianismo de Libertação, a salvação em Cristo implica a vitória sobre a morte em todas as suas dimensões, desde a história para a eternidade - o reino de Deus que foi inaugurado aqui e se consumará ali.

Foi também na minha juventude que ouvi um pregador afirmando que ''quando o selo do absoluto romano foi rompido no domingo da ressurreição, ficou decretado que, não apenas a morte, como também todos os agentes promotores e mantenedores da morte, haviam sido definitivamente vencidos pela erupção da vida''.

Assim celebro, desde a minha juventude, a vida abundante prometida por Jesus a todos os que se abrem para o sopro da vida do Espírito Santo de Deus. Vida que se derrama sobre todos e cada um, bem como sobre todas as casas, vilas e cidades, e também nações, fazendo com que a terra se encha do conhecimento da glória do Senhor como as águas cobrem o mar.

Assim desejo à Ibab, a todos os seus membros, frequentadores e amigos, uma feliz Páscoa: passagem para a vida, e um vivificado domingo de ressurreição. Aqui e além. Hoje e para sempre. Amém.

Ed René Kivitz   é mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo, escritor, conferencista e pastor da Igreja Batista de Água Branca, na Zona Oeste de São Paulo, tendo obras e pastorais publicados neste site:   www.ibab.com.br   .

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