"Menos intolerância e mais amor" é a proposta de Leonardo Gonçalves aos cristãos

"Menos intolerância e mais amor" é a proposta de Leonardo Gonçalves aos cristãos

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 10:12

Leonardo Gonçalves lançou, recentemente, seu primeiro CD pela Sony Music.

O álbum Avinu Malkenu é uma novidade no meio gospel, pois é todo gravado em hebraico.

Em entrevista ao GUIA-ME, Leonardo Gonçalves respondeu a perguntas que explicam como surgiu a ideia do CD, dá detalhes da produção e revela seu real objetivo. Confira

Guia-me: Como surgiu a ideia de gravar um CD em hebraico? Era um sonho antigo?

Leonardo Gonçalves: Sonho antigo, com certeza. Demorou seis anos para gravar o disco, mais dois anos de preparação, ou seja, já estou envolvido no projeto há oito anos. A idéia surgiu do meu pastor e grande amigo, Edson Nunes, que é uma pessoa abençoadíssima, ele foi o grande incentivador. Outra coisa que marcou muito foi o fato de meu avô, em 2002, descobrir que tinha ascendência judaica. Quando ele foi comigo uma vez no tempo judaico adventista, ele lembrou de um monte de coisa da infância dele, do enterro do avô, e isso foimuito marcante pra ele, e ali descobrimos que eu tenho ascendência judaica. Talvez esse tenha sido o empurrãozinho final para eu tomar a decisão de entrar em estúdio e gravar esse projeto.

Guia-me: Por que a demora na produção?

LG: Demorou tanto porque envolveu muita pesquisa. A gente quis fazer tudo com muita calma. Cada passo foi feito muito conscientemente. A gente queria ultrapassar as possibilidades de trabalho que um CD em hebraico tem dentro do meio cristão.

Guia-me: Qual é a real proposta do álbum "Avinu Malkenu"?

LG: A proposta deste CD é, de fato, dialogar com o judaísmo através da música. Na minha opinião, a gente tem um momento de intolerância, não somente no mundo, mas também no meio cristão. A tolerância impera e cada vez mais a gente tem simpósios, pessoas se reunindo para fazerem discursos um para o outro. Ou seja, eu falo, depois você fala, a gente não concorda, não argumenta nada e são discursos separados que não têm um ponto de encontro, isso porque nós perdemos a capacidade de enxergar o outro do seu ponto devista.

A proposta desde CD foi realmente, além de uma busca pessoal às minhas raízes, uma maneira ousada de tentar enxergar o judaísmo do ponto de vista cristão, mas que fosse relevante para o judaísmo. Então, desde a escolha do repertório, instrumentos utilizados, arranjos feitos, gravação, mixagem, masterização, tentamos fazer de uma maneira relevante, não apenas para o público cristão, mas que tivesse um potencial para incentivar o diálogo entre judeus e cristãos. Claro que esse diálogo não é fácil de ser travado pelos preconceitos que existem tanto do lado de lá, quanto do lado de cá, mas, diferentemente de um debate teológico, a arte tem a capacidade de fazer com que a gente se sinta conectado e isso gera união, tolerância e respeito. A mensagem de Deus, independentemente se no antigo ou no novo testamento, é de amor, e esse amor precisa ser transmitido através da tolerância e do respeito, coisa que não tem acontecido dentro das próprias igrejas cristãs, entre denominações e entre religiões de maneira geral. Além do diálogo com o judaísmo, o CD tem esse objetivo de diminuir o preconceito que existe dentro das próprias igrejas cristãs em prol de nos tornarmos mais conscientes, amorosos, conscientes e tolerantes.

Guia-me: Como foi a escolha do repertório?  O que você buscou passar nas letras das canções?

LG: O repertório foi uma das partes mais interessantes da produção do CD. Levamos dois anos para escolher as músicas e durante o processo acrescentamos outras músicas que não tínhamos planejado. O grande lance é que existe um repertório muito rico de música judaica. O judaísmo é a única cultura pré-histórica que ainda se mantém razoavelmente intacta até hoje. Tem muita música judaica com letras incríveis e duro foi escolher as oito músicas certas. O disco tem doze, mas nós queríamos escolher oito tradicionalmentejudaicas e nós escrevemos mais quatro – meu irmão fez duas e eu fiz outras duas. Conseguimos espalhar quatro músicas inéditas no meio das oito tradicionalmente judaicas de uma maneira que fizesse sentido. As três primeiras canções são orações, entre elas a “Avinu Malkenu”, que dá nome ao CD e uma música nova que é a oração do Pai Nosso em hebraico. As três canções seguintes falam sobre a Nova Jerusalém, outras três que falam da Lei, duas com textos de Isaías e a última canção que é a bênção final. A gente conseguiu um repertório de tal maneira que as músicas inéditas estivessem dentro do contexto das outras que já são conhecidas pela cultura judaica.

Guia-me: Acredita que o CD vá trazer à tona a discussão sobre o legalismo e alertar as pessoas quanto ao zelo pelos costumes e regras dentro das igrejas?

LG: O legalismo é um problema em todas as igrejas, sem sombra de dúvida. Quando você é legalista está dizendo para Deus que consegue ser justo sem ele e que você não precisa da graça. Ouvi um sermão esses dias falando da parábola do homem que tinha uma dívida completamente impagável, e a atitude dele não foi de pedir perdão, foi de dizer ao rei ‘tudo te pagarei’; ele tinha esse orgulho. E o legal é que Deus perdoa e ama também ao legalista. E o rei perdoou a dívida do legalista, o problema foi quandoo legalista não perdoou ao seu próximo que devia para ele um ‘nada’.

Um dos papéis da minha congregação, que é um templo judaico adventista, é ajudar aqueles adventistas que têm ascendência judaica a manter sua identidade cultural. A gente faz a liturgia em hebraico e lê as orações e corre aquele perigo de apenas repetir palavras vãs. Você tem como repetir da boca para fora, mas se você presta atenção no que está falando, aquilo se torna significativo.

O chavão não é chavão porque é ruim. Ele é uma frase que tem significado, mas de tanto ser repetida ele se perde. Mas a qualquer instante alguém pode resgatar o significado que aquela frase tem. Vou até fazer a aplicação dessa liturgia na música. Eu já devo ter cantando a música 'Getsêmani' mais de mil vezes e corro o perigo de cantá-la da boca para fora, sem prestar atenção no que estou cantando, mas toda vez que eu canto, me coloco em exercício consciente de prestar atenção e compreender o que estou cantando, e eu reinvento a letra cada vez que eu canto. Então, ao mesmo tempo em que a liturgia abre o perigo para o legalismo, é a própria solução para o legalismo.

Guia-me: Você havia dito que, com a chegada desse CD, o tempo de Deus em sua vida estava ainda mais significativo. Por quê?

LG: É realmente incrível pensar que o título do CD, Avinu Malkenu - que é a principal música, seja do ano judaico. Foi coisa de minuto, de timing perfeito, pois o CD chegou ao estande da Sony às cinco e trinta da tarde, horário de pôr do sol de quarta-feira, dia 8. Eu vi o CD pela primeira vez enquanto, em todas as sinagogas, as pessoas estavam se preparando para cantar exatamente a música título do CD. Não sou dado a grandes superstições religiosas, mas eu fiquei muito emocionado com esse fato porque foi uma confirmação, afinal, fiquei seis anos gravando o disco e o que eu mais ouvia era que estava atrasado, que eu estava enrolando, mas foi visível que este CD nasceu no tempo certa e da maneira certa.

Por Juliana Simioni

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