Maurício Soares escreve sobre o profissionalismo no mercado evangélico

O mercado evangélico é amador ou profissional?

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 09:13

Confesso que não tenho tido tanto tempo dedicado ao blog Observatório Cristão como gostaria. A verdade é que nestes últimos dias estou focado em alguns projetos que serão lançados nos próximos meses e em tantas outras demandas importantes que precisam muito de minha interferência direta. Até mesmo as constantes viagens estão um pouco mais raras nestes últimos dias. A falta de tempo para escrever não quer dizer que estou completamente alheio aos fatos cotidianos e muito menos de que minha mente não esteja em ebulição meditando sobre possíveis temas para o blog. O certo é que a falta de tempopara escrever os textos acaba tornando-se angustiante para alguém que tem compulsão, necessidade de expressar-se. Então, para tentar extravasar um pouco minha mente, estou abrindo mão de uns minutos para escrever o próximo texto.

Existem certas palavras e expressões que parecem entrar em moda. Hoje falamos e ouvimos muito os termos “sustentabilidade”, “interatividade”, “conectividade”… só para citar alguns. Tempos atrás falou-se muito em “parceria”, tanto que a palavra acabou assumindo um conceito desgastado com o tempo. Analisando comentários nas redes sociais e em boa parte de matérias do mercado gospel, vejo com muita freqüência a utilização do termo “profissionalismo”. Em grande parte esse termo tem relação direta com a idéia de buscarmos um aprimoramento nas mais diversas áreas do que chamamos hoje de mercado gospel no Brasil. Geralmente esse “profissionalismo” é acompanhado do seu termo antagônico, o também onipresente “amadorismo”.

E foi tentando entender o que é esse profissionalismo tão propalado no nosso meio que resolvi discorrer um pouco mais sobre o tema em nosso blog. Mas enfim, o que significa ser profissional em se tratando do meio evangélico brasileiro? Basicamente ter profissionalismo é atender às demandas esperadas de si no tocante aos afazeres técnico-profissionais. Quando uma pessoa é considerada profissional, diz-se que esta é competente, ética, cumpridora de metas, organizada, adaptada às novas situações do mercado, entre outros atributos.  

E o mercado evangélico em suas diferentes áreas e segmentos, pode ser tratado como uma referência de ambiente pautado pelo profissionalismo?

Sinceramente creio que ainda não! Na verdade, imagino que estejamos ainda bem distantes do mínimo ideal para sermos tratados como um mercado sólido, equilibrado, racional. Numa rápida e rasa análise consigo identificar alguns excelentes profissionais exercendo papéis importantes e relevantes em nosso mercado, mas ainda estes são uma pequena minoria. Posso citar alguns nomes que surgem num primeiro momento que se destacam no segmento como Ronaldo Rodrigues de Souza, diretor da CPAD, que nos últimos anos vem desenvolvendo um trabalho de excelência na área editorial. Também posso citar o amigo MarcosSimas, publisher da revista e site Cristianismo Hoje, recém chegado de uma temporada nos EUA onde aprimorou ainda mais seus conhecimentos. Ainda na área editorial, a equipe da Editora Mundo Cristão, em especial, Renato Fleischman, profissional que tive a honra de trabalhar há alguns anos atrás. Na música, posso elencar alguns nomes como Ruben di Souza, produtor de BH que vem trazendo excelentes novidades em seus projetos. Também o profissional Luciano Vassão da Master Final, na minha opinião, o melhor de sua área em nosso segmento no país. E antes de tornar-se manager, o popular Doninha, era o melhor profissional de divulgação gospel do país! Na área de entretenimento, o impagável Alex Passos é incomparável. Também posso destacar o trabalho excelente de Bruno Fioravanti, excelente profissional das lentes e, ainda, Hugo Pessoa, que vem melhorando cada vez mais a cada produção. Em termos de mídia, posso destacar o competente Mário Fernando, publisher da Revista Comunhão de Vitória/ES. Ainda posso citar aqui nesta lista o trabalho de referência da Dunamys Distribuidora do Rio de Janeiro e o exemplo ético e de trabalho promovido pelo querido Nogueira de Fortaleza/CE.

