A colombiana Martha Sepúlveda esperava acordar na manhã de domingo (10) pela última vez. Isso porque ela seria a primeira de seu país a ser autorizada a passar pelo processo de eutanásia sem possuir quadro terminal. Ela deveria morrer às 7hs da manhã (hora local, 9h em Brasília).
Com 51 anos, ela sofre de esclerose lateral amiotrófica (ELA) e havia conseguido o direito inédito de passar pelo procedimento da eutanásia. No entanto, uma resolução de sábado (9) fez com que o procedimento fosse cancelado.
Por meio de nota, o Instituto Colombiano da Dor (Indocol) — onde Sepúlveda estava internada para passar pela eutanásia — afirmou que o comitê interdisciplinar para o “direito de morrer com dignidade pela eutanásia” realizou uma reunião na última sexta-feira, seguindo resoluções do Ministério da Saúde colombiano, para revisar seu caso.
A conclusão final é que “ao analisar a atualização do estado de saúde e da evolução da paciente, definiu-se que ela não cumpre com o critério de terminalidade como se havia considerado no primeiro comitê”, diz a nota que também informou que a decisão foi unânime.
Reação dos envolvidos
O filho de Martha, Frederico Redondo Sepúlveda, de 22 anos, que acompanharia a mãe em seus momentos finais, afirmou em entrevista à W Rádio Colômbia que a decisão foi arbitrária e ilegal. Ele também compartilhou sua insatisfação com a mudança repentina através de suas redes sociais.
“Nenhum médico do Comitê avaliou minha mãe. Revisaram o procedimento porque viram a notícia na televisão? Fizeram tudo escondido, nunca disseram que iriam se reunir”, disse.
Ele reconhece que gostaria de ter a mãe por mais tempo, mas afirma que aceitar a decisão da eutanásia é o “maior ato de amor” que já fez. “Em princípio preciso da minha mãe, quero ela comigo, quase em qualquer condição. Mas sei que em suas palavras ela já não vive mais, apenas sobrevive”, mencionou.
O advogado de Martha, Lucas Correa, disse em entrevista à BBC Mundo que a decisão é “ilegítima, ilegal e arbitrária”. Ele diz que ela viola o direito da paciente de morrer dignamente.
“Eles estão a forçando a viver uma vida que ela não deseja continuar vivendo, com sofrimento e uma dor que ela considera incompatíveis com sua ideia de dignidade”, disse.
A eutanásia ou morte assistida, é legalizada na Colômbia desde 1997. O país foi o primeiro na América do Sul a legalizar o procedimento. Em julho de 2021, a Corte Constitucional — equivalente ao Supremo Tribunal Federal no Brasil — aprovou a extensão do acesso à eutanásia para pessoas que não estejam em estado terminal. A decisão foi autorizada por 6 votos favoráveis e 3 contrários.
“Me considero alguém que crê muito em Deus, mas, repito, Deus não quer me ver sofrer”, diz Martha Sepúlveda. (Foto: Reprodução/Twitter)
Por que Martha quer morrer?
Em entrevista à emissora de TV colombiana Caracol, ela relatou sentir dores e ter perdido o movimento das pernas, o que a atrapalha na vida cotidiana. A doença conhecida como ELA (Esclerose Lateral Amiotrófica) ainda não tem cura e é degenerativa, causando paralisia progressiva e irreversível.
O tratamento disponível com medicamentos e fisioterapia pode atrasar a perda motora gradual e manter a independência do paciente em tarefas cotidianas por mais tempo.
Mas Martha não quer passar por esse processo, por isso optou pela eutanásia, alegando sofrimento físico e mental intenso. “Sou uma pessoa católica, me considero alguém que crê muito em Deus, mas, repito, Deus não quer me ver sofrer”, ela justificou. “Nenhum pai quer ver seus filhos sofrerem. Para mim, a morte é um descanso”, disse em entrevista à emissora colombiana Caracol.
Ela tem encontrado muita resistência dentro da Igreja, mas respondeu aos padres: “Faço isso porque estou sofrendo e porque creio em um Deus que não quer me ver assim. Para mim, Deus está me permitindo isso, então se gosta de mim, não gosta de me ver nesta situação”, afirmou.
Francisco Ceballos, bispo de Riohacha, defendeu que “a morte não pode ser a resposta terapêutica à dor e ao sofrimento em nenhum caso”.
"Quero dizer à minha irmã Martha que ela não está sozinha e que o Deus da vida sempre nos acompanha, e que sua tribulação pode encontrar um sentido transcendental, uma chamada ao amor que se renova”, disse o bispo, em vídeo divulgado em suas redes sociais.
Martha Sepúlveda e o filho Federico em entrevista à TV colombiana. (Foto: Federico Redondo Sepúlveda/Reprodução/Twitter)
O que a Bíblia diz?
Um dos mandamentos bíblicos é “não matarás” (Êxodo 20.13). Paulo alertou que o corpo humano pertence a Deus que o criou, além de ser o santuário do Espírito Santo (1 Coríntios 6.19).
Além disso, a Bíblia diz que a morte é inevitável: “Que homem pode viver e não ver a morte, ou livrar-se do poder da sepultura.” (Salmos 89.48). Salomão escreveu enquanto refletia: “Ninguém tem o poder de conter o próprio espírito; tampouco tem poder sobre o dia da sua morte.” (Eclesiastes 8.8).
A ideia de provocar a morte não aparece como favorável de acordo com as Escrituras Sagradas. Relatos bíblicos mostram mortes súbitas e mortes acompanhadas de muita dor e sofrimento. Mas não há na Bíblia, palavra alguma que encoraje alguém a evitar esses momentos antes da morte chegar.
Na opinião de teólogos, o controle da vida e da morte está exclusivamente nas mãos do Criador. O pastor e escritor americano Rick Warren, por exemplo, se posicionou contra a eutanásia, mesmo depois de perder o filho mais novo, após um suicídio.
“Eu me oponho a essa lei como teólogo e como o pai de um filho que tirou a própria vida depois de lutar contra uma doença mental por 27 anos”, disse durante uma conferência, em 2015.
A Bíblia tem várias passagens que encorajam o ser humano a encarar de frente toda e qualquer dificuldade. Entre as passagens estão as palavras de Jesus Cristo: “Eu lhes disse essas coisas para que em mim vocês tenham paz. Neste mundo vocês terão aflições; contudo, tenham ânimo! Eu venci o mundo.” (João 16.33). E depois mostra que as aflições, um dia, terão um fim: “Não haverá mais morte, nem tristeza, nem choro, nem dor…” (Apocalipse 21.4).
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