Sexualidade integral

Sexualidade integral

Fonte: Atualizado: sábado, 29 de março de 2014 às 03:28

No title A sexualidade foi grandemente afetada pela queda. A intimidade entre o homem e a mulher foi substituída por acusações e desconfiança. O desejo que despertava uma atração mútua foi transformado em arma de manipulação e dominação. A mulher foi confinada ao espaço privado enquanto o homem construía sozinho um mundo técnico e desafeiçoado. A dicotomia mutilou ambos. O homem foi privado da emoção e a mulher do domínio sobre seu próprio corpo.

Esse desencontro é patente até hoje pela percepção de que os homens fazem sexo enquanto as mulheres fazem amor. Os homens buscam uma satisfação puramente física, enquanto as mulheres buscam afeto. O grande medo do homem é ser engolido pela mulher e o da mulher é ser usada pelo homem. Quanto mais a mulher se aproxima para ter intimidade, mais ele foge por medo de ser controlado e castrado. Quanto mais ele a procura para uma troca lúdica de prazer, mais ela se sente transformada em objeto descartável.

Mas nascer de novo significa restaurar o projeto original de Deus para cada um de nós e para nossos relacionamentos. Deus criou o ser humano, macho e fêmea, isto é, dotado de características sexuais e de sentidos que garantem uma troca prazerosa entre eles. Freud ajudou a derrubar um tabu ao mostrar que a criança é um ser dotado de sexualidade. Assim, a compreensão da sexualidade passou a ser bem mais abrangente que a genitalidade. Ela diz respeito à capacidade de sentir prazer através do corpo. A criança descobre logo esse presente e tenta entrar em competição com o genitor de mesmo sexo para ocupar o seu lugar, mas essa fantasia não pode tornar-se realidade.

Cabe aos adultos garantir à criança um espaço protegido para superar essa fase edipiana e preparar-se para a fase adulta, quando irá se unir a um parceiro e viver uma sexualidade plena. Karin Wondracek lança mão da bonita metáfora de um rio para expressar o processo de amadurecimento sexual. "Quando as margens são muito rígidas, o rio não tem espaço para se expandir e acaba transbordando, destruindo tudo o que encontra pela frente. Margens flexíveis permitem que o rio cresça e forme um estuário que se abre para o homem-mar".

Durante séculos, a mulher foi privada do prazer sexual através de uma cliteridectomia física ou emocional de forma a garantir a primazia do gozo masculino. Hoje, nossa sociedade estimula as mulheres a reivindicar seu direito à igualdade. Mas o gozo não pode ser fruto de cobrança ou exigência. É mais um mistério e um presente livremente compartilhado. Se os meios de comunicação focalizam técnicas para garantir um bom desempenho sexual, a Bíblia nos desperta através de poesia e metáforas. O livro de Cantares revela que o amor envolve o ser humano em todas as suas dimensões. O prazer é suscitado por um olhar e uma troca verbal que valoriza o outro: seu corpo, sua beleza, sua liberdade de se aproximar ou distanciar.

Nossos sentidos foram embotados pelo pecado. A capacidade de olhar, deturpada pela concupiscência dos olhos, nos leva a querer possuir e usar o que desejamos. Através do amor incondicional de Deus, que supre nossa carência infinita, podemos voltar a olhar para abençoar e honrar. Assim, descobrimos a dimensão espiritual dos nossos sentidos. Olhar, tocar, sentir, saborear e ouvir são pontes que nos levam ao encontro do outro. Elas apontam para os sentidos da nossa alma. Além do corpo do outro, enxergamos também a sua essência invisível aos olhos. Tornamo-nos vulneráveis a ponto de sermos tocados e fertilizados por sua existência.

A sexualidade enquanto troca que mobiliza os cinco sentidos está presente em todos os nossos relacionamentos. A sexualidade genital que envolve tornar-se um com o outro, não apenas a nível físico, mas também emocional e espiritual, é privilégio de uma relação exclusiva, permanente e assumida socialmente. É o compromisso diferenciado que nos permite construir uma intimidade que irá se desenvolver ao longo da vida. Com o tempo, aprendemos a confiar um no outro, superamos traumas e arriscamos descobrir juntos o presente que recebemos de Deus para o nosso deleite.

Escrito por: Isabelle Ludovico

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