Com quase três anos de vigência na capital paulista, a Lei Cidade Limpa, que restringe a publicidade na paisagem urbana, conseguiu acabar com os outdoors na cidade, mas ainda luta contra faixas, cartazes e lambe-lambes irregulares.
Apesar de fazer um trabalho de recolhimento das faixas, a prefeitura consegue aplicar poucas multas, o que faz com que as pessoas insistam na colocação dos objetos. Na região da Subprefeitura da Vila Mariana, por exemplo - uma das áreas que mais apreende materiais irregulares - foram recolhidas 15.633 materiais, entre faixas, placas e outros, de janeiro a agosto deste ano e apenas 13 multas foram aplicadas, menos de 1% da quantidade de materiais recolhidos. Na área da Subprefeitura de Pinheiros foram 5.728 itens recolhidos e apenas 64 multas aplicadas.
No total, na cidade, foram aplicadas 3.152 multas referentes ao Cidade Limpa, segundo dados da Secretaria de Subprefeituras, desde que a lei entrou em vigor, em janeiro de 2007 até o mês de agosto deste ano. O número representa pouco mais de 20% das faixas apreendidas só neste ano por uma das 31 subprefeituras da cidade, a da Vila Mariana.
A multa para quem desrespeita a lei é de R$ 10 mil até quatro metros quadrados de anúncio e mais R$ 1 mil a cada metro excedente. As penalidades podem ser aplicadas por diversos tipos de irregulares como anúncios indicativos de fachadas e não só faixas e placas apreendidas. Em geral, cada placa ou faixa é uma multa, mas, no caso de serem encontrados vários itens numa mesma área, pode ser aplicada apenas uma multa. A prefeitura não tem um levantamento da quantidade de materiais apreendidos em todas as 31 subprefeituras.
Os comerciantes que contratam esse tipo de anúncio parecem avaliar que vale a pena correr o risco da multa. A proprietária de um serviço de acarajé de entrega em domicílio, que não quis se identificar, disse em entrevista por telefone ao G1 que fez faixas para poder vender seu produto e deixou de anunciar há alguns meses, pois já formou uma clientela suficiente. "Tem tanta coisa irregular nesse país e ninguém faz nada. Trabalhar para sustentar a família não é crime", afirmou ela, que contou que antes trabalhava em outra área e foi prejudicada com a lei. "Essa lei é um abuso de poder. Não tenho medo de multa e se precisar vou voltar a colocar faixas", garantiu. O G1 tentou falar com outros anunciantes, mas eles não quiseram se pronunciar ao serem informados que se tratava de uma reportagem.
O secretário de Subprefeituras, Andrea Matarazzo, reconhece a dificuldade em multar os irregulares e diz que a população deveria ajudar não contratando esses serviços. "Algumas [faixas, placas] podem até ser armadilha para um assalto", diz o secretário. Segundo ele, esses comerciantes costumam mudar de endereço e número de telefone com frequência para não serem encontrados. Matarazzo acredita que uma forma de combater a clandestinidade é continuar recolhendo os materiais e tentando identificar a origem.
De acordo com os subprefeitos, em muitos casos é difícil multar porque os anunciantes informam apenas números de telefones celulares nas faixas e não colocam endereço. O subprefeito de Pinheiros, Nevoral Bucheroni, já chegou a marcar horário, sem se identificar, com um homem que anunciava ser pai de santo para conseguir multá-lo. "Eu criei uma historinha, disse que estava com problemas pessoais, me sentindo deprimido e fiz uma voz de uma pessoa sofrida", contou o subprefeito que no dia da consulta, em maio deste ano, foi até o local juntamente com uma equipe de fiscalização e multou o pai de santo em R$ 400 mil por 40 faixas irregulares.
Bucheroni diz que liga para vários serviços anunciados. Recentemente tentou usar a tática com uma pessoa que colocou placa de venda de milhagem, mas, desconfiado, o anunciante não quis informar seu endereço e insistiu num contato via e-mail. O subprefeito pensa em acionar a polícia para ajudar na identificação dos infratores. A subprefeitura possui duas equipes, uma de dia e outra de noite, para recolher faixas irregulares. "A gente tira de dia e eles colocam à noite, de madrugada", diz o subprefeito, que está pensando até em pôr uma equipe para trabalhar de madrugada.
Na Subprefeitura da Vila Mariana, há uma equipe que faz um trabalho de inteligência para agendar serviços com as pessoas que fazem anúncio irregular na tentativa de multar essas pessoas. "É uma luta constante, permanente, mas nos casos que nós tentamos eles são muito treinados, muito ariscos com a questão de fornecer endereço", diz o subprefeito Maurício Pinterich. Por causa da grande quantidade de faixas na região, a subprefeitura conta com um veículo intitulado caça-faixa que circula nas ruas só para recolher esse tipo de material irregular.
Até a idealizadora da lei, Regina Monteiro, já tentou flagrar um anunciante irregular usando da tática de marcar horário. Ela telefonou na sexta-feira, 28 de agosto, para uma pessoa que promete solucionar problemas amorosos e marcou horário para a tarde do mesmo dia. Uma equipe de fiscalização foi no local, mas não conseguiu multar a anunciante. "Acho que não respeitar a lei é uma questão cultural. Algumas pessoas vão burlar sempre porque estão acostumadas a fazer isso", afirmou. Para Regina, uma forma de combater os irregulares é continuar retirando as faixas e conseguir multá-los até que chegue um ponto que não seja mais viável economicamente eles continuarem a colocar anúncios clandestinos.
Mudança de ideia
Após chegar a entrar com ação na Justiça contra a Lei Cidade Limpa logo após ela entrar em vigor, a Associação Comercial de São Paulo hoje diz que mudou de ideia e avalia a iniciativa como algo positivo para a cidade. "Hoje damos a mão à palmatória. A lei cumpriu a finalidade e criou uma cidade mais limpa, mostrou fachadas de prédios bonitos que não conhecíamos", afirmou o vice-presidente da associação, Roberto Mateus Ordine.
Segundo ele, o comércio só sofreu prejuízos no início principalmente por causa dos custos da readequação das fachadas, mas depois dos seis primeiros meses a situação se normalizou.
Já as empresas de publicidade reclamam dos efeitos da lei até hoje. Segundo o Sindicato das Empresas de Publicidade Exterior do Estado de São Paulo (Sepex), muitas empresas fecharam as portas, outras mudaram de ramos e a maioria diminuiu. "A minha empresa, por exemplo, antes tinha 330 funcionários e agora tem 55. Atualmente, faturamos 10% do que era antes", diz o diretor financeiro da entidade, Luiz Roberto Valente. Ele calcula que cerca de 20% das 50 empresas que eram filiadas ao sindicato, na capital, fecharam as portas. O sindicato defende uma flexibilização da lei para que anúncios de mídia exterior fossem aceitos, seguindo regras de padronização.
Sua avaliação é importante para entregarmos a melhor notícia
O Guiame utiliza cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência acordo com a nossa Politica de privacidade e, ao continuar navegando você concorda com essas condições