Diretor da CPTM sabia de acordo de empresas e Siemens, diz testemunha

Diretor da CPTM sabia de acordo de empresas e Siemens, diz testemunha

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 09:04
Diretor da CPTM sabia de acordo de empresas e Siemens, diz testemunhaO Ministério Público Estadual (MPE) ouviu nesta terça-feira (19), pela primeira vez, a testemunha que deu origem à investigação sobre formação de cartel para a compra e a manutenção de trens em São Paulo.
 
Identificado como Sr. "A", a testemunha diz que o resultado de licitação vencida pela Siemens foi antecipado por um diretor da CPTM e que a reunião do cartel de empresas que definiu o processo foi realizado no escritório de uma consultoria, conforme revelou o Jornal Nacional a partir de acesso exclusivo ao depoimento da testemunha.
 
As irregularidades investigadas pelo MPE e pela Justiça Federal ocorreram entre 1998 e 2008, nos governos de Mário Covas, Geraldo Alckmin e José Serra, todos do PSDB
 
A testemunha ouvida pelo MPE contou detalhes sobre os acordos para a licitação dos trens das séries S2100 e S3000. Segundo a testemunha, o edital da concorrência já estava em vigor quando houve uma reunião com representantes de todos os concorrentes, na sede da empresa Alstom.  Na ocasião, já estava acertado como seria a divisão dos projetos.
 
"A Siemens apresentou uma proposta para a manutenção da série S2000, para posteriormente vencer o projeto S3000", relata Sr. "A". A testemunha disse ainda que o então diretor de operações da CPTM, João Roberto Zaniboni, o chamou à sede da empresa, para assegurar que a Siemens seria a vencedora do projeto S3000. Isso, algumas semanas antes da entrega da proposta.
 
No depoimento,  o Sr. "A" diz ainda que uma terceira reunião acertou o resultado. Ela teria acontecido na sede da consultoria de Arthur Teixeira, que se dizia representante da CPTM, e é investigado na suíça por lavagem de dinheiro.
 
Além da Siemens, teriam participado da reunião executivos de  outras cinco empresas.  Ele diz que nesse encontro foram decididos "os preços a serem apresentados, sendo que a proposta vencedora deveria ser um pouco abaixo do valor de orçamento, e a proposta de cobertura um pouco acima do preço daquele que venceria". O combinado nas reuniões  foi o que ocorreu ao final da licitação.
 
Em nota, a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos diz que colabora com as investigações e que o governo do estado é o maior interessado em esclarecer as denúncias para garantir o ressarcimento aos cofres públicos. O então diretor da CPTM, João Roberto Zaniboni, nega veementemente as acusações e diz que não soube, não incentivou nem participou de qualquer acordo.
 
A Alstom afirma que está colaborando com as investigações e nega que tenha havido combinações de preços. A Siemens diz que sempre colaborou com as investigações, que, inclusive, tem como fonte a denúncia da própria empresa. O PSDB, também em nota, reafirmou que espera apuração do caso e punição rigorosa dos culpados.  Arthur Texeira, dono da consultoria onde teria havido a reunião que acertou o resultado, não respondeu às mensagens deixadas pela nossa equipe.
 
Bloqueio de bens
A Justiça Federal de São Paulo determinou na quinta-feira (7) o bloqueio de bens de cinco pessoas e três empresas investigadas em inquéritos que apuram supostos pagamentos de propina durante licitações do Metrô de São Paulo e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). As investigações são relativas às denúncias envolvendo a empresa francesa Alstom e a alemã Siemens, de acordo com a Justiça Federal.
 
O inquérito apura crimes de corrupção, evasão de divisas e lavagem de dinheiro. Foram bloqueados pela Justiça, a pedido da Polícia Federal, cerca de R$ 60 milhões disponíveis em contas bancárias, títulos de investimento e ações.
Entre as cinco pessoas com bens bloqueados, três são ex-diretores da CPTM. Das três empresas, duas são suspeitas de terem sido utilizadas para a prática dos crimes. Os nomes não foram divulgados. A PF fez o pedido de bloqueio após tomar conhecimento do pedido de cooperação internacional encaminhado pelas autoridades suíças.
 
