Ex-membro da Yakuza se torna pastor e evangeliza mafiosos: "Recomeço"

"Antes, nós estávamos em gangues rivais, disparando armas", exclama o pastor Shindo do púlpito. "Agora, estamos louvando o mesmo Deus".

Fonte: Guiame, com informações da CNNAtualizado: sábado, 6 de maio de 2017 às 12:31
Pastor Shindo. As tatuagens são hoje, apenas a lembrança de um passado sem Deus. (Foto: Tokyo Repórter)
Pastor Shindo. As tatuagens são hoje, apenas a lembrança de um passado sem Deus. (Foto: Tokyo Repórter)

É uma manhã chuvosa de domingo em Kawaguchi, uma cidade de cerca de meio milhão de pessoas na periferia de Tóquio. Homens e mulheres seguram seus guarda-chuvas de plástico transparente - onipresentes do Japão - à entrada de um bar em uma das esquinas da cidade.

Na placa acima da porta se lê 'Noive de Junho'. Durante 25 anos, o local foi um bar popular neste bairro residencial tranquilo, em Saitama Prefecture.

Escondido em uma esquina, o exterior do 'Noiva de Junho' pouco mudou ao longo dos anos. Mas por dentro, o local passou por uma transformação drástica. O antigo bar e palco de karaokê se foram, agora substituídos por um púlpito decorado com uma grande cruz. Fileiras de cadeiras lentamente se enchem o com rostos úmidos, mas principalmente sorridentes. Eles conversam silenciosamente entre si.

Mesmo que alguns dos rostos na multidão sejam de fregueses antigos do bar, eles já não estão mais ali para beber. Agora, aquele é, sem dúvida, um local de culto.

Uma das últimas pessoas a entrar na sala é o homem que todo mundo chama de "professor", o Sensei Tatsuya Shindo.

A partir do momento em que ele entra pela porta, os membros da igreja se esquecem do clima sombrio, enquanto a eletricidade enche a sala. Shindo assume o comando do púlpito - levantando seus braços, balançando a cabeça, e pregando com intensidade como se estivesse pulsando com "energia vinda do alto".


Ex-gângster
Aos 45 anos de idade, Shindo ainda aparenta certa jovialidade, parcialmente por causa de seu cabelo e também porque ele parece ter um sorriso permanente. Ele ri, muitas vezes, mesmo quando se fala sobre o passado sombrio que ele compartilha com muitos membros de sua congregação de cerca de 100 pessoas.

"Antes, nós estávamos em gangues rivais, disparando armas", ele exclama do púlpito. "Agora, estamos louvando o mesmo Deus".


O submundo do crime no Japão
Como alguns dos membros de sua congregação, o pastor, é um ex-gângster. A maioria deles era adolescente quando eles se juntaram à máfia japonesa, conhecida como a yakuza. Shindo tinha 17 anos.

"Eu era uma criança. Eu não pensava muito profundamente sobre as coisas", diz ele. "E eu admirava a yakuza, só pelo o que era visível na superfície. Eles têm muito dinheiro, gastam seu dinheiro ricamente, e jogam ostensivamente. Os bandidos pareciam tão legais aos meus olhos".


Pagamento em sangue
A ilusão inebriante de uma vida fácil no crime atraiu dezenas de milhares de adolescentes japoneses para se juntar à yakuza. Shindo diz que a maioria de seus colegas gangsters vieram de famílias disfuncionais. A yakuza promoveu um senso de lealdade e fraternidade. Mas Shindo caiu mais fundo no submundo japonês, aprendendo o real preço de pertencer ao grupo, que muitas vezes era pago em sangue.

"Meu chefe foi morto. As pessoas foram mortas em lutas pelo poder. As pernas das pessoas foram baleadas. Um cara que estava usando drogas comigo morreu de intoxicação. Suicídios aconteceram, mortes súbitas. Eu já vi muitas mortes", diz Shindo. "Eu vi meus capangas serem esfaqueados até a morte".

O corpo que Shindo carrega, as cicatrizes de sua antiga vida. O peito e os braços estão cobertos de tatuagens intrincadas - o símbolo que indica de adesão à mafia no Japão. Em um esforço para excluir os membros da yakuza da sociedade, tatuagens visíveis são proibidas na maioria dos locais públicos. Muitas vezes, o pastor tira a camisa, atualmente, quando batiza outros ex-gangsters tatuados.

Durante sua vida no crime, Shindo tornou-se viciado em metanfetamina. Ele dirigia sob a influência de drogas e bateu o carro de seu chefe. Ele mostra seu dedo mindinho em decepado, que foi cortado com um cinzel em um ritual da yakuza, para que ele pagasse por sua 'transgressão'.

