À procura de "bandeiras" para a Igreja Evangélica Brasileira

À procura de "bandeiras" para a Igreja Evangélica Brasileira

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 09:32

”Que lugar é este que junta milhões numa marcha gay, outros milhões numa marcha evangélica, muitas centenas numa marcha a favor da maconha, mas que não se mobiliza contra a corrupção?” (Juan Arias, jornalista, citado por Helena Beatriz Pacitti).

Na última newsletter do Pavablog que recebo periodicamente, entre tantas e tantas manchetes de destaque, esta acima em especial me chamou atenção justamente por tratar de um assunto que venho pensando bastante nos últimos dias. Inclusive recentemente num raríssimo momento de conversa e brainstorming com o outro (bastante ausente por sinal!) editor, o nobre Carlos André, comentei sobre escrever algo meio diferente dos temas habituais como mercado gospel, indústria fonográfica e afins. Comentei com ele sobre como eu sentia falta da igreja evangélica brasileira assumir algumas ‘bandeiras’ ao longo de sua existência e como isso se tornava cada vez mais latente em contraponto ao nosso crescimento como segmento na sociedade.

E ao ler a newsletter e coincidentemente me deparar com esta indagação me senti impelido a enfrentar o risco de escrever esse post a seguir. Na verdade, como já imagino qual teor darei ao texto, quero de antemão incluir-me nessa análise no mais autêntico mea culpa.

Nos tempos áureos da ditadura militar em nosso país, o Rio de Janeiro e o Brasil assistiram à “Marcha dos 100 Mil” convocada por entidades civis, sindicatos e principalmente a outrora combativa e hoje absolutamente chapa-branca UNE – União Nacional dos Estudantes. Naquele momento a ‘bandeira’ daqueles jovens baseava-se na luta pela liberdade, direitos, democracia, entre outros temas. A igreja evangélica brasileira à época não representava uma parcela grande na sociedade de nosso país como hoje em dia, mas já possuía alguma relevância, mas sua participação neste momento tão importante de nossa história foi pífia. Na verdade, a igreja evangélica brasileira durante o regime militar manteve-se entre a total inércia e o disfarçado colaboracionismo com os círculos do poder. Sobre esse momento de nossa história há alguns textos, livros e estudos (pouquíssimos é verdade!) publicados e vale a pena pesquisar sobre o assunto na web e nas bibliotecas.

Entre as lideranças evangélicas que se opuseram à ditadura, destaco o pastor presbiteriano James Wright (1927-1999). Nascido em Curitiba, filho de missionários norte-americanos, militante pelos direitos humanos que estudou teologia e pós-graduação na Universidade de Princeton (EUA), em 1950.

Em 1973, seu irmão Paulo Stuart Wright desaparece e é assassinado pelos órgãos de repressão do Regime Militar. Faz publicar e distribui, pela Coordenadoria Ecumênica de Serviço, 1,8 milhão de exemplares da edição ecumênica da Declaração Universal dos Direitos Humanos e escreve artigos para o exterior, denunciando as violações dos direitos humanos no Brasil. A partir de 1979, a convite de dom Paulo Evaristo Arns, trabalha pela causa dos direitos humanos na Arquidiocese de São Paulo e coordena o projeto Brasil: Tortura Nunca Mais, que resulta na publicação de um livro, um inventário sobre a tortura no Brasil durante os 21 anos de ditadura.

James Wright não contou em nenhum momento com o suporte da igreja evangélica brasileira, mesmo depois do fim da ditadura militar e chegou ao fim da vida contando apenas com o apoio da igreja católica e outras entidades para sua causa.

Passada a fase de chumbo da ditadura, o Brasil se envolveu na luta pela “Anistia Ampla, Geral e Irrestrita” que visava repatriar ou libertar das prisões os brasileiros que lutaram contra o regime militar. E mais uma vez, a igreja evangélica brasileira manteve-se à margem das manifestações.

Pouco tempo depois o país mergulhou na campanha pela democratização plena com as Diretas Já. Em mega comícios pelo país, a sociedade civil se uniu para clamar pela possibilidade do voto direto à presidência e outros cargos públicos. E seguindo o script de tempos anteriores, mais uma vez, a igreja evangélica brasileira manteve uma postura de distanciamento.

O país foi seguindo sua história com inúmeros momentos de menor ou maior participação da sociedade. E independente do tema em questão, a igreja evangélica brasileira manteve sua histórica neutralidade.

Vieram os cara-pintadas e o impeachment do presidente Collor. O Brasil pela primeira vez na história republicana viu um presidente ser deposto. Comoção nas ruas e uma aura de novos tempos pairou sobre o país. Depois vieram ainda os escândalos dos Anões do Orçamento, da Saúde e tantos outros problemas nacionais.