Se esta lista fosse continuada, acho que poderíamos ainda elencar mais umas 50 pessoas, 100 no máximo! Para um mercado estimado em mais de 50 milhões de brasileiros e que vem crescendo a taxas avassaladoras nos últimos anos, convenhamos que uma lista reunindo 100 profissionais ainda é muito pouco! Comecei falando do assunto comentando sobre nomes, pessoas, algumas empresas, porque efetivamente a grande mudança pode acontecer primeiramente nesse aspecto! Precisamos ter profissionais mais competentes e capacitados em nosso meio! É fundamental que os empresários, líderes, aqueles que hoje estão à frente das grandes empresas do mercado gospel, invistam na capacitação de suas equipes. Periodicamente tenho participado de treinamentos, cursos, palestras e fóruns. Entre meus projetos pessoais, anualmente há uma ou duas viagens internacionais para aprimoramento cultural e de conhecimento. Hoje trabalhonuma empresa que incentiva seus funcionários a estudarem e aprimorarem seusconhecimentos e isso é muito importante!

Não há como almejarmos um mercado gospel mais profissional sem investirmos em pessoas e conhecimento!

Em segundo lugar, creio que devemos ser bem mais abertos às novidades! Infelizmente ainda vejo condutas e pensamentos absurdamente retrógrados em nosso meio. Para falar de uma área em que entendo bem, como exemplo, o mercado fonográfico gospel ainda mantém práticas medievais! Raras são as gravadoras do segmento que procuram desenvolver um canal de comunicação entre si. Há no máximo um respeito distanciado, quando na verdade, até mesmo por uma questão de sobrevivência, deveria haver uma relação forte de parceria! Não sei se vocês sabem, mas não há uma associação de gravadoras evangélicas simplesmente por ser impossível conseguir colocá-las num mesmo ambiente! Depois de mais de 23 anos trabalhando no mercado religioso, sendo que destes, cerca de 17 anos diretamente ligado ao segmento fonográfico, aprendi muito nos últimos 3 anos trabalhando numa gravadora secular multinacional. E entre uma das questões que mais me chamou a atenção foi a constante relação entre os players desse mercado. Além de existir uma associação que reúne as principais gravadoras do país, as parcerias, trocas de conteúdo, cessão de artistas, entre outras, é constante! Em nosso meio ainda temos que conviver com gravadoras se digladiando! Gravadoras que retém compositores, conteúdos, artistas como se ainda estivessem em pleno período feudal! Essas práticas precisam ser revistas! É importante, buscando um novo conceito de profissionalismo, que os gestores das empresas evangélicas avaliem suas práticas, condutas, objetivos e cultura.

Apenas para ilustrar, recentemente promovemos um evento em São Paulo para lojistas e mídias, juntamente com alguns artistas da gravadora. Esperávamos uma audiência de 70 pessoas e acabamos recebendo cerca de 110 presentes. Um dos comentários mais recorrentes naquela noite e mesmo temposdepois, foi a cortesia de nossa parte em convidar uma gravadora concorrente, no caso a Canzion, para participar do evento. Esse simples ato repercutiu tão bem entre os presentes que apenas ficou mais evidenciado a falta desse espíritocorporativista em nosso segmento. Somos concorrentes, não inimigos!

Para buscarmos um melhor profissionalismo, precisamos promover uma verdadeira metanóia, ou seja, uma mudança radical da mente, de conceitos e atitudes.

Outro dia tive uma saudável discussão com um amigo de longa data. Com sua preocupação natural, esse amigo pedia para que eu pegasse mais leve em algumas situações. Naquele momento estávamos falando sobre a forma (equivocada e desatualizada, em minha opinião) como grande parte das rádios evangélicaslidavam com algumas questões, principalmente na montagem de suas respectivas programações musicais e no trato com seu público. Entre opiniões e argumentos de um ou outro lado, afirmei pra ele que certas coisas em nosso mercado deveriam mudar! O mundo hoje é outro! As práticas são outras! As demandas são diferentes de tempos atrás, então o mercado gospel precisava deixar de ser algo paleolítico! E ele me disse: “Mas você não pode querer mudar isso! Não pode se expor sempre!” Então parei, respirei fundo e afirmei com a maior calma que realmente sozinho não conseguiria nada, talvez formasse uns inimigos, criasse uns problemas para mim, mas que mesmo obstante a todos esses possíveis problemas, não poderia simplesmente ser tragado na conformidade! Confesso aos 44, ou melhor 45 leitores (incluo agora o Fábio Sampaio do Tanlan) do blog que estou longe de ser um Don Quixote lutando contra os moinhos de vento do amadorismo no meio gospel, mas é muito difícil para mim, conviver com tanto amadorismo. Equando falo de amadorismo, ataco principalmente o conceito e as atitudes e nem tanto as pessoas!

