Custo para manter reservas externas alcança US$ 27 bilhões

Custo para manter reservas externas alcança US$ 27 bilhões

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 10:10

Um dos “sonhos” do ex-presidente americano Harry Truman (1884-1972) era conhecer um economista de um braço só. Isso porque, segundo ele, o especialista não teria como usar a expressão “on the other hand” (que quer dizer "na outra mão", em tradução livre). A preocupação do 33º presidente da história dos Estados Unidos é recorrente em economia. Se, em uma mão, as medidas econômicas geram ganhos, em outra, algumas perdas são inevitáveis. É o que os economistas chamam tecnicamente de trade-off .

E é esse “jogo de mãos” que o Banco Central do Brasil enfrenta na administração das reservas internacionais. O fluxo crescente de capitais – intensificado pelo bom momento da economia brasileira e pelo diferencial de juros do País – fez com que a autoridade monetária intensificasse as intervenções no mercado à vista, engordando as reservas. Até o dia 13 de outubro, o montante já era de US$ 280 bilhões, o maior da história.   As dez maiores reservas do mundo Brasil aparece na oitava posição da lista Embora garanta ao País uma aparente segurança em cenários de vulnerabilidade externa – vide o exemplo da crise internacional de 2008 -, as reservas internacionais em expansão têm o seu “on the other hand”: os custos gerados aos cofres públicos devem atingir este ano os maiores níveis desde 2002. Segundo projeções do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos (Depec) do Bradesco, o custo nominal das reservas deve chegar neste ano a US$ 27 bilhões, o maior em oito anos. O valor é correspondente a toda fortuna estimada para o empresário brasileiro Eike Batista, o oitavo homem mais rico do mundo, segundo a revista Forbes. Estimativas do Bank of America Merrill Lynch também apontam para cifras altas, com gastos de US$ 25 bilhões em 2010.

O cálculo é feito pela diferença entre a rentabilidade das aplicações (juros externos) e os juros domésticos que o BC oferece nos títulos públicos, como a taxa Selic, hoje em 10,75% ao ano. Como as aplicações externas – concentradas, principalmente, em títulos do Tesouro dos EUA de curto prazo – têm projeções de baixa rentabilidade, por volta de zero por ano, e o volume das reservas brasileiras cresce exponencialmente (aumentando o diferencial de juros) os gastos devem atingir patamares mais elevados frente a anos anteriores.

Em 2009, a rentabilidade das reservas internacionais foi de 0,83% e, para este ano, segundo o Depec, não deve ser muito diferente, “podendo muito provavelmente ficar até abaixo disso”. “Estimamos um custo de acumulação de reservas de 1,4% do PIB em 2010. A média de 2003 a 2009 foi de 0,8% do PIB”, completou o banco, em relatório.

Caso se confirme o número projetado, o custo em proporção ao PIB repetirá o registrado em 2005, ano em que a rentabilidade das reservas ficou negativa em 3,58%.

Além do necessário

A tendência é de que o Brasil mantenha a trajetória de acúmulo de reservas, visto que o fluxo de capital estrangeiro deve seguir em alta por aqui. Segundo projeções do Instituto de Finanças Internacionais (IIF, na sigla em inglês), a entrada de capital estrangeiro nos mercados emergentes deve crescer 42% neste ano, chegando a US$ 825 bilhões. Em 2011, o número deve subir para US$ 833,4 bilhões. O Brasil, que chegou a ser alçado como bola da vez do cenário mundial, desponta como um dos principais destinos para esses recursos.

Com a entrada de recursos externos em alta, a tendência é de reservas ainda maiores. Mas, na avaliação de especialistas, o montante brasileiro já pode estar acima do ideal. Estudos do Fundo Monetário Internacional (FMI) apontam que, para países emergentes, as reservas devem representar 10% do PIB. No caso brasileiro, daria algo em torno de US$ 160 bilhões.

“Os bancos centrais parecem atualmente não estar preocupados com os custos da intervenção (no mercado à vista)”, diz o BofA Merrill Lynch, em relatório. “Enquanto isso pode tornar-se um problema futuro, os BCs parecem dispostos a acumular reservas além dos níveis eficientes para o momento”, completa o banco.

A visão é compartilhada pelo Depec do Bradesco. Nos cálculos do departamento, o nível ideal seria comparável ao observado antes do agravamento da crise mundial, em setembro de 2008, com a quebra do banco de investimentos Lehman Brothers. “Naquele momento, tal nível foi suficiente para enfrentar uma gravíssima crise financeira”, diz o relatório do Depec.

Em junho de 2008, as reservas representavam 19% do passivo externo bruto do País. “Assim, se utilizarmos esta proporção para o passivo externo bruto atualizado para este ano, segundo este critério, seria de US$ 225 bilhões”, completa.

O custo do “excesso” de reserva – considerado positivo pelo Bradesco, já que há uma tendência de alta do passivo externo – ficaria em 0,27% do PIB. “Em suma, o trade-off que está à mesa é de um lado 0,27% do PIB e de outro os efeitos de uma maior volatilidade e apreciação da moeda sobre a economia.”

Controle do câmbio

Para Raphael Martello, economista da Tendências Consultoria, há pelo menos um ano, o movimento de acúmulo de reservas deixou de influenciar a visão do investidor internacional sobre o Brasil, demonstrado pelo risco-País. "No começo da formação de reservas, o acúmulo fazia com que o risco-País caísse claramente. De um ano para cá, as reservas seguem aumentando, mas o risco-País está praticamente estável", diz.

"Parece haver uma política mais clara de utilizar as reservas como instrumento para tentar conter a apreciação do câmbio", completa Martello. Para ele, o governo poderia recorrer a outros instrumentos - menos custosos - para este fim, tais como quarentena de investimento e aumento da alíquota do Imposto de Renda para estrangeiros.

Embora o Banco Central tenha intensificado as atuações no mercado, o nível de crescimento das reservas brasileiras está dentro dos padrões internacionais. Com crescimento médio de 19% nos últimos 12 meses acumulados em agosto, o nível brasileiro é praticamente o mesmo dos 20% da média global. Já os emergentes, tiveram expansão de 25%, embora países como China, Arábia Saudita e Rússia tenham registrado crescimento abaixo do brasileiro, com 11%, 12% e 17%, respectivamente.

Composição

Ao mesmo tempo em que amplia o volume das reservas, o Banco Central brasileiro tem diversificado a composição delas, o que reduz a exposição do País ao risco cambial.

Em 31 de dezembro de 2009 – dado divulgado mais recentemente -, as reservas eram compostas por 81,9% em dólar norte-americano, 7,0% em euro, 3,7% em libra esterlina, 3,5% em dólar canadense, 1,9% em dólar australiano e 2,0% em outras moedas, tais como iene japonês.

O resultado mostra uma menor exposição ao dólar, já que, em dezembro de 2008, a moeda norte-americana representava 89,1% do total das reservas brasileiras, segundo dados do Relatório de Gestão das Reservas Internacionais, divulgados pelo Banco Central.     

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