A igreja evangélica brasileira ao longo da década de 90 viveu uma explosão, um verdadeiro milagre do crescimento e hoje representa uma expressiva parcela de nossa sociedade. Estima-se que em 9 anos, mais de 50% da população brasileira fará parte de uma igreja evangélica totalizando mais de 100 milhões de pessoas.

E o que vemos de mudança de mentalidade e postura na igreja evangélica brasileira acompanhado por este crescimento? Minha resposta é simples e direta. Sinceramente, não vejo nada de tão relevante e impactante!

Não quero e não posso me aventurar a fazer uma análise sociológica do fenômeno evangélico e a sua participação na sociedade brasileira (olha aí um bom tema para estudantes em fase de monografia!), mas como um simples observador desse universo e como um cidadão comum, vejo que a igreja evangélica de nosso país é carente de assumir ‘bandeiras’. Sempre se mantendo a parte das grandes polêmicas e discussões da sociedade.

Mas talvez você astuto leitor do Observatório Cristão me questione: mas e o movimento contra a PL122? Isso não seria uma mudança na postura da igreja evangélica já que houve uma boa movimentação das lideranças? Ou mesmo na última campanha presidencial as lideranças evangélicas não tiveram um papel relevante?

Eu diria que estes dois exemplos ou “movimentos” podem ser sinais de que algo realmente mudou nos últimos tempos na postura da igreja evangélica em nosso país. A única dúvida que eu tenho é sobre os reais motivos de alguns líderes nestas ações, mas de qualquer forma, já podemos aplaudir esse rompimento com a tradição do distanciamento das grandes causas.

Do ponto de vista ético cristão contrapor-se à aprovação de uma lei como essa é absolutamente aceitável. Esta é uma ‘bandeira’ positiva assim como a não-liberação da cartilha pró-gay-sexo-livre proposta pelo Ministério da Educação pouco tempo atrás.

Só que entendo que esta deva ser uma ‘bandeira’ da igreja como um todo e não de poucos e midiáticos líderes. Confesso que não vi até hoje nenhuma ação em conjunto da igreja brasileira em prol da Família ou mesmo dos conceitos ético morais com base na Bíblia. Quando eu penso em IGREJA EVANGÉLICA BRASILEIRA, me vem à mente uma organização que realmente represente a maioria deste segmento da sociedade e não poucas e parcas denominações.

Sei que estou me estendendo demais neste texto, mas permita-me apenas seguir por mais algumas linhas porque este é um assunto muito empolgante!

Por exemplo, hoje há um mal que está assolando o país e que se chama CRACK. Famílias estão sendo devastadas pela força do vício das drogas. A sociedade brasileira está perdendo de goleada nessa luta contra o tráfico de drogas e a violência. E o que efetivamente a igreja evangélica brasileira está fazendo contra esse cataclisma? Mais uma vez respondo que a igreja, repetindo a novela de tempos atrás, mantém-se alheia às demandas da sociedade.

Apenas para ilustrar essa minha visão, no centro de São Paulo encontra-se a Cracolândia reunindo milhares de pessoas que consomem drogas em plena luz do dia. Pois bem, a Cracolândia está localizada há menos de 300 metros de distância da sede de uma mega denominação neopentecostal. E sabe que tipo de trabalho essa igreja realiza nessa região junto aos viciados em droga? Simplesmente nada! Nenhum trabalho, ou seja, mantém-se absolutamente distante dos problemas e segue pregando um evangelho de prosperidade e triunfalismo!

E contra a corrupção que grassa a nossa sociedade nos mais diferentes escalões, segmentos e rincões do país? Também neste caso não vemos a igreja fazendo absolutamente coisa alguma, mantendo-se distante de qualquer discussão.

Não quero, como frisei já no início deste texto, apontar dedos para qualquer pessoa que seja a não ser para mim primeiro.

Creio que como ‘sal’ e ‘luz’ para nossa sociedade eu deva me envolver em algum projeto cidadão em minha cidade. Já tive excelentes experiências recentes como na época das chuvas na Região Serrana do Rio e hoje sinto que devo voltar a buscar minha nova ‘bandeira’. Mas quero incentivar a que você, leitor, assíduo ou não, do Observatório Cristão, para que se sinta impelido, motivado e mesmo incomodado a mudar de postura e envolver-se com alguma ‘bandeira’ em prol de uma sociedade melhor e quem sabe, com esse nosso exemplo, possamos apresentar a vida com Jesus Cristo como algo melhor e mais inteligente.

____________________________________________________________________ Mauricio Soares, jornalista, blogueiro, profissional de marketing e idealista por uma igreja que faça a diferença na sociedade.

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