Ao apontar para o aumento do antissemitismo, o líder da comunidade judaica, Pinchas Goldschmidt — que é conhecido internacionalmente — alertou sobre o perigo dos judeus virarem “bodes expiatórios” na situação da guerra na Ucrânia.
Com essa visão, o rabino exilado de Moscou disse que os judeus devem deixar a Rússia enquanto ainda podem: “Quando olhamos para a história da Rússia, sempre que o sistema político estava em perigo, vimos o governo tentando redirecionar a raiva e o descontentamento das massas para a comunidade judaica”, explicou.
Segundo Goldschmidt, em entrevista ao The Guardian, esse tipo de situação já aconteceu no tempo do czarismo — sistema político da Rússia entre 1547 até 1917. Czar era o título do imperador russo que governava de forma absoluta.
Ele também disse que os judeus foram considerados “culpados” pela desestabilidade do governo durante o regime stalinista.
‘Exilado por não apoiar a invasão russa à Ucrânia’
Para o rabino, a Rússia está voltando para um novo tipo de União Soviética, como se a “cortina de ferro” estivesse se desenrolando novamente: “É por isso que acredito que a melhor opção para os judeus russos é partir”.
Goldschmidt renunciou ao cargo e deixou a Rússia em julho depois de se recusar a apoiar a invasão russa à Ucrânia.
“Pressionaram os líderes comunitários para que apoiassem a guerra e eu recusei-me a fazê-lo. Pedi demissão porque continuar como rabino-chefe de Moscou seria um problema para a comunidade por causa das medidas repressivas tomadas contra os dissidentes”, esclareceu.
Nos últimos 100 anos, dezenas de milhares de judeus voltaram para Israel. De acordo com o censo de 1926, havia 2.672.000 judeus na então União Soviética, 59% deles na Ucrânia.
Atualmente, um número aproximado de 165.000 judeus permanecem na Federação Russa de uma população total de 145 milhões. O rabino disse acreditar que desde o início da guerra, cerca de 30% dos judeus que ainda viviam na Rússia, partiram ou planejavam partir.
Histórico de antissemitismo da Ucrânia
Vale lembrar que, em julho, o governo da Rússia fechou a filial russa da Agência Judaica — a organização que promove a imigração para Israel. O rabino disse que grande parte da comunidade judaica na Ucrânia também partiu e agora são refugiados na Alemanha, Áustria e Romênia.
A Ucrânia tem uma longa história de antissemitismo e, no final século 19 até facilitou massacres nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. O mais notório deles foi o assassinato de 33.000 judeus em Babi Yar, Kyiv, em 1941.
Dada esta história, Goldschmidt disse que foi notável que Volodymyr Zelensky, que não fazia segredo de seu judaísmo, tenha sido eleito presidente da Ucrânia com mais de 70% dos votos.
Esse fato tornou absurda a afirmação de Vladimir Putin de que a Ucrânia estava sendo governada por neonazistas, disse o rabino: “Mostre-me outro país que está nas garras dos nazistas, onde a comunidade judaica está prosperando”.
“Não sei o quão judeu Zelensky se sente. Ele joga a cartada judaica para pedir ajuda a Israel”, observou.
Antissemitismo nos EUA
Goldschmidt também observou que enquanto os judeus da Rússia enfrentavam um futuro incerto, o antissemitismo estava aumentando no que há muito era visto como um santuário judaico, os Estados Unidos.
Em 2018, um atirador matou 11 fiéis em uma sinagoga de Pittsburgh. No ano passado, a Liga Anti-Difamação registrou um recorde de 2.717 incidentes antissemitas nos EUA, variando de agressão e assédio a vandalismo.
“Por muitos anos, os judeus nos EUA acreditaram que era uma exceção, que o que quer que acontecesse na Europa e em outros países nunca poderia acontecer lá. Mas nos últimos três anos houve mais ataques a judeus lá do que na Europa”, apontou o rabino.
“O que está mudando é que o sistema político está muito mais polarizado, mas também o discurso foi derrubado pelas mídias sociais. A polarização que estamos vendo tornou o antissemitismo muito mais aceitável”, concluiu.
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