Há alguma opção para o Aborto?

Há alguma opção para o Aborto?

Fonte: Atualizado: sábado, 29 de março de 2014 às 03:29

Tudo começou numa tarde bem fria do mês de outubro, às margens do lago Michigan. Com o vento soprando frio em seu rosto, Terry contou ao namorado que estava grávida:

''Eu ainda não tinha tido coragem para dizer pra ele. Certa tarde então, começamos a caminhar ao redor do lago e depois de respirar fundo, contei. Parecia uma cena de filme, com céu cinzento e tudo. No começo ele ficou extremamente aborrecido. Juntou várias pedras e começou a atirá-las no lago.

Nunca havíamos conversado sobre o que faríamos, caso isso viesse a acontecer. Eu fiquei grávida logo na segunda ou terceira vez que fizemos amor''.

Eles estavam namorando há cinco meses. Não tinham tido nenhum relacionamento sexual nos primeiros quatro meses de namoro.

''Tínhamos o propósito de nos conhecer e de estabelecer uma base de confiança entre nós''.

Ela crescera em um bairro residencial em Chicago e freqüentara uma escola onde as meninas conversavam coisas normais da idade.

Durante minha época de colegial não tive nenhum tipo de relacionamento sexual. Sou cristã e meus pais sempre me ensinaram que sexo era uma expressão do amor conjugal e que deveria ser expresso dentro do casamento. Eu concordava com eles. O bom era que meus amigos de escola, na época, também pensavam assim''.

Ela se formou no colegial e entrou na faculdade. Não era mais uma menininha. Já era uma jovem e seus conceitos foram mudando. Nessa época ela conheceu um rapaz. Eles se apaixonaram e começaram a namorar. Cinco meses depois, ali estava ela, contando a ele que estava grávida.

''Depois de alguns minutos após eu dar a notícia, ele caminhou em minha direção e me abraçou. Passamos o resto daquela tarde abraçados e chorando um no ombro do outro''.

É claro que ela havia pensado em casamento. Ele não lhe propusera, mas ela tinha certeza que ele concordaria caso insistisse.

''No entanto, quando pensei sério sobre tudo, achei que casamento estava fora de questão. Nós simplesmente não estávamos prontos. Não saberíamos fazer dar certo.

- Qual era a outra opção, então?

- Aborto.

''Ele também era cristão e como eu, contra o aborto. Em nossa cidade, porém, o aborto havia sido legalizado. E uma convicção pode mudar quando é você o pivô da história. Prova disso foi que, algum tempo depois, lá estava eu em uma clínica de aborto''.

O namorado estava lá com ela. Ele permaneceu na sala de espera, no andar de cima, enquanto Terry era atendida embaixo. Antes de ser chamada ela havia dito pra ele não se preocupar. Mas isso era impossível?

E a narrativa de Terry continuou:

''Eu estava na mesa de cirurgia. O médico já havia me examinado e instruíra a enfermeira que me aplicasse um antiséptico. Naquele momento eu me sentei e disse:

- Não dá! Eu não vou continuar com isso!

Eu me levantei, vesti minhas roupas e sai daquele lugar passando pela sala de recuperação. Enquanto eu caminhava sentia sobre mim o peso da tristeza do olhar de cada mulher que se encontrava naquela sala. Elas não eram frias assassinas, como muitos diziam. Eram mulheres sofridas, que estavam fazendo algo que, no fundo, não queriam fazer. Subi então as escadas e fui ao encontro do meu namorado. Ele estava pálido e com o semblante descaído. Tive ali, uma imagem do futuro, de como ele seria se fosse velho? Olhando bem em seus olhos disse que não conseguira... Ele suspirou aliviado.

- Naquele momento você pensou novamente em casamento? Respondendo a minha pergunta, ela disse:

- Sim. E eu sabia que se pedisse pra ele se casar comigo teríamos ido dali direto ao juiz de paz. Eu gostava de muita coisa nele. Porém eu também tinha dúvidas. Eu sabia que ele não era suficientemente maduro para assumir uma família. Se tivéssemos ambos uns dois anos mais do que tínhamos, talvez tivesse dado certo, mas não daquele jeito, não naquele momento!

E foi assim que Terry decidiu ter o bebê, mas doá-lo para adoção. Com isso em mente começou a dar os passos necessários. Entrou em contato com uma conceituada agência de adoção chamada ''Cradle'' (Berço), que havia sido fundada em 1923. Eram muitos anos de experiência e bom trabalho.

