Excesso de veículos contribui para poluições sonora e atmosférica em SP

Excesso de veículos contribui para poluições sonora e atmosférica em SP

Fonte: Atualizado: sábado, 29 de março de 2014 às 3:29

Com 6,5 milhões de veículos, a frota de São Paulo traz para a cidade não só complicações para o trânsito, famoso por seus enormes congestionamentos. A saúde da população também é afetada pela fumaça despejada nos ares todos os dias pelos escapamentos e pelo barulho gerado por carros, ônibus, motos e caminhões. As poluições sonora e atmosférica se tornaram um ônus importante para os moradores da maior cidade do país.

Segundo o relatório mais recente da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), com dados de 2008, a frota de veículos é responsável na Grande São Paulo por 98% das emissões de monóxido de carbono (CO), 97% de hidrocarbonetos (HC), 9% de óxido de nitrogênio (NOx), 40% de material particulado e 33% de óxido de enxofre (SOx). Todos são materiais que poluem o meio ambiente.

Em números concretos, essas emissões correspondem a 1,56 milhões de toneladas de CO jogadas por ano na atmosfera; 387 mil toneladas por ano de HC; 367 mil toneladas por ano de NOx; 62,3 mil toneladas por ano de material particulado e 25,5 mil toneladas por ano de SOx.

Apesar disso, a Cetesb afirma que a emissão de poluentes diminuiu em relação há dez anos, e está estável há cerca de quatro. "Apesar da frota ter aumentado, os níveis de poluição diminuíram. Ainda temos o que avançar, e ainda há dias em que os valores dos poluentes ultrapassam o padrão" , explica Maria Helena Martins, gerente da Divisão de Qualidade do Ar da Cetesb.

"Já tivemos um grande ganho tecnológico, mas agora a solução é mais complexa, não só de medidas governamentais, mas de conscientização das pessoas, com a manutenção dos carros e o uso de transporte público", diz ela.

Quem tem doenças respiratórias de origem alérgica, como asma brônquica e rinite, sofre ainda mais com a poluição nos dias secos e frios, típicos do inverno. "Esses três fatores - poluição, ar seco e ar frio - crescem de uma maneira exponencial seu efeito quando combinados. Eles são a trinca maldita para o aparelho respiratório", explica o pneumologista Clystenes Odyr Soares Silva, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Segundo o médico, cerca de 10% da população da capital paulista sofre com essas doenças.  

Frota cada vez maior

Números do Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo (Detran) mostram que a frota de veículos cresce a cada mês na capital paulista. Em junho, eram 6,55 milhões que circulavam na capital paulista, contra 6,52 milhões em maio. A cidade tinha 6,1 milhões de veículos em junho de 2008 e só foi registrada interrupção no aumento gradativo da frota em setembro do ano passado, mês que marcou o agravamento da crise econômica mundial.

O médico e pesquisador Paulo Saldiva, coordenador do Laboratório de Poluição Atmosférica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, acredita que o governo deveria ter adotado uma postura diferente em meio à crise, o que poderia ter contribuído para a redução dos poluentes. "Quando o [Barack] Obama apoiou as montadoras, ele exigiu em troco mais eficiência dos carros e menor emissão. Aqui, a gente reduziu IPI, está financiando caminhão a diesel e não está exigindo nada em troca."

De acordo com levantamentos feitos pelo laboratório, cerca de 20 pessoas morrem todos os dias na região metropolitana de São Paulo por doenças agravadas pela poluição. Os resultados do mais recente estudo sobre o tema, concluído no 1º semestre, não surpreenderam Saldiva. "O que me surpreende nessa história toda é que, mesmo sabendo desde os anos 90 que a poluição mata, não se toma iniciativa nenhuma", afirma.

Preço da poluição

Ainda segundo o médico e pesquisador, a expectativa de vida média pode ser reduzida em até dois anos na capital paulista por causa dos poluentes. Ele explica que o nível máximo permitido pela OMS é 10 microgramas por metro cúbico de partículas finas. Na capital paulista, esse número fica entre 25 e 30.

