A milenar cidade síria de Maalula está situada cerca de 60 km a noroeste da capital do país, Damasco. Suas encostas rochosas abrigam diversas igrejas cristãs. A cidade abriga os dois mosteiros ativos mais antigos da Síria.
Maalula é um dos poucos lugares do mundo onde os moradores ainda falam o aramaico. Essa língua foi usada para redigir grande parte da literatura rabínica judaica. Pode ser vista também em pergaminhos dos livros de Esdras (4:8-6.18 e 7:12-26) e Daniel (2.4-7.28). Além disso, os estudiosos acreditam que Jesus falava aramaico em seu dia a dia.
A queda do ex-presidente Bashar al-Assad, no final do ano passado, ocorreu após uma série de ações de grupos armados, que estabeleceram Ahmed al-Sharaa como novo mandatário. Este mês, centenas de pessoas foram mortas em ataques desses grupos a cristãos.
Conforme o jornal Times of Israel, os moradores de Maalula temem ser atacados por serem cristãos, uma minoria religiosa na Síria.
O padre Jalal Ghazal disse que acordou uma manhã em janeiro com um barulho alto e correu para fora. Vândalos atacaram sua casa. Esse não é um cenário novo para ele, já que os cristãos sempre foram alvos durante a guerra civil que durou mais de uma década no país.
Em fevereiro, os moradores de Maalula enviaram uma carta ao novo governo islâmico da Síria, lembrando que Ahmad al-Sharaa prometera proteger minorias religiosas e étnicas.
"Queremos o retorno seguro garantido dos cristãos de Maalula", dizia o texto. "Nossa cidade é uma linha vermelha. Não deixaremos ninguém invadir nossa cultura, herança e locais sagrados." Porém, nada mudou desde então.
Histórico de perseguições
Em setembro de 2013, forças rebeldes, incluindo extremistas ligados à Al-Qaeda, tomaram a cidade. Cerca de dois terços dos estimados 3.300 moradores de Maalula fugiram enquanto combatentes sequestravam 12 freiras. Elas foram libertadas mediante pagamento de resgate, e as forças de Assad retomaram a cidade, expulsando moradores muçulmanos que foram acusados de apoiar grupos armados de oposição.
Mas desde a queda de Assad, os cristãos de Maalula viram algumas dessas pessoas retornarem e buscarem vingança, incluindo saques e vandalismo. Até agora ninguém foi preso.
Os cristãos dizem que viveram em paz com os muçulmanos locais durante muito tempo. Porém, a perseguição voltou, colocando em risco a vida de cristãos em todo país.
"Não há garantias", disse o padre Ghazal. "Buscamos reduzir a ocorrência desses incidentes."
Nenhum policial foi visto na cidade recentemente. Todas as armas e munições na delegacia de polícia de Maalula foram saqueadas no caos que tomou conta da Síria após a queda de Assad.
Sinais de guerra podem ser vistos por todo lado. Há buracos de bala em símbolos e artefatos religiosos. Diversas pinturas e mosaicos de Jesus e outras figuras cristãs foram danificados e queimados.
Agora, moradores e os líderes cristãos esperam que os novos líderes da Síria os protejam e seus esforços para preservar a tradição cristã, que inclui a língua aramaica. Muitas pessoas que fugiram da cidade não retornaram.
Preservando o idioma antigo
Morador da cidade, George Zaarour coleciona livros e enciclopédias em aramaico em sua pequena loja, onde vende material religioso cristão. Ele conta que passa os dias estudando e traduzindo textos dessa antiga língua semítica, cujas origens remontam ao século X a.C.
Ele estima que 80% dos moradores de Maaloula não falam mais a língua, enquanto os 20% restantes têm mais de 60 anos.
O padre Fadi Bargeel continua fazendo a missa, mesmo com a igreja amplamente danificada.
Ele disse que está tentando olhar para o futuro. O religioso quer encorajar mais pessoas, especialmente crianças, a aprender aramaico ou se tornar mais fluentes.
“No momento em que uma criança nasce, ouve a língua aramaica falada em casa”, disse ele. “Quando começamos a ir à escola quando crianças, não sabíamos árabe.” Atualmente, o aramaico é ensinado apenas em casa, sendo que apenas os mais velhos são fluentes.
Sammera Thabet disse que confia em Deus que seu destino será melhor. Ao contrário de alguns moradores, ela tem fé que a nova Síria será uma nação inclusiva para ela e outros cristãos.
"O Deus que nos colocou nesta terra nos protegerá", afirmou.
Veja como é o Pai Nosso em aramaico:
Jarbas Aragão é pastor, jornalista e tradutor. Mestre em teologia, foi missionário da Jocum e da Junta de Missões Mundiais da CBB, além de professor do seminário Batista. Colabora com diferentes mídias no Brasil, nos Estados Unidos e em Israel.
* O conteúdo do texto acima é de colaboração voluntária, seu teor é de total responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do Portal Guiame.
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