Ser ou Não Ser? Crescimento ou Inchaço? Eis a Questão!

Ser ou Não Ser? Crescimento ou Inchaço? Eis a Questão!

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 9:52

Lá pelos idos de 1983 fui batizado pelo Pastor Nilson do Amaral Fanini na Primeira Igreja Batista de Niterói. Estava prestes a completar 14 anos de idade e de forma bastante intensa apaixonei-me por Jesus e pela proposta de uma vida diferente dali em diante. Até aquele momento minha vida foi razoavelmente tranquila. Sempre estudei em bons colégios, vivia totalmente dedicado aos esportes, nunca me envolvi com drogas, bebidas, nada demais! Acho que se eu não fosse crente (que era o termo mais usado à época) seria um cara bem careta.

Lembro-me que quando falei para o meu pai que queria me batizar na igreja evangélica ele parabenizou-me e autorizou sem maiores negociações, mesmo sendo ele um católico nominal naquela época. Naquele tempo, ser crente significava ser alguém com motivos nobres, alguém mais voltado ao bem estar comum, alguém com valores morais e éticos bastante firmes! Quando alguém afirmava ser crente o “selo de ISO9007&S243; que autenticava a boa índole da pessoa estava ali marcado (esse selo é por minha conta! é só uma hipérbole! que fique claro!) e assegurava não somente bons negócios mas também tranquilidade, respeito e compromisso.

Viajando no túnel do tempo e da imaginação para o ano de 2011, me deparo com um cenário bastante diferente! Se na década de 80 éramos poucos. Em 2011 somos mais de 35 milhões de brasileiros. De acordo com a última pesquisa da Sepal, em mais alguns anos a população evangélica no Brasil será equivalente a 50% da sociedade brasileira. Confesso que, ao reler esse último parágrafo, não consigo me incluir no termo “somos mais de 35 milhões”, não que eu tenha apostatado de minha fé evangélica, mas é que hoje esse leque está tão amplo que percebo mais diferenças do que similaridades entre as diversas correntes do que se diz por aí como sendo evangélico.

Entende-se normalmente no Brasil como evangélica aquela igreja cristã que utilize a Bíblia Sagrada como sua base de ensinamentos. Entre as igrejas evangélicas inclui-se as históricas como Batista, Presbiteriana, Metodista, entre outras. Além destas há as pentecostais como Assembléia de Deus e Quadrangular e as neo-pentecostais como IURD, Renascer, IIGD, Nova Vida, para citar algumas. No meu modo de vista há ainda, as Neo-Neo-Pentecostais que são as igrejas que surgem todos os dias frutos de cisões e mais cisões, numa progressão geométrica difícil de se calcular.

Não quero e não devo julgar as diferenças. Acho que pode haver uma estratégia celestial para que exista toda essa diversidade, mas me arrepio de ver algumas práticas ditas ‘evangélicas’, principalmente na TV. Pelo crescimento do segmento, temos assistido a uma miscelânea de teologias, teorias e crendices dignos da época da Reforma. Longe de querer enveredar-me pela História da Reforma Protestante, mas muito do que vemos e ouvimos hoje foi combatido por Martinho Lutero séculos atrás.

A mercantilização da igreja de Roma foi um dos fundamentos do rompimento de Lutero e o surgimento da nova igreja cristã que hoje conhecemos como sendo as igrejas evangélicas oriundas da Reforma. Imagino que, se Lutero hoje pudesse sentar-se confortavelmente em sua poltrona para assistir aos programas de TV com programação ‘evangélica’, iria promover a Reforma da Reforma Protestante.

É tanto ’sabonete’, ‘óleo’, ‘campanha’, ‘corrente’, ‘toalha’, ‘carnê’ e outros “amuletos goxpéis” que mais parece que estamos vivendo um autêntico sincretismo evangélico, misturando símbolos e hábitos das religiões africanas, espiritismo, catolicismo, carnê do Baú e pirâmide a la Bernard Madoff.

Pano rápido 1...

Outro dia, um colega de trabalho me disse que estava acompanhando uns programas de TV evangélicos, mas que ele ainda sentia algum desconforto pela forma como que o Evangelho era apresentado. Num misto de desabafo e constrangimento ele me confessou que achava que se falava pouco de Bíblia e muito de dinheiro. Eram muitas campanhas, contas, muita venda de podutos. Com muita calma, expliquei a ele que o que ele estava vendo na TV, em sua grande maioria, era uma faceta da igreja evangélica brasileira, mas não a sua totalidade. Convidei-o a conhecer algumas igrejas e praticamente proibi-o de continuar assistindo alguns programas de TV. Sei que fui radical, mas entre manter uma imagem e apresentar algo verdadeiro para uma pessoa que está sedenta pela Palavra, optei pela segunda opção.

Pano rápido 2...

Vivendo dias de retiro domiciliar em pleno feriado momesco, deparei-me com várias celebridades que durante o ano se proclamaram como evangélicos, mas que, ao soar do repinique, o tamborim e o surdo de marcação, sobem no trio, nos palcos ou nos carros alegóricos para desfrutarem de toda a folia carnavalesca. O conceito do que é hoje evangélico é tão amplo que nos deparamos com situações completamente desagradáveis.

Infelizmente, muitos pastores colocam essas celebridades como troféus de caça no panteão de suas conquistas. Sabe aquela imagem das cabeças de leões, rinocerontes e zebras empalhadas? Se pudessem, muitos líderes exibiriam os seus troféus de caça da mesma forma em seus gabinetes pastorais.

Só para ilustrar esse comentário, outro dia desses foi publicado num grande site gospel que uma ex-participante de reality show, evangélica, posaria nua num ensaio bastante selvagem! Será que ela vai interpretar a história de Eva? Piada infame, eu sei… mas o que mais eu posso dizer de um “ensaio selvagem”?

Ainda no carnaval, um conhecido casal de ‘cantores’ da boa terra desfilaram com seus trios, inclusive para crianças. Imagino que não tocaram nenhuma música do DT, Cristina Mel ou músicas de Mara Maravilha para animarem os pequenos foliões.

Outro que me chamou a atenção foi um jogador de futebol que sempre levanta os dedos pra cima agradecendo os gols, gravou clipe de grupo gospel, faz questão de contribuir com sua igreja local, mas marcou ponto no carnaval da Bahia e do Rio de Janeiro num sorriso tão elástico como os dribles que costuma dar em seus adversários.

Pano rápido final...

Não quero parecer alguém retrógrado, legalista ou que se sinta superior a ninguém. Apenas me preocupo muito com o Evangelho que meus filhos irão se deparar em mais alguns anos. O crescimento do segmento evangélico no Brasil infelizmente está trazendo tantas mazelas, tantas mudanças de visão, tantas novidades, que me assusta a capacidade de elasticidade de conceitos teológicos que julgava antes inegociáveis e que, para minha humilde percepção, continuam tão arraigados como naquele longínquo ano de 1983 quando nasci de novo.

Por Mauricio Soares - publicitário, jornalista consultor de marketing e diretor executivo da Sony Music Gospel no Brasil

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