A "conta" paga todos os anos por causa da poluição é alta. "Na cidade de São Paulo, que a gente tem mais informação, (o custo da poluição) ultrapassa US$ 1,5 bilhão ao ano, se levar em conta a redução da expectativa de vida. Isso daria, mais ou menos, 30 km de metrô por ano", diz o pesquisador. De acordo com Saldiva, entram nesse cálculo gastos com internações hospitalares, tanto na rede pública quanto na privada, e o que a população deixou de produzir por causa da redução da expectativa de vida.

Procurada pelo G1, a Secretaria Municipal de Saúde informou não ter dados  sobre os gastos com doenças decorrentes da poluição na cidade.

Metais pesados

Estudos realizados sobre a poluição trazem outros resultados alarmantes. Partículas prejudiciais à saúde circulam pelo corpo. "Se você pegar placenta de bebê nascido em São Paulo, você vai ver que tem material pesado. Cérebro, a gente está estudando agora sobre o Alzheimer, existem metais pesados ali dentro", afirma Saldiva. Até a reprodução pode ser afetada. "O gameta masculino é mais frágil. Nos lugares mais poluídos de São Paulo, nascem mais meninas."

Um levantamento feito pela Sociedade Brasileira de Cardiologia no Dia Mundial do Meio Ambiente mostra que não fumantes podem ter um comprometimento pulmonar semelhante ao de um tabagista por causa da poluição. Os pesquisadores submeteram 228 pessoas a um teste para verificar a quantidade de monóxido de carbono no organismo. Desse total, 4% de quem não fumava apresentaram comprometimento semelhante ao de fumantes. Outros 76% apresentaram níveis de monóxido de carbono, mas eles foram considerados baixos para a incidência de doenças cardiovasculares.

Ações de melhoria

Implantado em 2008 em meio a muita polêmica com os motoristas, o programa de Inspeção Veicular Ambiental da Prefeitura de São Paulo é a principal ação da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente para tentar melhorar os níveis de poluição na cidade. Este ano, todos os veículos a diesel, motos e carros - os últimos, com fabricação entre 2003 e 2008 - são obrigados a ir a um dos postos da empresa contratada para serem inspecionados.

"A inspeção foi implementada para garantir que os veículos estão regulados e ajustados. Com uma frota de 6 milhões de veículos, isso é extremamente fundamental. No caso de São Paulo, a maior das fontes poluidoras é o escapamento dos veículos. Estamos atacando essa fonte", explica Márcio Schettino, coordenador do programa.

Poluição sonora

Os problemas causados pela poluição sonora não são menos significativos. "Qualquer pessoa, não importa onde esteja, se for submetida a um som em volume muito alto, pode ter prejuízos ao longo do tempo", explica o otorrinolaringologista Luciano Rodrigues Neves, da Unifesp.

Segundo ele, além da perda auditiva, os ruídos altos constantes podem gerar zumbidos no ouvido e o barulho dos veículos 24 horas por dia também causar outros efeitos nas pessoas, como irritabilidade, falta de concentração, estresse e até perda de memória.

Pessoas que moram em áreas barulhentas durante a noite têm dificuldade para dormir, o que causa a irritação durante o dia e dificulta a absorção da memória recente. E o barulho durante o dia, dentro do próprio carro, ônibus, moto ou caminhão, colabora para o estresse já causado pelos congestionamentos.

De acordo com o médico, atualmente já é possível constatar que o início da perda auditiva das pessoas está ocorrendo mais cedo. "Antes, era de 50 a 55 anos. Hoje, já temos casos de pessoas que começam a acusar a perda aos 45, até 40 anos", explicou ele. "Antigamente a cidade tinha menos barulho. O trânsito, hoje, é um fator decisivo para o aumento desse ruído na cidade, nossas ruas estão mais barulhentas dia e noite."

Quem trabalha profissionalmente no trânsito precisa ainda de maior cuidado. Segundo Neves, já há o registro de casos de motoristas de ônibus e táxis que apresentaram perda auditiva no ouvido esquerdo, que fica mais próximo dos ruídos durante a direção, após um tempo prolongado de trabalho. "Alguns motoristas podem apresentar isso devido à exposição. O ouvido direito fica para dentro do carro, mais protegido, mas o esquerdo sofre", contou.

Por isso, ele ressalta que essas pessoas devem passar por consultas com um otorrinolaringologista periodicamente para detectar se há perda de audição. Caso ela seja constatada, elas podem até ser afastadas da função.

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