Governo quer acabar com agricultura familiar, diz relator do Código Florestal

Governo quer acabar com agricultura familiar, diz relator do Código Florestal

Fonte: Atualizado: sábado, 31 de maio de 2014 às 9:46

Relator do   projeto de reforma do Código Florestal , o deputado federal Aldo Rebelo (PC do B-SP) afirma que o governo propõe o “extermínio" da agricultura familiar ao pedir que os pequenos produtores tenham área de reserva legal dentro de suas propriedades.

Em entrevista ao   G1   nesta quarta (20),  Rebelo disse que os pequenos não têm condições de separar uma parcela da área da propriedade usada para o cultivo a fim de  destiná-la à preservação.

O relatório de Aldo Rebelo, ex-presidente da Câmara dos Deputados e integrante da base do governo, prevê a isenção da reserva legal  para propriedades de até quatro módulos fiscais.

A reserva legal é um percentual dentro da propriedade que deve ser preservado – varia conforme a região. O tamanho exato de cada módulo também é diferente em cada região.

Rebelo recebeu nesta semana a posição do governo sobre o código e sugestões de alteração em seu relatório. No documento, o governo se posicionou contra dispensar reserva legal para os pequenos.

“Me apresentaram como solução para o problema, mas isso eu não vou adotar [no relatório]. Se o governo quiser, vai ter que mobilizar os partidos. Não vou fazer porque considero socialmente uma tragédia. É o mesmo que decretar o extermínio de uma parte da agricultura familiar.”

O ministro da Agricultura, Wagner Rossi, afirmou na quarta-feira (20)   que há consenso em vários pontos, exceto na reserva legal . Apontou que o Ministério do Meio Ambiente não quer a isenção para ninguém. “Não houve solução deste problema”, afirmou.O Ministério do Meio Ambiente disse, por meio de sua assessoria, que o governo enviou a Rebelo uma proposta de consenso e não fará concessões. Disse que há intenção de apresentação de emenda no plenário para propostas que não forem incluídas no relatório.

Aldo Rebelo disse que o tema ainda será alvo de discussão entre os parlamentares e ministros do governo Dilma Rousseff na próxima semana.

O deputado diz ainda há consenso de “95% a 97%” do texto, e que fará ainda “pequenas alterações” até o começo de maio. O presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS), informou que o código vai à   votação em 3 e 4 de maio .

Confira abaixo os principais trechos da entrevista.

G1 - O sr. vê possibilidade de o governo prorrogar o início da punição aos produtores que não estiverem com suas reservas legais adequadas até 11 de junho?Aldo Rebelo -   O que precisa é de uma lei, mas se não tiver lei, como a lei é impraticável - a atual -, o governo terá que adiar a entrada em vigor de uma lei que já está em vigor, o que mostra a situação absurda em que nos encontramos. A lei exige reserva legal, que ninguém tem, a lei exige área de preservação permanente (APP), que ninguém tem. Então, ou você põe todo mundo na cadeia como infrator ou você faz a lei que legaliza essas pessoas e proteja o meio ambiente.

G1 - Dentro da reforma do Código Florestal, como a questão reserva legal vai ser resolvida? Os pequenos produtores não vão precisar ter essa área?Aldo Rebelo -   A reserva legal é uma obrigação de todos hoje. Ela é um problema maior para os pequenos porque afeta economicamente mais os pequenos. Metade dos agricultores nordestinos tem até cinco hectares. E somando reserva legal e APP, eles não têm nem 1%. Significa que, se confiscar para reserva legal 20% de cada propriedade e mais uma área de proteção de água e de solo, eles vão ficar com pouca terra para trabalhar e, portanto, é economicamente inviável. O que estamos propondo é que proprietários de até quatro módulos sejam dispensados da obrigação de recompor a sua reserva legal. Eles teriam apenas que recompor a APP. Os grandes e médios teriam que recompor reserva legal e APP, somando os dois, para dar até 20% na Mata Atlântica, 35% no Cerrado e 80% na Amazônia. Isso é uma tentativa de resolver a situação.

G1 - O grande produtor também será beneficiado?Aldo Rebelo -   Os poucos que estão na legalidade são os grandes. Aliás, a ilegalidade é exatamente na proporcionalidade do tamanho da propriedade. O maior número está entre os pequenos e vai decrescendo até os maiores. Quem mais se aproxima de preencher os requisitos da lei são os grandes.

