Getúlio Cidade

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Getúlio Cidade é escritor, tradutor e hebraísta, autor do livro A Oliveira Natural: As Raízes Judaicas do Cristianismo e do blog de mesmo nome onde publica estudos bíblicos com ênfase na história, língua e cultura judaicas relacionadas ao cristianismo.

Ketôret — o incenso agradável a Deus

O ketôret, como todas as coisas sagradas, requeria extremo cuidado e diligência.

Fonte: Guiame, Getúlio CidadeAtualizado: quarta-feira, 29 de outubro de 2025 às 15:21
(Imagem ilustrativa gerada por IA)
(Imagem ilustrativa gerada por IA)

O incenso preconizado no serviço do Tabernáculo de Moisés, cuja palavra é ketôret, como todas as coisas sagradas, requeria extremo cuidado e diligência. A começar por sua composição única — feita de especiarias aromáticas raras e específicas —, não podia ser reproduzida por quem não fosse da linhagem sacerdotal nem ser feita fora do serviço do Tabernáculo. A pena para quem o reproduzisse para seu próprio uso, como perfume, era a exclusão do povo.

Essa advertência existia certamente porque o resultado da composição gerava um cheiro agradabilíssimo que, porém, era de uso exclusivo para o serviço a Deus, a ser ministrado rigorosamente dentro do Santuário. As Escrituras equiparam o incenso à oração feita exclusivamente a Deus, dentro dos princípios por Ele estabelecidos, assim como as ordenanças específicas para o uso do incenso por Arão.

Nossas orações são únicas e dirigidas apenas ao Senhor. Quando feitas com um coração humilhado, segundo sua vontade, exclusivamente guiadas por seus mandamentos, são motivos de prazer para Ele e capazes de desencadear respostas de grande efeito. Davi compreendia bem o poder da oração e sobre isso escreveu: “Eu te invoco, ó Deus, pois queres me ouvir” (Sl. 17:6). Ele também teve a sensibilidade para compreender que o incenso simbolizava a oração sincera endereçada a Deus: “Suba a minha oração perante a tua face como incenso (ketôret)” (Sl. 141:2).

O incenso estranho

Ao introduzir a ordenança para o incenso no altar de ouro do Santuário, o Senhor adverte para que não se ofereça sobre ele “incenso estranho” (Êx. 30:9), ou seja, qualquer coisa relacionada ao ketôret que não fosse prescrita pela Torá. No entanto, não muito tempo após essa ordenança, há um episódio entre os israelitas que incorre exatamente nesse erro.

Trata-se da famigerada revolta de Coré, juntamente com seus 250 seguidores. Coré e seu grupo eram levitas, mas não sacerdotes da casa de Arão e, portanto, não tinham autorização para produzir nem oferecer o incenso sagrado. No entanto, é exatamente isso que reivindicam, em um ato de rebeldia contra Moisés, Arão e, em última instância, Deus. Não satisfeitos com o serviço levítico do Tabernáculo, queriam tomar para si o lugar de Arão e seus filhos para oferecer o ketôret. Assim, ofereceram o incenso estranho e foram devorados pela terra sob seus pés.

Esse é um bom exemplo bíblico de uma oferta em desacordo com as instruções divinas. Coré foi movido não por sinceridade, mas por vaidade e presunção. Essa oferta aponta para um ketôret impuro, sem os ingredientes da santidade e humildade, inflado pelo orgulho e contaminado pela rebeldia. O resultado não poderia ser outro, exceto o desastre. Todo o serviço no Tabernáculo era regido por normas claras e rigorosas, de onde se destaca a ordem e a disciplina. O incenso estranho jamais será recebido por Deus; pelo contrário, será punido. Deus resiste ao coração soberbo e aos olhos altivos, e a oração movida por eles é reprovável.

O aroma agradável

 O autêntico ketôret aponta para a oração sincera que brota de um coração humilde e produz um perfeito aroma, agradável ao Senhor. Vemos esse ketôret à mostra durante a mesma revolta de Coré. Sua rebeldia contaminou o povo e gerou tal indignação em Deus a ponto de se originar uma praga mortal que rapidamente se espalhou.

Moisés ordenou que Arão pegasse o incensário, pusesse fogo e colocasse incenso a fim de fazer expiação pela congregação. Assim ele fez, como mediador, colocando-se entre “os mortos e os vivos, e a praga cessou” (Nm. 16:48). O verdadeiro incenso tem o poder de interromper o juízo divino e de preservar a vida em meio à morte.

Deus anela por aqueles sacerdotes que se achegarão a Ele com a mesma presteza e ousadia de Moisés e Arão, seguindo seus santos padrões, para lhe oferecer o ketôret agradável, servindo de mediador entre os homens, como fez o Filho de Deus, capaz de salvar os que estão a caminho da morte.  

Resposta de fogo

O livro de Apocalipse deixa claro que o incenso que chega ao céu são as orações dos santos. Elas são postas no altar de ouro celestial, à semelhança do Tabernáculo de Moisés, e oferecidas diante do trono de Deus. Sobem como fumaça perante o Senhor e, após isso, um anjo as toma no incensário, enche-o de fogo do altar e o lança sobre a Terra (Ap. 8:3-5).

Esse é literalmente o fogo que desce do céu em resposta às orações. A oração sobe como incenso da Terra e volta na forma de fogo para cumprir os santos propósitos de Deus, em resposta a seus filhos. Essa era a habilidade e autoridade que tinha Elias em reivindicar fogo do céu em seu ministério. Não era mera força de expressão, mas o exercício legítimo daquilo que mais Elias sabia fazer: orar e oferecer ao Senhor o mais agradável ketôret. A manifestação do fogo do céu em sua vida era nada mais que a resposta de Deus a seu constante clamor e vida de oração.

Na Brit Hadashah (Novo Testamento), todos os remidos em Yeshua são sacerdotes. Todos têm o direito e o dever de oferecer o mesmo incenso a Ele. Se for agradável e sincero, proveniente de um coração quebrantado e obediente, alcançará o altar de ouro no céu e certamente será respondido, ainda que nem sempre da forma que imaginamos. 

 

Getúlio Cidade é escritor, tradutor e hebraísta, autor de A Oliveira Natural: As Raízes Judaicas do Cristianismo e do blog www.aoliveiranatural.com.br.

* O conteúdo do texto acima é uma colaboração voluntária, de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal Guiame.

Leia o artigo anterior: A Festa de Tabernáculos e o retorno dos reféns

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