Bob Faria: a Phoenix pousou. Saiu do campo e entrou para a história

Bob Faria: a Phoenix pousou. Saiu do campo e entrou para a história

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 09:56

Ronaldo parou. Me surgem duas imagens. Na primeira estou sentado numa escadaria da Toca da Raposa, 1993. Éramos garotos. Eu, um repórter sonhando com a chance de seguir os passos de meus ídolos de profissão; ele, outro garoto dando voltas no campo, sonhando a mesma coisa.

A imagem seguinte é dele de braços abertos, asas de uma Phoenix flamejante colocando abaixo um poderoso esquadrão alemão e em especial seu ás... Oliver Khan. O mundo de novo a seus pés.

Falando em esquadrões alemães e asas flamejantes, me lembro do lendário Barão Vermelho (o aviador, não a banda do Frejat e do Cazuza), abatido por tiro anônimo, vindo sabe-se lá de onde, numa missão secundária durante o ocaso alemão na Primeira Guerra. Seu avião cor de sangue que tanto pavor infringiu aos inimigos desapareceu na sucata do conflito perfurado por uma rajada de balas perdidas que hoje se acredita tenham sido disparadas a esmo e por engano por algum recruta enfiado numa trincheira inglesa.

De repente, o maior piloto da maior força aérea da época, o fenômeno de asas rubras, sucumbiu sem perceber a face de seu carrasco e despencou do céu para a história.

Ronaldo Nazário, o Fenômeno, o maior jogador de futebol de seu tempo, finalmente sucumbiu. Após anos de batalha, cada uma delas registrada na pele sob forma de cicatrizes, e outras aparentemente ainda sangrando na alma, ele deixa os gramados e encerra sua carreira como jogador. Mas, como fenômeno, ouso dizer que ele apenas muda de cenário.

Assim como o temido Barão Vermelho, Ronaldo talvez tenha sido abatido por um Zé Ninguém, uma bala perdida no meio do nada, um Tolima que entrou e sairá da história sem deixar vestígios, exceto pelo fato de precipitar o fim de uma luta muitas vezes solitária em busca da autossuperação, que é a verdadeira batalha dos grandes atletas.     Retorno a 1993. Foram incontáveis entrevistas absolutamente monocórdicas e divertidas. E a cada gol desconcertante, a cada arrancada fulminante, a cada derrota imposta a adversários atônitos, aquela camisa azul se enchia com a matéria prima dos ícones, e aumentava o sorriso desalinhado do garoto que simplesmente encontrou o seu caminho.

Com o tempo vimos seu joelho ser destroçado. Vimos ele caindo e se levantando várias vezes. Uma Phoenix de asas verde-amarelas. Vimos seus dentes chegando no lugar, seus músculos crescendo, sua imagem inundando o planeta... Vimos tudo o que ele fez até o momento mágico em que com um tiro certeiro derrubou a barreira alemã e recolocou o Brasil no topo do mundo.

Nesse momento tudo para. A imagem eterna de Khan batido, como o temido Barão Vermelho no chão, sentindo o peso do talento do Fenômeno brasileiro ofusca tudo o que veio depois. Esse é o retrato daquilo que se tornou Rrrrrrronaldo.

Rrrrronaldo, assim mesmo, com muitos erres, como imortalizou Galvão. Afinal, toda lenda que se preze depende de um bardo genial.

Não vou dizer que o encerramento foi prematuro. Está mais para o contrário. Mas o fato é que Ronaldo sai dos gramados. Ninguém perderá um centavo por apostar na imagem do fenômeno. Livre dos apuros que o corpo pesado lhe infrigia ultimamente, ele está livre para fazer a segunda coisa que melhor aprendeu a fazer na vida. Chamar a atenção para si e agregar valor a tudo que está a sua volta.

A Phoenix pousou. Saiu do campo e entrou definitivamente para a história.      

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