Uma das investigações feita pelo Ministério Público Federal envolve a Siemens e seria sobre a formação de um cartel para combinar preços de concorrências públicas e dividir as obras entre as empresas. A outra é relativa à empresa francesa Alstom, que, para ganhar contratos, teria pago propina a funcionários públicos. Apesar de independentes, as duas investigações cobrem o mesmo período: de 1998 a 2008.
 
O Ministério Público Federal investiga negociações suspeitas ocorridas entre a Alstom e o governo paulista, sobretudo a partir de 1998, quando o estado era governado por Mário Covas, do PSDB. O primeiro resultado das investigações foi o indiciamento de 11 pessoas investigadas, inclusive secretários de estado à época.
 
O pagamento de propina teria ocorrido para viabilizar um contrato entre a empresa francesa e a então estatal de energia do estado, a EPTE. De acordo com o inquérito da Polícia Federal, a irregularidade ocorreu porque a companhia de energia obteve um crédito no exterior, junto ao banco francês Société Générale, de R$ 72,7 milhões, para adquirir equipamentos do grupo Alstom.
 
A Polícia Federal ressalta que a contratação do crédito milionário foi feita sem licitação. E só foi possível porque a Alstom idealizou um esquema de pagamento de suborno para funcionários públicos paulistas, para recompensá-los pela aprovação do contrato.
 
De acordo com a PF, o esquema de pagamento usava pessoas com empresas no exterior que recebiam recursos do grupo Alstom "para depois repassá-los aos beneficiários finais, servidores públicos do governo do Estado de São Paulo, no primeiro semestre de 1998".
 
Ressarcimento
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), afirmou nesta quinta-feira (7) que determinou que o procurador-geral do Estado de São Paulo avalie a inclusão de novas empresas no processo que pede o ressarcimento de prejuízos aos cofres públicos com a formação de cartel em contratos do Metrô e CPTM.
 
"Nós entramos primeiro contra a Siemens porque ela fez a delação, portanto ela é ré confessa, e os demais negam", afirmou. "Já pedi ao procurador geral que verifique, se puder já incluir na inicial, será incluso", disse.
 
De acordo com reportagem do jornal "Folha de S. Paulo", juíza Celina Kiyomi Toyoshima, da 4ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, pediu a inclusão de novos nomes, já que a prática de cartel pressupõe a associação entre empresas.
 
Alckmin havia anunciado em julho que iria exigir o ressarcimento das eventuais perdas sofridas pelos cofres públicos na formação de um cartel nas licitações para a aquisição de equipamentos e serviços ferroviários em São Paulo.
 
Depoimentos para a CPI
Também nesta quinta-feira, o presidente da Alstom Brasil, Marcos Costa, deixou a Câmara de São Paulo sem prestar depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Transportes. O advogado da empresa, Pedro Estevam Serrano, afirmou que Costa se sentiu mal e por isso não participou da sessão iniciada às 10h.
 
O advogado da empresa afirmou que trará seu cliente para prestar depoimento em 28 de novembro, nova data marcada pela comissão. A Alstom foi convocada para falar aos vereadores em outubro, mas a empresa Alstom obteve liminar na Justiça para deixar de comparecer à CPI. A Câmara recorreu e conseguiu suspender a liminar.
 
Apesar de os contratos serem com empresas do governo do estado, a CPI dos Transportes da Câmara tem alegado que a Prefeitura é afetada já que o preço da tarifa do transporte é decidido conjuntamente.
 
O presidente Siemens no Brasil, Paulo Ricardo Stark, esteve na CPI em 10 de outubro e disse que a empresa quer saber o valor do dano causado por suposto cartel em licitações do Metrô e da CPTM aos cofres públicos. Segundo Stark, a empresa tem interesse em "discutir o dano causado" pela companhia e "um eventual acordo".

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