Ao longo dos últimos meses, o governo de São Paulo retirou mais água do Sistema Cantareira do que o permitido pelas agências reguladoras. A informação está na ação civil pública movida pelos Ministérios Públicos estadual e Federal. Até ontem, 35 municípios paulistas haviam decretado racionamento de água, medida que já atinge 3,8 milhões de pessoas.
Em documento de 2004, a Agência Nacional das Águas (ANA) e o Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE) estipularam que a captação de água do Cantareira deveria seguir uma regra chamada curva de aversão a risco, segundo os promotores. Essa curva funciona como uma tabela que estabelece que a quantidade de água retirada da represa deve reduzir proporcionalmente à medida que o nível do reservatório fica mais baixo.
Em janeiro de 2014, a curva previa retirada de até 29 metros cúbicos por segundo do sistema, pois os níveis variaram de 27,2% a 22,2% ao longo do mês. Em vez disso, a vazão foi de 32,2 metros cúbicos por segundo. Fazer captação acima do previsto na tabela pode comprometer o armazenamento de água para meses seguintes, segundo especialistas.
— Isso certamente ajudou a chegarmos a essa situação. Se a própria legislação da ANA tivesse sido seguida, a situação estaria em um nível muito menos severo do que o que temos hoje — afirma a promotora Alexandra Facciolli, do Grupo de Ação Especial de Meio Ambiente do Ministério Público de Piracicaba.
Na ação, promotores e procuradores alegam que a Sabesp sabia que o Cantareira corria risco de entrar em colapso antes da estiagem que começou no verão de 2014, mas não tomou medidas para proteger as represas. O MP pede a proibição da captação integral da segunda cota do volume morto do manancial, uma reserva de água que fica abaixo dos túneis e canos.
Como a primeira parte do volume morto está prestes a acabar, a Sabesp trabalha com a possibilidade de usar uma segunda reserva. A companhia tem dito que não será necessário tirar mais água, uma vez que estudos meteorológicos mostram que voltará a chover a partir da segunda quinzena de outubro.
Em depoimento a vereadores na Câmara de São Paulo, a presidente da Sabesp, Dilma Pena, descartou ontem que parte do estado enfrente rodízio. Questionada se havia um racionamento disfarçado ocorrendo na capital paulista, onde muitos moradores reclamam que não recebem água à noite, a presidente da Sabesp respondeu que o que existe é “uma administração da disponibilidade da água”. O governo tem diminuído a pressão na rede de distribuição, o que faz com que algumas casas não recebam água por alguns períodos.
Levantamento feito pelo GLOBO mostra que 35 cidades do estado já decretaram algum tipo de racionamento oficial. Em Itu, onde a falta d’água já provocou três protestos e moradores reclamam que estão há quatro meses sem abastecimento regular, a água vem de outro manancial.
A crise hídrica tem mudado drasticamente a paisagem de cidades do interior onde as represas foram construídas. Em Bragança Paulista, donos de pousadas que ficavam à beira da represa temem que a procura diminua no verão:
— Geralmente, o fim do ano é a melhor época para a pousada, mas, este ano, estamos tendo menos procura. Acho que a visão assusta um pouco. Antes, a água chegava na beira da casa, agora só tem barro aqui perto — disse Amélia Rosetto, responsável por uma pousada à beira da Represa Jaguari.
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