O divã digital aceita tudo e não respeita ninguém. Não importa a hora, o momento, o dia. Não vem ao caso se somos ou não amigos. Amigos mesmo, de verdade, daqueles que compartilham perdas, dramas, fraquezas, pratos, preferências, segredos. Não amigos de redes sociais, aqueles mais de mil amigos que nem sabemos quem são ao certo. Enfim, do nada, mais que de repente, você está lá apenas surfando nas ondas da tela de um computador qualquer, aparece o desabafo, a ofensa, a indireta, a baixaria, a sujeira que estava embaixo do tapete de um “amigo” que na maioria das vezes nem amigo é. E você, sem entender e nem acreditar no que está ali publicamente, lê.
Tem de tudo. Sentenças piegas. Críticas infundadas. Ódios gratuitos. Haschtags modinhas. Deboches inexplicavelmente agressivos. Apelações religiosas. Correntes melosas. Gramáticas porcas. Lavação de roupa suja. Justificações injustificáveis. Em muitos casos, não em todos obviamente, até porque existem muitas postagens dignas de compartilhamento, de reflexão, que edificam, que nos fazem ver temas complexos por ângulos que não pensávamos, mas, em muitos casos, o que se vê é um desfile infindável de mi-mi-mi.
E o mi-mi-mi presente tem nome e sobrenome: coitadismo e vitimismo. Nunca uma geração escancarou o sentimento de pena de si mesma como a atual. É incrível o número de pessoas que se entregam a autocomiseração e a autopiedade, fazendo questão de mostrar o quão coitadas e vítimas se julgam e, muitas vezes, pelos motivos mais banais, por picuinhas, não aceitando e muito menos suportando o mínimo cenário que as coloquem em situações de humilhação. Afinal, humilhação é muito humilhante para que o orgulho e a arrogância suportem.
Esse ambiente produz consequências bem ruins. Como exemplo cito as relações. Por conta de tanto mi-mi-mi potencializado pelo politicamente correto que a agenda cultural impõe, vejo muitas pessoas optando por um desempenho hipócrita, falas e textos que insistem em ficar na posição em cima do muro no palco do teatro social. Acabando por deixar tudo muito chato, previsível, sem sabor, sem emoção, sem vida.
Precisamos resgatar urgentemente o olho no olho, o falar a verdade com respeito, o abraço sincero, a firmeza através de palavras brandas, a empatia tão necessária, a humildade de tentar entender o olhar do outro, a reverência pelas surpresas e soberania de Deus que se manifestam todo dia a nossa volta através de gente como a gente. Gente que sofre, que erra, que acerta, que tem virtudes, que tem defeitos, gente que vibra e luta encarando suas conquistas e mazelas sem tentar explicar as coisas com cansativos mi-mi-mis.
O MI-MI-MI do evangelho é mais, muito mais. É MI-lagre, é MI-stério, é MI-ssão. É o MI-lagre de sermos o que chegamos a ser apesar de ser quem éramos. É o MI-stério de sorrir, amar, perdoar, acreditar e confiar apesar de todas as evidências apontarem para o caos das impossibilidades aparentes. É a MI-ssão de ser igreja, de carregar o nome de cristão em qualquer hora, lugar e situação.
Por todos os mi-mi-mis diários que cansam, incomodam, atrapalham e desmotivam, desculpas. Sinceras desculpas. Acho que podemos ser bem melhores, acredito que podemos contribuir mais arregaçando as mangas, indo do outro lado do mundo ou do outro lado da rua, apenas se rendendo aos planos de Deus para cada um de nós. Seja no período que for, na tribulação que for, seja na época das vacas gordas ou das magras.
Vamos em frente, pois deixar a posição de coitados ou de vítimas, em alguns casos, depende muito mais de nós mesmos. No exato momento em que soubermos e conseguirmos proferir as palavras que proferiu um cara que tinha tudo para se sentir coitado e vítima, então nos tornaremos os atores principais de nossa própria história. Quais palavras? Estas: “O Senhor deu, o Senhor tirou, bendito seja o nome do Senhor”, “Antes eu Te conhecia apenas de ouvir falar, mas agora Te vejo com os meus próprios olhos.” Quem foi esse cara? Jó, alguém que certamente sofreu bem mais que eu e você e, mesmo assim, resistiu as possibilidades fáceis do mi-mi-mi.
Paz!
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