Algumas afirmações do Apóstolo Paulo foram malinterpretadas pela Tradição Cristã, que influenciou a cultura ocidental. Um dos exemplos é a questão de gênero. A Tradição Cristã desenvolveu tendências machistas, baseadas em textos de Paulo.
Mas quando leio uma de suas afirmações, de que "o corpo do homem pertence à mulher e o da mulher ao homem" justamente num contexto em que ele trata da importância de desfrutarem frequentemente de sua vida sexual, discirno em Paulo, um pensamento e um posicionamento ao mesmo tempo libertário e profundo.
Não há, na essência do Evangelho, polarização de gênero, mas a afirmação de que homens e mulheres têm o mesmo valor diante de Deus e da vida. E de que o ideal da unidade conjugal é a entrega mútua entre um homem e uma mulher.
Essa conjugabilidade pode ser fonte de cura para traumas em homens e mulheres, em seus corpos e almas.
É questão existencial fundamental para a essência espiritual judaico-cristã, a União restauradora entre uma mulher, que surgiu de parte do corpo do homem e o homem, que nasceu de mulher.
Um ao outro, um do outro, doados e acolhidos, sem donos de si, mas servos do outro.
Nossos medos geram senso de autopreservação, que é a fonte de todas as competições, inimizades, fobias e agressões de gênero.
Quando confiamos que o outro haverá de receber nossa entrega e dedicação e haverá de cuidar de nós, podemos nos entregar.
Um ser do outro e para o outro.
Torna-se, a conjugabilidade, um ato de fé. Dois se entregam e se doam, na esperança de serem acolhidos, protegidos, retribuidos.
Encerra-se uma busca existencial elementar, porque erroneamente buscamos conquistar o mundo, dos bens, passando por posições, chegando a pessoas; quando na verdade nossa alma quer pertencer, a Deus e a quem amamos.
Um pertence ao outro. Diz o Paulo.
Tornam-se um do outro sem medo de ser abusado, rejeitado, traído, abandonado.
Utopia? Ideal, eu diria. Anseio da alma, mesmo quando ela insiste em criar fantasias emocionais, sociais e sexuais.
Sobretudo, insisto, um ato de fé, que deve começar em um, na esperança de que os dois sejam invadidos pela conjugabilidade existencial.
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