“Embrulhamos a rapaziada”: transcrições da frieza de bandidos em chacina de 2011

“Embrulhamos a rapaziada”: transcrições da frieza de bandidos em chacina de 2011

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 09:10

Mario Hugo Monken

Interceptações telefônicas feitas pela Polícia Civil do Rio de Janeiro flagraram conversas entre traficantes da Vila Kennedy, na zona oeste da capital, no momento em que um deles cometeria uma chacina contra três traficantes rivais da vizinha comunidade da Vila Aliança. O crime ocorreu em agosto do ano passado.

Trechos das escutas, a que o iG teve acesso junto à 42ª Vara Criminal da Capital do Tribunal de Justiça do Rio, mostram o traficante Elisandro da Costa França, o Xerém, falando com um comparsa não identificado sobre o crime, que foi cometido no dia 23 de agosto de 2011. Na época, ocorria uma guerra entre as duas quadrilhas.

Naquele dia, Thiago Gregório da Silva, o Cocão, foi morto primeiro. Depois, os criminosos executaram Raian Vieira dos Santos, o De Marimba, Felipe Luiz Santiago e Alexandre Silva, o Cabeção, todos vinculados à facção criminosa Terceiro Comando Puro (TCP), rival do Comando Vermelho (CV), que domina a Vila Kennedy.

“É isso aí, sem saudades”

Em um dos trechos das escutas, Xerém fala para o comparsa que já havia matado um e estava com outros três para serem mortos. Os bandidos usam a palavra subir para se referir às mortes.

Traficante – E aí, quem subiu?

Xerém – Quem subiu foi o Cocão. Nós estamos com mais três aqui para subir

Traficante – É isso aí, sem saudades

Xerém – Sem saudades mesmo, parceiro

Em outro trecho, os mesmos bandidos fizeram ameaças aos moradores.

Xerém – Nós avisamos até para os moradores que estão de beijinho, recadinho, que se nós pegarmos vai ser sem saudades parceiro.

Traficante – O negócio é embrulhar

Minutos depois, os criminosos comentam sobre a conclusão da matança. Um deles usa o código “embrulhamos” para se referir à consumação do crime.

Traficante – Fala parceiro

Xerém – Tudo concluído, parceiro. Estamos voltando. Já embrulhamos a rapaziada. Vamos para a pista

O iG conversou com um dos policiais que participaram da investigação. Ele informou que a chacina ocorreu de madrugada e os agentes só ouviram os trechos que falam da matança depois, por isso não puderam impedir os crimes.

O inspetor informou já ter pedido à Justiça para que inclua também o crime de homicídio no processo. Os réus só respondem por tráfico de drogas, associação para o tráfico e corrupção de menores.

Envio de drogas para presídio

A interceptação telefônica fez parte de um inquérito que investigou a atuação do CV nas comunidades da Vila Kennedy e também em Manguinhos, na zona norte. Ao todo, 12 suspeitos foram denunciados ao Ministério Público Estadual e tiveram a prisão preventiva decretada em junho.

Os policiais descobriram durante as investigações, por exemplo, que os bandidos remetiam drogas para dentro de presídios do Complexo Penitenciário de Bangu, na zona oeste. Em uma das escutas, por exemplo, no dia 1 de agosto de 2011, um criminoso conhecido como Russinho, que estava em Bangu 5, pediu ao traficante Toinho, que estava em liberdade, o envio de “açúcar” (cocaína) para a cadeia.

Controle de conjuntos do PAC

As investigações confirmaram também um suposto domínio exercido pelos traficantes em dois conjuntos habitacionais construídos pelo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) no bairro de Manguinhos, fato que já havia sido apontado em outros inquéritos.

Segundo os autos, os traficantes tomaram os apartamentos dos conjuntos CCPL e Embratel , vendiam e dividiam os lucros entre eles.

De acordo com o inquérito, alguns traficantes ou parentes dos mesmos moravam nos conjuntos, como a mulher do bandido Marcelo da Silva Soares, o Macarrão, e os traficantes Eder Carlos Mendonça da Silva, o Gordinho da favela de Antares (zona oeste), e Marcelo Fernandes Pinheiro Veiga, o Marcelo Piloto.

“Caixinha” do CV

As investigações confirmaram ainda a continuidade da “caixinha” da facção criminosa, que é citada nos autos como “fundo de reserva para custear viagens de advogados para presídios federais, compra de armas e munições e pagamento de ajuda de custo a familiares de traficantes mortos ou presos”.

Segundo os autos, a contribuição ocorre mensalmente e varia conforme a rentabilidade da favela e, para administrar o dinheiro, o traficante precisa ter a confiança dos chefões do grupo. Na época das investigações, o responsável pela “caixinha” era Leonardo Farinazo Pampuri, o Léo Barrão, atualmente preso.

Uma das interceptações, feita no dia 22 de agosto do ano passado, Léo Barrão pediu uma contribuição de R$ 6.000 ao traficante Gordinho de Antares.

“Cada favela fortalece com que tem condições”, disse Barrão.

 

 


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