De missionário evangélico a ateu confesso

De missionário evangélico a ateu confesso

Fonte: Atualizado: terça-feira, 1 de abril de 2014 às 3:49

Segundo o depoimento de algumas pessoas, o norte-americano Daniel Leonard Everett, ex-missionário evangélico no Brasil, ficou em pé em uma reunião da Associação Americana de Antropologia (AAA) e anunciou solenemente que negava sua fé no cristianismo e que Jesus Cristo era um "conto de dente", ou um conto da carochinha (será que alguma academia de ciências ao redor do mundo já abriu espaço semelhante para um associado seu declarar formalmente sua fé em Jesus?).

Por causa da enorme capacidade acadêmica de Everett, alguns segmentos sociais vibraram com essa "desconversão", uma vez que eles haviam adquirido um aliado de peso contra as iniciativas missionárias, pelo menos no nível do discurso. Aumentou-se, dessa forma, o "glamour" já existente em torno desse linguista. Imediatamente ele foi incluído em um site de ateus, com uma foto e uma pequena biografia.

Além da rejeição ao cristianismo, Everett também negou, em outras oportunidades, o paradigma linguístico-científico que até então sustentava. Assim, Renato Cavallera afirma que "O americano Daniel Everett, 55, negou Deus por duas vezes. Primeiro o Deus literal, cristão [...]. Depois, o deus dos intelectuais, Noam Chomsky, cuja Gramática Universal, a mais ilustre de todas as teorias linguísticas, passou a ser questionada por Everett". De fato, sobre sua experiência com a teoria chomskyana, esse linguista comenta: "Para mim, foi uma outra experiência de conversão". Portanto, procede falar-se de "desconversão" aqui também.

O que ocorreu com Everett não é um fato novo e não deve surpreender ninguém. Por diversas razões, alguns ex-alunos de Chomsky passaram a advogar outras abordagens teóricas. Por razões diversas, algumas pessoas deixaram de acreditar na existência de Deus. O filme/livro "Brincando nos Campos do Senhor" atesta bem isso.

Pessoalmente, não tenho pesar pela rejeição de Everett à teoria chomskyana. É uma excelente teoria, mas as pesquisas prosseguem e pode haver distanciamento dela. Contudo, como seu amigo, lamento sua negação a Deus, bem como o conteúdo de seus depoimentos pós-cristãos. Na entrevista a Renato Cavallera, Everett expressou: "Acho que pregação, traduções, 'testemunhos' etc. são superstições e não vejo como superstições podem ajudar os índios. É a mesma coisa de dizer que os índios não podem viver bem sem crer em Papai Noel". Sua argumentação é válida e por isso mesmo questionável. Em sua trajetória missionária, ele conheceu pessoalmente inúmeros indígenas que mudaram de vida (para melhor) por meio da prédica evangélica. Fora do âmbito silvícola, ele mesmo é o exemplo mais contundente de que o evangelho transforma positivamente a vida dos convertidos. Na seção de agradecimentos de sua tese de doutorado, ele registra: "Ao meu senhor Jesus que me tocou há quatorze anos quando eu era viciado em 'LSD', 'speed', maconha e outros 'divertimentos'; que deu à minha vida um propósito, uma direção... Meu Senhor e meu irmão -- obrigado". Não fosse isso, dificilmente ele seria o que é agora: um gênio das ciências humanas, mormente da linguística. Talvez estivesse entregue às drogas em um grande centro urbano; ou internado em uma pequena clínica psiquiátrica; ou até mesmo inválido, em uma cadeira de rodas; quem sabe estivesse confinado em uma cadeia de segurança máxima; ou morto, como um ilustre desconhecido, em uma tumba sem epitáfio. Papai Noel não transforma vidas -- Jesus Cristo sim (2Co 5.17). A antiga caminhada cristã de Everett é apenas mais uma prova cabal de que o evangelho é o poder de Deus para os que creem (Rm 1.16), embora, no momento, ele tente expressar o contrário.

A transformação dos convertidos é tão evidente que certos incrédulos não se contêm e dão testemunho desse fato. Por exemplo, o jornalista Matthew Parris escreve: "Agora eu, um ateu convicto, estou convencido da enorme contribuição que o evangelismo cristão faz na África: ele é claramente distinto do trabalho das ONGs seculares, projetos governamentais e esforços de ajuda internacional. Essas iniciativas sozinhas não farão diferença. A educação e o treinamento sozinhos também não. Na África, o cristianismo muda o coração das pessoas. Isso traz uma transformação espiritual. O nascer de novo é real. A mudança é boa".

O título do artigo onde o texto acima se encontra é: "Missionários, não ajuda financeira, são a solução para o maior problema da África -- a passividade esmagadora do modo de pensar do povo". A realidade é que o comentário de Parris se aplica a todos os continentes e nações cujo Deus é o Senhor (Sl 33.12). Isso inclui as comunidades indígenas ou aborígenes ao redor do planeta. Nesse sentido, ao deixar de ser um missionário-cristão, Everett negou ao povo Mura-Pirahã, com o qual trabalhava, o bem-estar mais precioso que lhe podia legar.

Em termos pessoais, Everett deveria continuar a ter a antiga postura de gratidão ao propósito que Jesus deu a sua vida então desregrada, mesmo que agora considere um equívoco acreditar na existência de Deus. Sem a intervenção divina, sua trajetória poderia ter sido inadequada, inclusive academicamente -- fonte de sua fama atual. Não seria vergonhoso expressar essa gratidão em seus discursos pós-cristãos. Pelo contrário, seria um sinal de dignidade. Dignidade que sei que ele possui.

Postado por: Felipe Pinheiro

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