Shindo foi preso sete vezes. Quando ele estava com 32 anos, ele havia sido excomungado da yakuza, depois de passar cerca de 8 a 10 anos na prisão. Ele diz que teve um encontro com Deus, enquanto lia a Bíblia em um confinamento solitário. Ele estudou e tornou-se um pastor, após sua libertação da cadeia, há mais de uma década.


Vida nova
Hoje, Shindo lidera uma congregação crescente em sua cidade.

"Um monte de pessoas com diferentes origens chegam aqui. Os que são divorciados, falidos e desprezados. Há também os pais que têm crianças desaparecidas, aqueles cujos filhos estão presos, ou aqueles que foram abandonados depois de passarem um tempo na prisão. Esta é um lugar para reiniciar a sua vida", diz ele. "Ex-membros da yakuza retornando para a sociedade é algo realmente extraordinário".

Um dos mais recentes membros da congregação é o ex-membro da yakuza, chamado Hiro, que fugiu do maior sindicato do crime do Japão, o Yamaguchi Gumi, após passar cinco anos na gangue.

"É muito difícil voltar para a sociedade normal", diz ele.

O homem de 37 anos tem sido evitado por sua família e estende uma esteira fina a cada noite para dormir no chão da igreja. Um outro membro da congregação contratou Hiro como pintor.

"Na vida que eu tive no passado, eu nunca acordei de manhã tão cedo quanto agora. Eu vivia apenas para ganhar dinheiro. Para conseguir dinheiro, eu fiz coisas ruins, vendi drogas. Mas a minha nova vida é a fase mais importante para eu me tornar uma pessoa melhor. Eu mudei muito depois de chegar a esta igreja", diz ele.

Hiro acredita que se ele não tivesse encontrado a igreja, ele já estaria de volta à cadeia. Ele diz que esta é uma rara oportunidade de transformar a sua vida, em uma sociedade na qual não é fácil dar uma segunda chance a pessoas como ele.


Encolhimento da Yakuza

Ex-mafiosos não têm muitas opções no Japão. Seu submundo secreto está diminuindo e os lucros estão secando com um novo tempo de repressão do governo. Hoje, a polícia estima que haja cerca de 50.000 filiados à yakuza - com uma queda drástica, se comparada a alguns anos atrás.

Jake Adelstein, um autor e jornalista, em Tóquio, que tem escrito extensivamente sobre a yakuza, diz que a máfia japonesa mantém bandidos (ladrões / assaltantes) em cheque. Ele diz que se a yakuza perder influência, os crimes rua poderiam surgir em Tóquio - considerada a cidade mais segura do mundo.

"Eles vão ter que encontrar uma maneira de usar essas pessoas. E eles vão ter que encontrar uma maneira de remover esse estigma de ser um ex-yakuza", diz Adelstein. "Esses caras, quando eles saem da máfia, estão recorrendo à pequena criminalidade, vão para a cadeia ou cometem suicídio. Muitos deles cometem suicídios. Porque, o Japão não é um lugar muito amigável para as pessoas que têm dedos decepados, que são cobertos com tatuagens e que nunca trabalharam de maneira honesta por tantos anos de suas vidas".

Em seu novo papel como sensei, Shindo batizou cerca de 100 pessoas, incluindo sua mãe, Yoshimi Shindo, que orgulhosamente observa seu filho pregar todos os domingos.

"Quando ele voltou [da prisão], ele pediu desculpas e disse, 'eu sobrevivi por você, mãe". Quando ouvi essas palavras, eu decidi esquecer tudo o que aconteceu no passado. E agora, estou muito feliz", diz ela.

Quando seu filho precisava de um espaço para o culto de domingo, ela prontamente ofereceu o 'Noiva de Junho' - o bar que possuía na época. Nos primeiros anos, menos de 10 pessoas participaram dos cultos dominicais. Agora, estabelecimento é rotineiramente preenchido com dezenas de pessoas a cada fim de semana.

"Penso que este lugar tem um significado que Deus forneceu aqui para nós. Creio que esta foi a intenção de Deus", diz ela.

Ela ri quando vê seu filho sendo chamado de sensei, considerando o caminho tumultuado que o trouxe até os dias atuais. O 'Noiva de Junho' não é mais um lugar para coquetéis e karaokê, mas sim um local cheio de música a cada fim de semana, com dezenas de vozes cantando músicas cristãs com uma mensagem de esperança.

"Eu acredito que a vida do meu filho retrata a surpresa final de Deus", acrescenta ela.


Testemunhos
Recentemente, nos Estados Unidos, um pastor também decidiu usar o seu passado negro e a transformação que Jesus operou em sua vida para evangelizar.

Autor do livro "Faça Uma Pausa para Ele", o pastor norte-americano Bill Purvis traz um testemunho de sua juventude rebelde e como Deus o salvou da morte, após ele ter levado golpes de facão no peito, na garganta e no estômago.

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