Existe sexo após os filhos, sim!

Não dá mais para transar na sala, derrubando abajures e almofadas. Aquela rapidinha no corredor também já era. E a mistura escandalosa de apetites na cozinha ficou comprometida. Os filhos estão à solta e a sala, o corredor, a cozinha agora só acolhem carícias e beijos comportados. Deus, no entanto, é justo: resta o quarto, a porta do quarto e a chave da porta do quarto. Há mulheres, porém, que relutam em usar essa chave.

A coisa começa na gravidez. Se barriga fosse problema, homens barrigudos seriam castos. Além do mais, todo mundo sabe que sexo não faz mal nem para o bebê, nem para a mãe, muito pelo contrário (salvo algumas exceções de ordem médica).

Quando o bebê nasce, aí, sim, precisamos de um tempo para botar os órgãos, os hormônios e a libido no lugar. Nada mais natural. Cedo ou tarde (cada uma no seu ritmo) voltamos ao cabeleireiro, às liquidações e ao sexo.

Daí para frente é uma questão de ajustes. Crianças dormem, crianças assistem ao "Wall.E" quinze vezes seguidas, crianças põem cobertores sobre a mesa de jantar e ficam horas ali embaixo, acampadas, crianças jogam bola, lêem livros, navegam na internet, crianças têm avós, tios, primos e amiguinhos em cujas casas podem dormir de vez em quando. Tem mãe que precisa se desmamar do filho e não o contrário.

Dia desses, uma amiga desabafou:

- Homem é tudo igual, só pensa em sexo. Meu marido não entende que, depois que o Lucas nasceu, meu tempo ficou curto. Eu não posso simplesmente ir pro quarto e largar meu filho sozinho.

- Claro que pode.

- Ah, Stella! Até você?

Sim, até eu quero que o Lucas não vire um moleque mimado e dependente, até eu quero que minha amiga pare de ver no marido um adversário, até eu quero que ela seja feliz. Mas será mesmo que o pequeno Lucas é o responsável por tanta falta de tempo e incompreensão? Será que as coisas não andavam ruins antes de o menino nascer e agora minha amiga encontrou a desculpa perfeita? A desculpa perfeitamente infeliz?

É esquisito uma relação que sempre foi boa ficar péssima apenas por causa do nascimento de um filho. Cruel, imaturo e injusto jogar em ombros frágeis uma culpa dessas - crianças sentem as vibrações que as rodeiam. Um filho não é entrave para nada e é plenamente possível administrar a vida em novas bases após seu nascimento. Quem diz que a vida sexual (ou profissional, social) acabou depois que teve filhos, talvez há muito não tivesse um bom sexo e agora use as crianças como desculpa para não encarar os próprios problemas. Nada de se proteger atrás de mamadeiras, dentes de leite, cadernos escolares ou espinhas. Olhe no espelho, arranque a máscara e veja o que está te incomodando. Fuce, revolva, investigue. No fundo desse espelho tem uma chave brilhando - e uma porta com todo direito de ser trancada.