Número 1 do Brasil, Ana Clara supera dificuldades e mira Rio-2016

Número 1 do Brasil, Ana Clara supera dificuldades e mira Rio-2016

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 10:09

A quadra não era a principal. Nem mesmo havia torcida nas arquibancadas. Não importava. De passagem, Ana Clara Duarte fechou os olhos e pisou pela primeira vez no Melbourne Park, complexo que sedia o Australian Open todos os anos. Depois de seis semanas e cinco challengers no país, a tenista carioca, que, em setembro, assumiu o posto de melhor brasileira do ranking da WTA (260ª, devendo subir um pouco mais na próxima lista), só tem uma coisa na cabeça: voltar, mas desta vez com uma vaga no qualifying do Grand Slam, em janeiro de 2011.

Na Austrália, Ana Clara, ou Clarinha, como gosta de ser chamada, conquistou o Challenger de Cairs e foi vice em Alice Springs e Mount Grambiers, onde também foi campeã nas duplas. Chegou às oitavas em Darwin e caiu na primeira rodada em Port Prie. Tudo sozinha. Sem técnico, amigos ou família. As dificuldades, para ela, só aumentam o prazer da conquista.

- Quando saí do Brasil, não sabia o que esperar. Estava me sentindo bem. Mas não conhecia as meninas, não sabia quem estava enfrentando. Quando jogo no Brasil, são as mesmas meninas. Lá fora, não. Não sabia o que esperar. Fui sem expectativa e fiquei insegura. Mas o título logo no primeiro torneio me deu gás para ficar. Tentei manter o máximo de contato com as pessoas no Brasil. Na minha cabeça, tentava ficar sempre presente lá. Mas era complicado. Em vários momentos, queria falar com o técnico e não podia. Só ficava me dizendo: "Tenho que ficar presente aqui e dar o meu melhor. Não posso viver no futuro. Nada vai mudar". Foi a maneira que eu encontrei para focar ali. E os resultados foram consequência. Quando jogamos bem, aparece – disse a tenista, em entrevista por telefone ao GLOBOESPORTE.COM.

Clarinha tem 21 anos. Jogou sua primeira partida aos 5, incentivada pelos pais, professores de tênis. "Nunca me impuseram nada", garante. Também gostava de futebol, judô e jiu-jitsu. Mas foi nas quadras que os resultados começaram a aparecer. E ela foi ficando. Aos 14, embarcou para a Europa pela primeira vez e voltou de lá com uma visão diferente sobre o esporte. Pouco depois, com a certeza de que seu futuro era ligado à raquete, resolveu seguir seu rumo.

- Na Europa, vi mais de perto qual era a realidade. Aos 14 anos, é difícil ter a certeza do que se quer. Mas, com 16 anos, fui para São Paulo. Morei um tempo por lá e fui para os EUA treinar. Já sabia o que eu queria.

Quando voltou, resolveu treinar com o técnico Felipe Reis, em Florianópolis. Tanto tempo sozinha, ela garante, foi importante para amadurecer.

- Isso me ajudou muito na parte da maturidade. Fui responsável desde uma idade muito nova. Foi importante ter morado fora, outra cultura, ter contato com outras pessoas. Tudo isso me trouxe onde estou hoje. Passei por altos e baixos, mas é normal.

Os "altos e baixos" eram dúvidas sobre seu potencial. Clarinha não sabia se poderia chegar longe. Hoje, tem certeza de que pode evoluir.

- Nunca tive nenhum momento em que quis parar, mas tive momentos em que duvidei se um dia seria uma grande tenista. Nunca duvidei o quanto vou ter que trabalhar para isso. Eu gosto muito de treinar. Acho que (ter dúvidas) é normal também, sou nova. Hoje em dia, já nem tanto. É difícil ser forte o tempo todo.

Clarinha reconhece que o caminho para uma tenista no Brasil não é dos mais fáceis. Teve até sorte, ela garante. Este ano foi o seu primeiro sem um patrocínio fixo. Com pouca verba, só conseguiu viajar para a Austrália após a Confederação Brasileira de Tênis (CBT) assumir os custos da passagem. A estadia, no entanto, saiu do próprio bolso.

- Com certeza é complicado. Eu tive a sorte de ter patrocínio a vida toda. Nunca tive que me preocupar com isso. Quando você tem que se preocupar, fica mais difícil ainda. Eu não chegava para a pessoa e perguntava se ela queria me patrocinar, mas estava sempre ligada nisso, fazia projetos. Se a CBT não tivesse bancado as passagens, não teria ido. Foi uma superação. Nas primeiras semanas, troquei de hotel oito vezes. Eram coisas meio doidas, todas para economizar. Mas nada vem fácil.

O Brasil já não tem uma tenista entre as 100 melhores do mundo há anos. A última foi Andrea Vieira, a Dadá, em 1989, quando chegou a ocupar a 76ª colocação. Foi ela também a última a disputar uma chave principal de Grand Slam, no US Open, em 1993. Para Clarinha, o caminho para que o tênis feminino receba tanta atenção quanto o masculino é longo.

- A gente tem que saber que não dá para ter resultado sem investimento. É preciso investir. Mas acho que as coisas começaram a mudar. Começamos a ter mais torneios, algumas jogadoras, poucas ainda, já receberam apoio dos Correios e da CTB. Acho que devemos continuar caminhando para frente. Com uma estrutura melhor, teremos os resultados. Não dá para ter sucesso sem trabalho. Mas parece que está caminhando bem.

Ainda assim, Clarinha está honrada com a nova posição no ranking. Diz que seu objetivo não era "ser a melhor do Brasil", mas que espera poder ir ainda mais longe.

- Eu me sinto muito honrada. Nunca foi meu objetivo principal. Sabia que se tivesse que acontecer, aconteceria. Mas sempre fui muito focada em melhorar e aprender. Eu amo meu país e é muito legal ser a número 1. Espero ter responsabilidade para lidar com isso.

O próximo passo é tentar se garantir no qualifying do Australian Open, no ano que vem. Com a pontuação conquistada no tour na Austrália, Clarinha ainda precisa de 60 pontos para carimbar a vaga. Terá a chance em dois Challengers no Rio de Janeiro, que vão dar 100 pontos no total.

- Minha meta a curto prazo é conseguir pontos para o quali do Australian Open, o que não é fácil. Tenho que ir bem nos dois torneios. Eu estou me sentindo bem na quadra e vou tentar focar nisso. Jogar um Grand Slam seria um sonho se tornando realidade. Quando entrei em quadra em Melbourne, fechei meus olhos e imaginei. O sonho parecia tão perto...

O maior sonho, no entanto, é para o futuro. Clarinha espera conquistar uma vaga para jogar os Jogos Olímpicos de 2016, no Rio. Acostumada a viajar, a volta para casa parece ser o principal objetivo.

- Eu sonho, sonho, sonho... Sou carioca. Se conseguir jogar em 2016, na minha terra, seria muito legal. Seria tudo. Mas tenho que continuar trabalhando. Passo a passo, dia a dia. Também tem o Pan de Guadalajara, no ano que vem. Seria uma experiência muito legal também.

Por: João Gabriel Rodrigues

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