Começa o júri de Lindemberg sobre a morte de Eloá

Começa o júri de Lindemberg sobre a morte de Eloá

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 9:15

Começou por volta 10h50 desta segunda-feira (13) no Fórum de Santo André, no ABC paulista, o julgamento de Lindemberg Alves Fernandes, acusado de matar a ex-namorada Eloá Cristina Pimentel em 2008.. O júri iniciado pela juíza Milena Dias ocorre mais de três anos após um dos sequestros mais longos do país acompanhado ao vivo pela TV, que terminou com a morte da estudante, com 15 anos à época.

Seis homens e uma mulher compõem o júri que irá definir se Lindemberg é culpado ou inocente. O réu estava algemado no início do julgamento. Além da morte de Eloá, o réu responde por duas tentativas de homicídio (contra Nayara Rodrigues da Silva, baleada no rosto, e o sargento da Polícia Militar Atos Antonio Valeriano, que escapou de um tiro); cárcere privado (de Eloá, Victor Lopes de Campos, Iago Vilera de Oliveira e duas vezes de Nayara) e disparo de arma de fogo (foram quatro) praticados entre os dias 13 e 17 de outubro de 2008 dentro do apartamento onde Eloá morava, no segundo andar de um bloco da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) no Jardim Santo André.

O julgamento de Lindemberg estava marcado para iniciar às 9h, mas atrasou devido a ausência de algumas testemunhas. Ele deve durar três dias, segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP). Ao todo, foram arroladas 19 testemunhas para prestarem depoimentos, que poderão ser gravados pela Justiça. Pela lei, as testemunhas que moram fora de Santo André não precisam comparecer. Mais de 180 pessoas deverão assistir ao júri na plateia, entre parentes do réu, familiares das vítimas, público interessado que adquiriu senhas, membros da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), estudantes de direito, magistrados do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) e jornalistas (serão cerca de 50 profissionais). A segurança em torno do fórum será reforçada pela PM para garantir a integridade física das pessoas que participarão do júri. Estão sendo aguardados eventuais protestos do lado de fora do prédio.

Depois será feito o interrogatório de Lindemberg, que está preso preventivamente na Penitenciária de Tremembé, no interior de SP, à espera do júri. Lindemberg deixou a penitenciária pouco antes das 6h30 e chegou ao fórum por volta de 8h10. Ele foi escoltado pela Polícia Militar.

Quando foi preso pela PM, ele nunca falou oficialmente sobre o desfecho do sequestro na delegacia, na reconstituição e na audiência de instrução na Justiça. Terá de comparecer agora ao fórum, mas tem o direito continuar em silêncio se quiser e não responder a nenhuma pergunta.

Sete jurados vão votar secretamente e decidir se o acusado é culpado ou inocente. Em seguida, a juíza Milena Dias, que presidirá o júri, contará os votos e dará a sentença de condenação ou absolvição do réu. Segundo o Ministério Público, responsável pela denúncia, se Lindemberg for condenado por todos os crimes atribuídos a ele, a pena mínima poderá ser de 50 anos e a máxima de 100 anos de reclusão. Pela legislação do país, no entanto, ninguém pode ficar preso a mais de 30 anos.

O caso

De acordo com a promotora Daniela Hashimoto, movido por ciúmes da Eloá porque a ex não queria mais reatar o romance de três anos, o então auxiliar de produção Lindemberg, então com 22 anos, invadiu armado o apartamento da estudante em Santo André disposto a matar por vingança no dia 13 de outubro de 2008. Lá, manteve Eloá e outros três colegas de escola dela como reféns.

Na versão da acusação, Lindemberg ainda atirou em direção ao sargento Atos Antonio Valeriano, o primeiro policial militar que tentou negociar a liberação dos reféns e rendição do sequestrador. Com a chegada do Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) da PM, que assumiu as conversas com o agressor, os alunos Victor Lopes de Campos e Iago Vilera de Oliveira foram libertados por ele.

Nayara Rodrigues da Silva, amiga de Eloá, também chegou a ser solta após negociação entre o Gate e Lindemberg em troca de religar o fornecimento de água e da energia elétrica do apartamento. Mas a adolescente, que estava com 15 anos na época, retornou ao imóvel dias depois por decisão da PM, que atendeu a exigência do sequestrador: ele havia combinado que só iria se entregar e libertar Eloá se Nayara fosse até a porta da residência para que eles saíssem todos juntos. Isso, no entanto, não ocorreu: Lindemberg ordenou que Eloá puxasse Nayara para dentro do apartamento e voltou a manter as amigas como reféns.

Entendendo que não havia mais avanço nas negociações para o fim do sequestro, o Gate decidiu invadir o apartamento no dia 17 de outubro de 2008. Na ação, policiais arrombaram a porta, mas demoraram para entrar porque ela estava bloqueada por um sofá. Além disso, usaram uma escada para tentar entrar por uma janela do segundo andar, mas a ferramenta não tinha alcance para isso.

Durante essa confusão, Lindemberg aproveitou para atirar em direção a cabeça de Eloá e de Nayara, segundo laudo da perícia do Instituto de Criminalística (IC) da Polícia Técnico Científica. Eloá foi atingida por dois disparos e teve morte cerebral confirmada por um hospital onde estava internada no dia 18 de outubro. Alguns de seus órgãos foram doados. Nayara foi baleada no rosto, mas sobreviveu.