Tudo isso, porém, foi feito sem que ela tivesse contado a seus pais. Seria inevitável, mas ela não conseguia fazê-lo. Contou, então, para sua melhor amiga, cujos pais a convidaram a morar com eles até que o bebê nascesse.

''Só contei a verdade a meus pais quando não deu mais para esconder. Eles ficaram muito decepcionados e machucados, mas me apoiaram. Eles haviam me criado com um sistema de valores, os quais - obviamente - eu não havia seguido. Apesar disso, disseram que eu poderia levar o bebê para casa e que, se eu optasse por casar com meu namorado, poderia levá-lo para casa também. Apesar de morarmos num bairro refinado, meus pais não são ricos e sei que tudo isso seria um grande sacrifício para eles''.

Terry ouviu as propostas, ponderou as possibilidades e comunicou a seus pais que escolhera morar com a família da amiga até que o bebê nascesse para então, entregá-lo para adoção.

- Seus pais não ficaram tristes por você ter escolhido ficar morando na casa de estranhos e não com eles? Eu perguntei.

- Sim, de certa forma. Por outro lado, eles até ficaram aliviados pois não seria preciso contar nada nem para os vizinhos e nem para seus amigos. Eu posso compreender isso.

Terry, então, terminou aquele semestre da escola e saiu para ter o bebê.

''A família da minha minha amiga era fantástica. O pai dela era aposentado e me ensinou a fazer biscoitos e pãezinhos irlandeses. Todos eram muito amorosos. Eu me sentia parte da família e não uma intrusa.

O bebê nasceu em maio. Na agência de adoção tive a oportunidade de olhar fichas de várias famílias em potencial para adotarem meu bebê. Não me diziam seus nomes, mas eu ficava sabendo um monte de coisas sobre elas. Eu queria uma família que fosse cristã praticante. Aquilo era muito importante para mim. E acabei achando uma, cuja mãe dava aula na Escola Dominical. Achei aquilo ótimo. Outra coisa, é que o irmão da mãe (o futuro tio da minha filha) tinha cinco filhos, e eles passavam juntos os finais de semana. Sobrinhos e tios se amavam muito. Dessa forma, minha filha teria um ambiente alegre e de bastante suporte a seu redor''.

O bebê de Terry nasceu no final de maio. Perguntei, então, com quem sua filhinha se parecia. Depois de um momento de silêncio, ela respondeu:

- Não sei. Eu não quis vê-la. Eu sabia que, se a visse, não teria coragem de entregá-la. Você pode não entender, mas estávamos muito próximas. Brincávamos muito. Ela me chutava e eu a acariciava em minha barriga. Sei que ela sentiu meu amor.

Às vezes, a realidade me sacode e me lembro que tenho uma filha, em algum lugar. Há momentos em que o desejo de vê-la é muito intenso. Quero abraçá-la, vê-la crescer, contemplar seu sorriso, enfim, saber tudo sobre ela. Não lhe contei ainda, mas dois dias antes dela nascer eu tinha resolvido que ficaria com ela. E eu teria ficado, se não tivesse percebido que minhas razões eram totalmente egoístas. Eu não teria como criá-la. A adoção por uma família que estava pronta para recebê-la seria, sem dúvida, o melhor para ela. Eu queria que minha filha tivesse um pai e uma mãe de verdade, pessoas mais seguras que pudessem transmitir estabilidade emocional para ela, coisa que meu namorado e eu certamente não possuíamos. Prova disso é que brigamos tanto depois, que acabamos desmanchando nosso namoro.

As coisas vão mudando, né? No começo eu achei que minha filha nunca viria a saber de mim. Agora, acho que dependendo de seus pais, eles poderão contar pra ela da minha existência. O pessoal da agência de adoção tem a ficha completa da nova família dela. Eu pretendo escrever uma carta pra ela a cada aniversário e entregar na agência. Quem sabe, dependendo do que acontecer no futuro, ela chegue a lê-las.

Fiz questão de lhe falar tudo isso, pela oportunidade de dizer a outras mulheres que estou ciente de ter feito uma grande contribuição. Deixei alguma família muito feliz dando a eles a mais linda criança do mundo!

Não me lembro bem do quê eu disse a Terry quando nos despedimos. Gostaria, porém, de ter dito que, se a filha puxar a mãe, tudo ficará muito bem.

Escrito por Roger Simon - Colunista do jornal Chicago Sun-Times, que editou a versão completa deste artigo. A reimpressão contou com a devida permissão. Tradução de Iara Vasconcellos.

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