Há alguns dias, ocorreu a Festa de Purim, uma celebração de muita alegria pelo desfecho que teve para o povo de Israel há quase 2.500 anos, no reino da Pérsia. Entretanto, trata-se de uma história de extrema angústia do início ao fim, contada em uma combinação de roteiro de ação, policial e de drama. Assim é o livro de Ester, além de ser cercado de mistérios. O maior de todos é sem dúvida a ausência do nome de Deus. Ele não é mencionado sequer em um único versículo.
Ao contrário dos demais livros da Bíblia hebraica que contém inúmeras vezes o nome do Deus de Israel, sua ausência no pergaminho de Ester, no entanto, nunca levou os sábios do judaísmo a contestarem sua autenticidade nem sua inserção no cânon sagrado. O motivo é simples. Embora não contenha o nome de Deus nem nenhuma referência a Ele, sua atuação por toda a narrativa é inegável e inconteste. Não se vê seu nome, mas todos sabem que Ele está ali, como um artista em um teatro de marionetes, escondido por trás da cortina preta, controlando seus personagens, suas ações e até suas falas em cada ato de uma peça teatral fascinante.
Aliás, esse é um dos motivos de se usar máscaras nas celebrações de Purim. É uma menção a Deus escondendo a face de seu povo, sem, porém, tirar seus olhos de sobre ele. Pois essa foi a sensação que todo o povo judeu espalhado pelo império teve, desde a ascensão de Hamã à posição de primeiro príncipe. Havia uma data marcada para o extermínio de toda a semente de Abraão. O decreto estava assinado e nada faria o rei voltar atrás. Parecia mesmo que Deus se esquecera da promessa feita aos patriarcas e escondera sua face de Israel, deixando-o entregue ao ódio de seus inimigos.
Isso também nos soa familiar? Quantas vezes, em meio a crises, fazemos a mesma pergunta? Podemos não ter dito em voz alta, mas questionamos em nosso íntimo se Deus realmente estava presente quando algo muito ruim nos ocorreu, ou se se escondeu de nós como parece ter feito com Israel.
O céu não é lugar para covardes
Esse livro histórico e profético contém lições preciosas de conhecimento e aplicação na vida prática dos filhos de Deus. Uma delas está no posicionamento de Ester em não se acovardar ao ver o mal florescer e ameaçar seu povo. Quando ela cai em si com a exortação de Mordecai, vai até o rei interceder por seu povo, embora saiba que isso pode lhe custar a vida. Para isso, pede que o povo judeu jejue por ela. Ester, como sombra da Noiva do Messias, nos ensina a ter ousadia para se achegar ao rei e obter seu favor.
Como membros do corpo de Messias, temos esse acesso ao Rei dos reis o dia e a hora que desejarmos. Não precisamos temer a morte, mas buscar com ousadia o caminho da vida eterna. Não devemos nos calar perante o mal nem a injustiça. Precisamos assumir publicamente o lado certo e, principalmente, comparecer perante o rei para interceder por justiça. Precisamos conhecer o verdadeiro valor da oração e do jejum, inspirados na atitude de Ester. O Rei da Glória nos aguarda de braços abertos que compareçamos diante dele para apresentar nossas causas e nos conceder seu favor. A coragem e a ousadia são inerentes aos filhos da luz. O céu não é lugar para covardes.
Adonai é poderoso para livrar
A história de Purim também nos ensina que, não importa quão terrível seja a provação, o Senhor sempre dará um livramento no final, ainda que pareça que Ele tenha nos abandonado à própria sorte. Foi assim com Israel quando se viu ameaçado pelo decreto genocida de Hamã.
A história dos amigos de Daniel na fornalha de fogo nos ensina o mesmo. Sua fé e sua fidelidade a Deus eram tão grandes que, não somente se recusaram a se prostrar diante da imagem de Nabucodonosor, mas estavam prontos a morrer pelo que criam, independente de um livramento divino. Quando indagados pelo rei, disseram: “Se formos lançados na fornalha de fogo ardente, o nosso Deus, a quem nós servimos, pode livrar-nos dela, e ele nos livrará da tua mão, ó rei. Se não, fica sabendo, ó rei, que não serviremos a teus deuses, nem adoraremos a estátua de ouro que levantaste” (Daniel 3: 17-18). Que declaração de fé maravilhosa!
Precisamos ser corajosos e compromissados como eram esses homens que, literalmente no fogo da provação, não negaram sua fé. Deus foi fiel para livrar aqueles jovens íntegros no final, assim como foi para livrar Israel das mãos de Hamã. Toda prova, por mais dura que seja, tem um propósito divino em nossas vidas e todas as coisas, boas ou más, cooperam para aqueles que amam a Deus (Romanos 8:28). O livramento sempre chega no final. Mordecai parece que era o único que sabia disso ao dizer a Ester que, se ela se omitisse, o livramento viria de outra forma, pois Deus não permitiria o extermínio de seu povo.
Os judeus do império persa achavam que chegara o fim, que dessa vez não haveria escape, que Deus realmente se escondera e não podia ser achado. Porém, ainda que seu rosto esteja escondido, seu braço forte aparece para livrar. Não depende de pessoas influentes, não depende de conhecimento ou poder, não depende de bens ou dinheiro, mas somente Adonai é poderoso para livrar.
Quando estiver atravessando uma provação e tiver a sensação de que Deus escondeu sua face, lembre-se da história de Ester. Estando ou não com o rosto escondido, o Senhor livra os que nele põem sua confiança. E isso é suficiente para fortalecer nossa fé e renovar nossa esperança.
Getúlio Cidade é escritor, tradutor e hebraísta, autor do livro A Oliveira Natural: As Raízes Judaicas do Cristianismo e do blog www.aoliveiranatural.com.br
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