A PM, que usou balas de borracha na incursão, fez disparos, mas não atingiu Lindemberg, que depois foi dominado e preso. Em entrevistas na época, alguns oficiais chegaram a afirmar que a invasão do Gate ocorreu porque ele teria escutado um disparo dentro do apartamento que poderia ser do seqüestrador contra as reféns. A versão, no entanto, foi negada depois por outros policiais. Apesar disso, a ação da PM foi bastante criticada à época. Alguns especialistas em segurança afirmaram que qualquer invasão deve ser feita em último caso porque pode colocar a vida dos reféns em risco.

Testemunhas de acusação

Nayara será uma das cinco testemunhas arroladas pela acusação, quatro são vítimas de Lindemberg e outro é parente da vítima. Além da estudante, que atualmente está com 18 anos, prestarão depoimento os dois colegas dela que foram feitos reféns, o policial militar que escapou de um tiro e o irmão mais velho de Eloá, Ronickson Pimentel dos Santos, que era amigo do agressor. (confira a lista completa de testemunhas abaixo).

Para a promotora Daniela, o irmão de Eloá é peça-chave na construção do perfil do acusado por ter presenciado a sua agressividade. "Foram momentos antes da invasão da casa de Eloá e momentos durante a invasão, quando ele [Ronickson] tentava conversar por telefone com o réu", disse ela.

A tese com a qual a Promotoria deve trabalhar é a de que Lindemberg é um homem possessivo, violento e que invadiu o apartamento da ex-namorada decidido a matá-la. "Toda a história começou há 30 dias [da data do início do crime], quando ele já estava ameaçando [...]. Ia rondar a escola [em que Eloá estudava]. Há 15 dias [do crime ele] abordou Eloá, a agrediu fisicamente, sempre com essa intenção", disse a promotora.

Segundo o advogado José Beraldo, que defende os interesses da família de Eloá, e é assistente da acusação, Lindemberg mencionou várias vezes a intenção de matar as vítimas em gravações em áudio da negociação entre ele e os policiais enquanto mantinha os reféns em cativeiro.

As imagens com o som dessas conversas deverão ser mostradas aos jurados e a platéia, por meio de um telão, Além disso, também serão exibidas parte das mais de seis horas de gravações de programas jornalísticos sobre o caso. Em alguns deles, o sequestrador chegou a dar entrevista por telefone depois que repórteres e apresentadores ligaram para o apartamento onde ele estava com as vítimas, ocupando a única linha usada para a PM negociar com Lindemberg.

Testemunhas de defesa

A defesa indicou 14 testemunhas, incluindo seis jornalistas que cobriram o caso – alguns deles conversaram por telefone com Lindemberg-, um advogado que o defendeu inicialmente durante o sequestro, dois policiais militares que participaram da negociação e invasão, um delegado que investigou os crimes, três peritos do IC que fizeram laudos técnicos sobre a autoria dos disparos e um perito em fonética independente que analisou um vídeo da incursão policial.

A advogada Ana Lúcia Assad, que defende os interesses de Lindemberg, não foi localizada pelo G1 para comentar o que seu cliente dirá para se defender das acusações ou se falará algo. Ela entrou com um recurso de "desaforamento" no TJ-SP para pedir que o julgamento ocorra no Fórum da Barra Funda, em São Paulo, e não em Santo André. Segundo o documento, ela coloca dúvidas sobre a isenção dos jurados do ABC. A liminar do pedido foi negada. Ainda resta o julgamento do mérito. Como não teme uma reviravolta dessa decisão, a juíza Milena Dias manteve o júri em Santo André.

Apesar da versão da defesa de Lindemberg nunca ter sido anunciada, uma das prováveis linhas de atuação dos advogados do réu deve ser a de que a entrada da PM no apartamento provocaram a morte de Eloá. Além disso, existe a possibilidade de os advogados criticarem a cobertura da imprensa que poderia ter influenciado o desfecho trágico do caso.

Lindemberg também nunca falou oficialmente após o crime. A única declaração que deu após ser detido foi a pessoas não identificadas, que gravaram um vídeo dele em frente a uma cela. As imagens nas quais ele admite ter atirado em Eloá foram divulgadas por uma emissora de TV, mas não serão usadas no júri porque não foram incluídas no processo. Portanto não servem como prova.

Pai de Eloá

Durante o sequestro de Eloá, ocorreu uma situação que parece roteiro de filme. O pai da adolescente chegou a passar ao saber que a filha era mantida refém de Lindemberg no apartamento da família em Santo André. Imagens da TV mostraram ele entrar numa ambulância. Posteriormente, a Polícia Civil de Alagoas viu as cenas e identificou o homem como Everaldo Ferreira dos Santos, um ex-cabo da PM de Maceió, procurado desde 1993 pela polícia alagoana sob a suspeita de integrar um grupo de extermínio no Nordeste que cometia assassinatos por encomenda.

Como soube que foi identificado e já tinha mandados de prisão em seu nome, o ex-cabo sequer compareceu ao enterro de Eloá, em Santo André, porque temia ser detido. Everaldo usava um nome falso no estado de SP, onde vivia escondido. Em novembro de 2009, ele foi condenado, mesmo à revelia, a mais de 30 anos de reclusão pelo assassinato do delegado Ricardo Lessa, irmão do ex-governador de Alagoas Ronaldo Lessa, e do motorista do policial em 1991. Um mês depois, em dezembro daquele ano, Everaldo foi preso em Maceió.

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