Em dois anos, CNJ contabiliza 122 adoções de crianças no Brasil

Em dois anos, CNJ contabiliza 122 adoções de crianças no Brasil

Fonte: Atualizado: sábado, 29 de março de 2014 às 03:25

Foram seis anos de espera para trazer Antônio [na foto com as irmãs], hoje com 3 anos, para sua nova família. O casal Eliana e Flávio já tinha três filhas biológicas quando decidiu entrar na fila da adoção. E a espera foi tão longa que quase os fez desistir.

No caso de Reginalva e Ilson, o tempo na fila da adoção foi de apenas 11 meses. Isso porque, por iniciativa própria, eles optaram por se cadastrar em comarcas de diferentes estados, ao mesmo tempo. Eles estavam casados há cinco anos quando descobriram que não poderiam engravidar. A decisão de adotar uma criança foi tomada em 2006. Tiago, hoje com 4 anos, foi adotado com 2 anos e 5 meses.

Histórias como as de Eliana e Flávio, e Reginalva e Ilson se repetem pelo país. A demora nos processos de adoção não é novidade, e isso apesar da grande quantidade de pais pretendentes. Atualmente, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), são mais de 27 mil pretendentes à adoção e 4,7 mil crianças e adolescentes cadastrados em todo o país.

Para tentar agilizar os processos de adoção, foi lançado, em 29 de abril de 2008, há exatos dois anos, o Cadastro Nacional de Adoção. O mecanismo, mantido pela Corregedoria Nacional de Justiça, unifica processos de adoção que correm em todos os estados. Apesar do Cadastro, desde sua criação foram adotadas apenas 122 crianças e adolescentes, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) - o órgão afirma que não há dados de antes da criação do Cadastro, porque não havia centralização desses processos.

Os números nacionais, no entanto, são divergentes dos estaduais. E os dados não refletem necessariamente a agilidade nos processos de adoção a partir do Cadastro. Em São Paulo, o Tribunal de Justiça registrou, em 2009, 4.253 adoções, sendo 100 por estrangeiros e 4.153 por brasileiros. Já em 2007, por exemplo, quando ainda não existia o Cadastro Nacional, foram 4.497 adoções, sendo 101 por estrangeiros e 4.396 por brasileiros.

"Há, de fato, essa disparidade entre os dados nacionais e estaduais porque muitos estados ainda não alimentam os dados no Cadastro Nacional. Embora haja a recomendação para que a atualização seja diária, há comarcas que, por dificuldades técnicas, não fazem essa atualização prontamente. Ainda assim, nacionalmente, posso afirmar que o número de adoções aumentou depois do Cadastro", diz ao G1 o juiz Nicolau Lupianhes, da Corregedoria Nacional de Justiça.

Espera e ansiedade

"Sempre tive vontade de adotar uma criança. Quando minha filha caçula fez 4 anos, eu e meu marido fizemos o cadastro de adoção. Seis anos depois, em 2007, quando achei que não seria mais possível, recebi a ligação de que poderíamos adotar uma criança, de 7 meses. Foi um presente. A espera pelo nosso tesouro valeu a pena", diz a professora Eliana Fernandes Bonívio.

Eliane tinha 35 anos quando entrou na fila. Hoje, com 44, ela conta que a espera acaba desestimulando casais que querem adotar. "Durante os anos na fila, eu procurava pela psicóloga e pela assistente social e as respostas eram sempre que bebês demoram mais, e que a Justiça tenta de tudo para devolver as crianças a sua família biológica, antes de colocá-las para adoção. Apesar dessas justificativas, meu filho chegou ao abrigo com seis dias, e saiu de lá só com 7 meses. Ele poderia já estar em casa durante esse tempo, com a nossa família."

O juiz Lupianhes confirma a preferência da Justiça por reinserir as crianças em suas famílias naturais. "A prioridade é reintegrar a criança em sua família natural ou na família extensa, ou seja, com parentes. A adoção é uma exceção. Trabalhamos sempre para manter essa criança perto de sua família. Quando não é possível, por qualquer motivo relevante, aí sim ocorre a adoção", afirma.

Desde que se casou, Reginalva Aparecida Bolsoni Valente, 44 anos, escrevente-chefe do Tribunal de Justiça de São Paulo, tentava engravidar. "Fiz tratamentos durante cinco anos, fertilização, mas não engravidei. Meus exames apontam uma situação normal, mas não aconteceu. Como já não era nova, fiz um último tratamento no fim de 2005 e no início de 2006 fizemos nosso cadastro."

Filho de Reginalva e Ilson, o pequeno Tiago é negro e, segundo a mãe, a idade mais avançada e a não restrição quanto à etnia da criança agilizaram a adoção. "Havia muitos casais na minha frente, mas eles faziam questão de bebês recém-nascidos e brancos. Eu também tinha restrições, mas quando eu e meu marido conhecemos nosso filho, nos apaixonamos por ele. Decidimos esperar que ele estivesse disponível para adoção, o que levou mais dois meses, e adotamos", diz Reginalva.

A possibilidade de uma longa espera para realizar o sonho de ser mãe fez com que Reginalva se cadastrasse, entre outras, na comarca do Paraná. E foi de lá que, dois anos depois de adotar Tiago, veio o chamado para a segunda filha, Laís. "Mesmo depois que adotamos o Tiago, continuamos cadastrados. Em nosso registro ainda constava o interesse por um recém-nascido, mas me ligaram para saber se eu queria uma menina de 2 anos e 9 meses, que já estava liberada. Nós fomos até o Paraná, passamos três dias com ela, e adotamos. Estamos com a guarda dela desde 4 de fevereiro."

Hoje, ainda de licença-maternidade, ela comemora a adoção de sua segunda filha. "A burocracia da adoção atrapalha. E é uma ansiedade muito grande. Pensei em desistir várias vezes porque visitávamos abrigos, víamos as crianças, estávamos dispostos a adotá-las e não podíamos. Cheguei a me interessar por um menino de 10 anos, mas ele não estava apto para adoção por complicações familiares. Depois de 3 anos, ele ainda não foi liberado para adoção", afirma Reginalva.

Para Nicolau Lupianhes, parte da demora nos processos de adoção se dá, justamente, devido às restrições de pais pretendentes. "Infelizmente, ainda temos uma cultura de se buscar o recém-nascido, branco, do sexo feminino, sem necessidades especiais", diz o juiz.

Outro fator que contribui para a demora nas adoções, segundo Lupianhes, é a falta de estrutura para concluir os processos. "Acho que a dificuldade é a ausência de equipes interdisciplinares nas varas de infância, principalmente no interior do país. Não há psicólogos ou assistentes sociais suficientes. Tudo isso atrasa e dificulta um pouco a conclusão dos processos."

Por: Nathália Duarte

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