Não espere um revolução em prol do profissionalismo! Faça sua parte e mude seus hábitos cotidianos buscando a excelência!

É inevitável que o segmento gospel no Brasil em mais alguns anos, décadas talvez, será algo realmente grandioso. E também é fato que muitos grupos empresariais, altamente qualificados, com poderia econômico financeiro, irão focar suas atividades para atingir a este segmento. Se mantivermos essas mesmas práticas antiquadas, seguramente inúmeras empresas serão simplesmente tragadas como numa autêntica tsunami! Isso irá acontecer na área editorial,onde hoje já temos a Ediouro/Thomas Nelson atuando com grande sucesso no país. Também na área fonográfica, vide Sony Music e Som Livre. Na área de mídia, onde já tive informações seguras de um novo grupo de rádios chegando ao mercado baseadas num grupo forte de mídia secular. Na área de eventos, shows, festivais como já tivemos no ano passado o Festival Promessas promovido pela Rede Globo e Geo Eventos. Também nos canais de distribuição como livrarias especializadas, megastores, e-commerce. E em tantas outras áreas que compõem o que chamamoscomumente de mercado gospel.
 
Especialmente no que diz respeito à qualidade de nossa mídia, a necessidade de uma reinvenção é primordial! Folheando grande parte das revistas do meio, a impressão que tenho é de estar lendo um exemplar da MAD (talvez os mais novos não conheçam, mas foi uma importante revista cômica do século passado). A diagramação geralmente é tétrica! A qualidade do conteúdo sofrível e em muitas das vezes, estes textos são meras reproduções de matérias enviadas por “acessores”. E sem deixar de lembrar que em muitas vezes estas revistas são meras reproduções de matérias pagas, informes publicitários e anúncios. Como dizia um antigo diretor com quem trabalhei: “é um mero sujar papel!” Ainda falando de nossa mídia, o que dizer dos sites gospel que pupulam na web? Quantos destes sites realmente têm densidade jornalística e crítica? O que vemos por aí muitas das vezes são sites de reprodução de notícias, de fofocas, de críticas rasas. Outro dia vi um ranking num destes sites “especializados” destacando os principais clipes do meio gospel – pausa para tomar um anti-ácido – e que colocava como a melhor produção do ano um vídeo tosco, digno de ser comentado pelo Marcos Mion naquele programa “Os Piores Clipes do Mundo”, mas independente disso, o pseudo-entendido-de-vídeo-clipes-gospel teceu loas e loas à produção da Família Adams! Prometo um dia falar mais a respeito desse tema da qualidade das mídias no meio gospel. Preciso ter muito tempo para comentar os programas de TV e a programação das rádios.

Mesmo os artistas gospel precisam rever imediatamente suas posturas. Venho sempre abordando nesse blog a necessidade de uma revisão séria nas questões de atendimento dos cantores. A importância do trabalho de manager e mesmo de um empresário-investidor. A qualidade e a performance das apresentações dos artistas no palco são outros aspectos a se avaliar. Já progredimos muito nesta área em especial, mas diante das expectativas e demandas que virão, ainda temos muito a melhorar!

Esse é um tema que tem muitas possibilidades de enfoque. Como preciso parar agora e seguir com meus outros compromissos, vou finalizando esse texto reforçando a mensagem de que todos temos parte nesse projeto de melhora, deamadurecimento do mercado. E não se iluda pensando que essa mudança passa apenas pelos profissionais das editoras, gravadoras, mídias, lojas, sites … você como um mero consumidor tem um papel fundamental em todo esse processo, pois a partir do momento em que você tornar-se mais exigente, mais ciente de seu papel na sociedade e exigir uma melhor contrapartida, certamente os atores do mercado gospel irão se esforçar mais para alcançarem a excelência e por conseguinte o profissionalismo.
 
Quero também deixar claro que estou longe do ideal profissional. Na verdade, creio que jamais conseguimos a plenitude nesta questão. Talvez o meu grande mérito neste momento seja somente reconhecer essa minha necessidade por tornar-me cada vez mais um profissional de verdade. Reconhecer nossas fraquezas, necessidades e falhas já é um grande passo para o aprimoramento pessoal. Estou tentando fazer a minha parte e espero que este texto tenha contribuído para uma mudança de postura a partir de agora. Mãos à obra!
 

Por Mauricio Soares, publicitário, jornalista, observador atento e nas horas vagas alguém que adora curtir um filme em família, mesmo que seja os Vingadores.  

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