Igreja evangélica é demolida por escavadeiras sem aviso prévio, no Sudão

Erguida na década de 1990, a Igreja Pentecostal do Sudão foi demolida como parte de uma campanha para eliminar construções “não regulamentadas”.

Fonte: Guiame, com informações do Christian Daily e CSWAtualizado: quinta-feira, 17 de julho de 2025 às 12:45
Prédio de igreja demolido em Cartum Norte, Sudão, em 8 de julho de 2025. (Foto: CSW)
Prédio de igreja demolido em Cartum Norte, Sudão, em 8 de julho de 2025. (Foto: CSW)

Uma igreja pentecostal em Cartum foi destruída, em 8 de julho, por autoridades sudanesas aliadas a extremistas, segundo fontes locais. A ação ocorreu sem qualquer aviso prévio.

Escavadeiras e caminhões, escoltados por forças policiais e militares, chegaram ao meio-dia à região de El-Haj Yousif, no distrito do Nilo Oriental, iniciando imediatamente a demolição das instalações.

Inicialmente, as autoridades não apresentaram qualquer justificativa para a demolição do complexo cristão.

Eles destruíram completamente a igreja, seus escritórios administrativos, casa de hóspedes e outras instalações e edifícios anexos.

“Foi chocante”, disse uma testemunha ocular da ação destruidora.

A demolição tornou o templo, erguido pela Igreja Pentecostal do Sudão (SPC) no início da década de 1990, alvo de atenção internacional.

Violação da liberdade religiosa.

Segundo a organização Christian Solidarity Worldwide (CSW), cristãos locais recorreram ao Conselho de Igrejas do Sudão para reivindicar que o episódio seja reconhecido como uma grave violação da liberdade religiosa.

Segundo relatos, as autoridades teriam realizado a demolição sem solicitar previamente a documentação de propriedade da igreja.

Posteriormente, representantes do governo comunicaram à liderança da igreja que a demolição fazia parte de uma operação estadual para eliminação de construções consideradas “não regulamentadas” em Cartum, segundo a Portas Abertas.

“No mês passado, Rafat Samir, líder religioso e presidente do Conselho da Comunidade Evangélica do Sudão, alertou que o futuro da igreja no país continua precário sob o governo de fato das SAFs (Forças Armadas Sudanesas)”, informou a Portas Abertas.

“Eles vão atacar todas as igrejas nas áreas periféricas das principais cidades e demolir esses templos com ofensivas diretas”, disse ele após o incidente da semana passada.

“Quanto às grandes igrejas localizadas nos centros urbanos, elas serão alvo por meio de justificativas aparentemente legais, usadas para destruir os edifícios religiosos.”

Escalada de perseguição

Líderes cristãos denunciaram o ato como uma grave afronta à liberdade religiosa, apontando-o como reflexo de uma escalada na perseguição aos cristãos no Sudão.

“Pedimos a todos os cristãos que orem para que isso nos fortaleça nesta perseguição, e que orem pela igreja no Sudão”, declarou o pastor da região, Juma Sapana, em sua página no Facebook.

A demolição ocorreu pouco depois de as Forças Armadas Sudanesas (SAF) anunciarem, em maio, a retomada de Cartum das mãos das Forças de Apoio Rápido (RSF), grupo paramilitar com o qual estão em confronto desde 15 de abril de 2023.

Apesar da declaração, os combates seguem intensos na cidade vizinha de Omdurman. Desde o início do conflito, tanto a SAF quanto a RSF têm sido acusadas de atacar locais de culto religioso.

Em 2025, o Sudão ocupou a 5ª posição na Lista Mundial de Perseguição da Portas Abertas, que aponta os 50 países onde os cristãos enfrentam maiores dificuldades para praticar sua fé – uma piora em relação ao 8º lugar registrado no ano anterior.

Desde a eclosão da guerra civil em abril de 2023, as condições no Sudão se deterioraram gravemente.

Cristãos atacados

O país tem registrado um aumento alarmante no número de cristãos mortos, vítimas de violência sexual e ataques contra residências e estabelecimentos comerciais pertencentes a fiéis, segundo o relatório da PA.

“Cristãos de todas as origens estão presos no caos, sem condições de escapar. Igrejas são bombardeadas, saqueadas e ocupadas pelas partes em conflito”, afirma o relatório.

Tanto as RSF quanto as SAF, ambas de orientação islâmica, têm sido acusadas de atacar cristãos deslocados, sob a alegação de que estariam colaborando com os combatentes do grupo rival.

O confronto entre ambas as forças – que até outubro de 2021 compartilhavam o poder após um golpe militar – mergulhou o país em uma onda de violência que aterroriza a população de Cartum e outras regiões.

Segundo dados do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUR), o conflito já causou a morte de dezenas de milhares de civis e forçou o deslocamento de mais de 11,9 milhões de pessoas, tanto dentro quanto fora das fronteiras sudanesas.

Em março de 2023, enquanto o general Abdelfattah al-Burhan, comandante as SAF, e seu vice, Mohamed Hamdan Dagalo, líder das RSF, ainda ocupavam o poder, partidos civis aprovaram um plano para restabelecer a transição democrática no mês seguinte. No entanto, desacordos em torno da estrutura militar inviabilizaram a aprovação do acordo.

O general Burhan buscava submeter a RSF – força paramilitar originada das milícias Janjaweed que colaboraram com o ex-presidente Al-Bashir na repressão a rebeldes – ao controle pleno do exército regular em um prazo de dois anos.

Já Dagalo, seu vice e líder da RSF, propunha um cronograma bem mais longo, com integração não antes de dez anos.

Raízes islâmicas

Ambos os líderes militares, que têm raízes islâmicas, buscam projetar uma imagem favorável perante a comunidade internacional, se apresentando como defensores da democracia e promotores da liberdade religiosa.

Após o fim da ditadura islâmica de Omar al-Bashir em 2019, o Sudão viveu dois anos de avanços na liberdade religiosa.

O governo de transição revogou partes da sharia, proibindo, por exemplo, a classificação de grupos religiosos como "infiéis" e anulando as leis de apostasia.

No entanto, esse progresso foi interrompido com o golpe militar de 25 de outubro de 2021, que reacendeu a perseguição religiosa patrocinada pelo Estado.

Com o golpe, os cristãos no Sudão temiam o retorno dos aspectos mais repressivos e severos da lei islâmica.

Em 2019, após quase duas décadas sob alerta, os EUA retiraram o Sudão da lista de Países de Preocupação Particular (PCC) – acusados de graves violações à liberdade religiosa – e o incluíram na lista de observação. O país havia mantido a classificação de PCC entre 1999 e 2018.

Em dezembro de 2020, o Departamento de Estado removeu o Sudão de sua Lista de Observação Especial.

Aproximadamente 2 milhões de pessoas no Sudão se identificam como cristãs, o que representa cerca de 4,5% da população total do país, estimada em mais de 43 milhões de habitantes.

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