G1 - O relatório do sr. traz muitas críticas aos ambientalistas. Como o sr. avalia a atuação deles no debate?Aldo Rebelo -   Eu acho que eles simplesmente estão errados. E ao estarem errados, não conseguem apresentar argumentos razoáveis que contribuam para o debate. Esse debate exige solução para cada problema . Agora, no fim, eles se aproximam de sugestões. Esteve de manhã aqui o presidente da Frente Parlamentar do Meio Ambiente, deputado Zequinha Sarney, apresentou sugestões, me comprometi a acolher. Mas o que precisava era que eles se debruçassem sobre a realidade do país. A realidade do país é uma tentativa de equilibrar a defesa do meio ambiente com a produção agrícola. Você não pode ver só um dos lados, eles só vêem um dos lados.

G1 - Uma das principais críticas ao projeto é a anistia a quem desmatou.Aldo Rebelo -   Mas esse é o ponto menos importante. Porque a anistia está proposta no decreto do governo. O decreto do governo (o mesmo que estabelece prazo para punições) é um decreto de anistia. Quem se regularizar no prazo está anistiado. O problema é que as condições para regularização são impossíveis de serem praticadas. Nós estamos propondo a mesma coisa que o governo está propondo, oferecendo algumas facilidades, que é essa isenção da reserva legal e recomposição para os pequenos, a possibilidade de somar reserva legal com APP, a possibilidade de recompor a reserva legal se estiver em outro estado no mesmo bioma. Essas medidas permitem que as pessoas se legalizem.

G1 - O sr. é pressionado por ruralistas de um lado, ambientalistas de outro, o governo de outro. Como lida com isso? Aldo Rebelo -   Desde o primeiro momento, o relatório é a busca do equilíbrio. Uns vêem mais os problemas da agricultura, outros vêem mais o problema do meio ambiente. Nós fizemos concessões. Por exemplo, mantivemos a reserva legal. Isso contraria os agricultores, que não querem reserva legal porque não existe isso em lugar nenhum do mundo. Nem na Holanda, no país da sede do Greenpeace, não tem reserva legal nem de 1%.

G1 - O sr. mencionou o Greenpeace –   vê intromissão de entidades internacionais?Aldo Rebelo -   Mais que intromissão, tem um interesse comercial. Agricultura é um comércio disputado. E a agricultura do norte-americano e do europeu é muito subsidiada, quase estatal. E eles temem a concorrência da agricultura brasileira. Então eles financiam essas ONGs para que elas atuem aqui, para que elas ajudem a criar legislação ambiental que prejudique a agricultura brasileira.

G1 – Essas entidades influenciam outros movimentos que hoje estão contra o relatório, como o MST?Aldo Rebelo -   Influenciam e ajudam a financiar também. E uma parte eles influenciam por desinformação. São as próprias editorias de meio ambiente dos jornais, das revistas, que não conhecem a realidade do campo. E nós somos colocados pela nossa própria imprensa como país ambientalmente irresponsável.

G1 - Quais mudanças no relatório o governo propôs ao sr.?Aldo Rebelo -   O governo quer a solução para o problema, precisa disso. A única coisa que eles estão contra hoje é dispensar de recomposição a reserva legal para os pequenos. Me apresentaram como solução para o problema, mas isso não vou adotar. Se o governo quiser, vai ter que mobilizar os partidos. Não vou fazer porque considero socialmente uma tragédia. É o mesmo que decretar o extermínio de uma parte da agricultura familiar. Cada metro quadrado para eles é muito importante, para produzir, se sustentar. É preciso ter muito cuidado. G1 - O presidente da Câmara, Marco Maia  (PT-RS), disse que vai colocar o projeto na pauta em 3 e 4 de maio. Até quando o sr. vai trabalhar no texto para modificar?Aldo Rebelo -   O texto está praticamente pronto. Vou fazer algumas modificações no fim de semana. Isso é como vestido de noiva: a cada prova você tem que fazer um ajuste. Minha mãe era costureira e eu ficava olhando. A noiva não ficava preocupava com o noivo, ficava preocupada com o vestido. Então você faz um ajuste, mas quando prova de novo, tem outro ajuste em algum lugar para fazer.

G1 – O que ainda pode ser alterado?Aldo Rebelo -   O que vai ter é talvez uma disputa porque o pessoal da agricultura familiar, as 27 federações, não querem 15 metros [de preservação nas margem de riachos], querem 7,5 metros. Eu tenho muita simpatia por essa tese. Ainda vou tentar convencer as pessoas, pessoal de governo e líderes, de que, para agricultura familiar, 7,5 metros é uma coisa justa. Por um riacho de um palmo, meio palmo, não tem sentido tomar 30% da propriedade por causa disso. Posso mudar ainda se houver acordo.

G1

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